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A marginalidade social e o avanço do crime organizado
28/08/2015 às 00:58 Ler na área do assinante
A vida no tráfico é um ciclo vicioso. A falta de oportunidade, somada à chance de ganhar dinheiro, resulta muitas vezes na entrada em uma facção criminosa.
A atração começa já na infância, quando as crianças ficam seduzidas pelas motos, dinheiro e pelas namoradas dos traficantes.
Muitas crianças entram no mundo do tráfico sem nem mesmo notar. Envolvem-se com pessoas ligadas ao crime, levam recados dentro das favelas e acabam virando o que os traficantes chamam de “aviõezinhos”.
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É o primeiro posto na hierarquia do tráfico. Uma vez dentro do ciclo do tráfico, fica difícil sair.
O tráfico de drogas gera uma dependência parecida com a do uso de drogas. O poder, o reconhecimento, as informações privilegiadas, a hierarquia, as regras e o medo da morte são características difíceis de deixar.
Muitas crianças crescem nesse meio até se tornarem adolescentes. Em qualquer classe social a adolescência é uma fase complicada. É uma época de construção de identidade, quando se começa a aprender quem se é.
Para um adolescente de classe baixa, que vive em uma sociedade racista e elitista, tudo fica mais difícil. Ele se sente ignorado, invisível e muitas vezes rejeitado.
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O tráfico acaba preenchendo essa lacuna. Valoriza esses jovens, coloca-os num grupo onde são notados e respeitados.
O adolescente se torna protagonista, produz reações nas pessoas, se torna alguém visível. Para muitos, a entrada no mundo do tráfico é uma tentativa desesperada de construir uma identidade.
Esses jovens convivem com a realidade do tráfico e aprendem as regras dentro deste sistema. Depois de “aviõezinhos”, crescem e assumem novas posições, viram “fogueteiros”. Ficam no alto da favela e disparam fogos quando avistam a polícia, são olheiros para o tráfico.
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O próximo passo é trabalhar dentro da boca de fumo (lugar onde a droga é vendida) e virar ajudante do gerente. Assim, eles vivenciam o dia-a-dia do tráfico, ganham bastante dinheiro e começam a ser respeitados dentro do grupo.
Quando o chefe da boca é morto, um desses meninos assume a venda das drogas e fica completamente envolvido no tráfico.
Mas muitos não chegam a ser gerente de boca, pois antes disso morrem em confrontos com a polícia ou com facções rivais. Se eles conseguem escapar dos tiroteios, algumas vezes acabam mortos em disputas dentro da própria quadrilha.
A rede de hierarquia é muito respeitada dentro do tráfico. São regras feitas dentro da rotina, que não precisam ser escritas para serem obedecidas.
O dono do ponto é o grande chefe e controla toda uma rede de “funcionários”, cada um com suas responsabilidades.
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Todos sabem que as regras precisam ser cumpridas, para não gerar consequências como expulsões ou execuções.
Na ausência de governo, a facção é o maior poder dentro das favelas. Cabe a ela não só resolver disputas e punir crimes, mas também providenciar as necessidades da vida cotidiana, como promover o baile funk e construir benfeitorias.
A facção seduz a população para dentro do tráfico, oferece favores à comunidade. Os moradores acabam recorrendo aos traficantes para ajudar a solucionar problemas graves.
Hoje o dinheiro ganho no tráfico é menor do que antigamente. A insegurança das favelas, as guerras entre facções rivais e as propinas que precisam ser pagas a policiais corruptos diminuíram o lucro dos traficantes.
Estima-se que há gastos de entre 121 e 218 milhões de reais por ano com a reposição de armas e a compra de produtos.
Com o passar do tempo o tráfico também se tornou mais perigoso. As facções criminosas hoje possuem um grande armamento. Elas estão cada vez mais violentas, e a rivalidade entre elas vem ocasionando guerras constantes. A luta pelo poder e o domínio do território tem feito muitas vítimas em um cenário de horror que apavora os moradores.
A população da comunidade vive com medo da violência, das normas de poder impostas, das balas perdidas e dos tiroteios constantes. As regras do tráfico fazem com que os moradores mudem sua rotina. São regras essenciais para a sobrevivência nas comunidades comandadas por facções criminosas.
Pio Barbosa
(Fonte: soulbrasileiro.com.br/)
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Pio Barbosa Neto
Articulista. Consultor legislativo da Assembleia Legislativa do Ceará