A cada dia a população fica mais chocada com os noticiários. Além da violência pura e simples, hoje predomina a violência da criminalidade política, que aos poucos vai mostrando, o mundo da política dominado, no dizer do Ministro Celso Mello, “por um grupo de delinqüentes que degradam a atividade política”. A política real, predominantemente, se transformou em campo de ação de bandoleiros.
Essa situação parece ter recrudescido nas últimas duas décadas. No plano nacional já foi atingido o Judiciário e, em uma escala sem precedentes, o Executivo e o Legislativo, estes, flagrados em conúbios com o sistema financeiro, estatais, fundos de pensão e com as maiores empresas de obras públicas do País.
Essa crise de valores republicanos se irradia também em todas as esferas do poder público, assim vemos os escândalos atingindo os Estados e Municípios,
como acontece atualmente em Mato Grosso Sul e em Campo Grande, demonstrando o caráter endêmico da crise ética com o correspondente descrédito da população nos políticos e nos partidos.
Na raiz dessa degradação está a perda do sentimento de coletividade, de bem comum, substituídos pelo egoísmo do individualismo, fruto da radicalização da ideologia do liberalismo. A idéia do mercado, como valor supremo da vida econômica, se transbordou gravemente para todas as esferas da vida social. Hoje, partidos e políticos, no geral, são produtos de mercado. No dizer de Alfredo Reicilin, "criou-se um círculo vicioso: uma classe política inculta e irresponsável produz um mundo cínico de clientes e financiadores”. Na falta das grandes causas, utopias e esperança, só se ouve – parafraseando Montesquieu – o lamentável ruído das pequenas ambições e dos grandes apetites.
Recente pesquisa, patrocinada pelo Conselho Nacional de Justiça, sobre a credibilidade das instituições, feita pela FGV, mostra que apenas 5% da população confia nos partidos políticos. Vou na contramão desse sentimento difuso. Conheço políticos dignos, eles existem.
Acredito na política, porque acredito na democracia e esta precisa da política, o seu antônimo é a barbárie. Mas a presente crise é grave. Fosse apenas uma crise política, bastava trocar os partidos e os políticos e o problema estaria resolvido, mas trata-se de algo muito mais grave, é a crise de credibilidade na política, esse produto dos mais sofisticado da civilização, cuja função é regular as relações humanas.
É certo que, para além dos problemas da conjuntura, há uma crise estrutural, que exige novos paradigmas. Hoje, os partidos já não possuem o monopólio representação política dos cidadãos. A pressão das ruas, os mecanismos de participação direta, as redes e mídias sociais são novos elementos que vieram para ficar. Entretanto, seria uma imensa ingenuidade supor que estas possam substituir as instâncias institucionais da política. Já não vivemos na polis grega, mas em sociedades complexas que exigem institucionalidade sofisticada, inclusive para garantir, não apenas os direitos da maioria, mas também a representação de toda a diversidade existente na sociedade.
O grito dos “indignados”, as pressões dos movimentos, essenciais para fazer valer a vontade democrática dos cidadãos deve colocar em questão, não a política como valor, mas sim a qualidade da representação e dos partidos, em uma pressão salutar para a qualificação da democracia e dos partidos.
Abertos a essa realidade, temos que fazer a transição para novas formas-partidos, principalmente daqueles que se pretendem transformadores. Tenho convicção de que isso precisará muito de gente que, olhando a política atual, “não quer fazer política”, mas tem brios de cidadania. É preciso construir utopias novas, mobilizadoras das energias da sociedade. Os partidos e a política terão que se refundarem em novas formas e conteúdos se quiserem ter protagonismo no futuro.
Fausto Matto Grosso
Diretor Geral da Fundação Astrojildo Pereira/MS
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