José Padilha responde a detratores de "O Mecanismo" e aniquila intelectuais de esquerda

01/04/2018 às 18:58 Ler na área do assinante

Em memorável artigo publicado neste domingo, o cineasta Jose Padilha explica a série ‘O Mecanismo’ e analisa os ataques recebidos, muitos extremamente violentos, proferidos por conhecidos formadores de opinião da esquerda brasileira.

Padilha descreve a série como “uma dramatização inspirada em um conjunto de acontecimentos reais, apresentada de forma a ilustrar uma tese”.

A tal tese é enumerada em cinco enunciados:

Vejamos:

“a) No Brasil, a corrupção não ocorre esporadicamente; ela é o mecanismo estruturante da política e da administração pública, um mecanismo que opera nos municípios, nos estados e no governo federal; no Executivo e no Legislativo, e também nas cortes judiciais constituídas por indicações políticas.
b) As campanhas de todos os grandes partidos do Brasil são financiadas por empresas que trabalham para o Estado. Uma vez eleitos, políticos desses partidos montam coalizões com base na distribuição de cargos que auferem controle sobre o orçamento público. Quanto mais poderoso for um político, maior o quinhão que lhe cabe.
c) O Estado, assim loteado, contrata as mesmas empresas que financiam as campanhas políticas dos grandes partidos, superfaturando orçamentos.
d) Parte da fatura se transforma em financiamento de campanha para o próximo ciclo eleitoral, e parte vira caixa dois e propina.
e) O mecanismo não tem ideologia; ele opera nos governos de esquerda e de direita.”

Na sequência, Padilha esclarece que “O Mecanismo” assume esses enunciados como verdadeiros e vê o Brasil como um país totalmente envolvido nesta situação, corrupção sistêmica. E cita como exemplo a Lava Jato e a Petrobras.

“Hoje, a Lava Jato tem US$ 11,5 bilhões em recuperação judicial, sendo R$ 3,2 bilhões já bloqueados. Se não há corrupção sistêmica, de onde veio esse volume de dinheiro?”, questiona o cineasta.

"Ora, é inegável que o mecanismo opera no Brasil, e é inegável que os grupos políticos de Temer e de Lula se beneficiaram dele. Sendo esse o caso, qual o motivo para os violentos e desonestos posts que alguns formadores de opinião de esquerda dispararam contra os atores e autores da série 'O Mecanismo'?"

“Para entender sua natureza, precisamos olhar o que ocorreu com a opinião pública pós-Lava Jato.

Sabendo que O Mecanismo existe, podemos afirmar que:

a) Se a nova lei de delações premiadas tivesse sido sancionada com o PSDB no poder, os políticos denunciados teriam sido Aécio, Serra e FHC. Mas, como a lei foi sancionada com PT e PMDB no poder, os políticos denunciados foram Palocci, Lula, Cunha, Cabral e Temer.
b) A mídia de direita usou essa contingência histórica para atacar a esquerda, como se a direita não fosse corrupta.
c) O PT usou essa contingência para acusar a Lava Jato de partidarismo, como se não fosse inevitável que petistas fossem pegos primeiro, dado que estavam no poder.

"Criou-se, assim, um ambiente irracional e polarizado, em que o dogmatismo ideológico da esquerda radical e o cinismo pragmático da direita fisiológica passaram a trabalhar juntos para negar o inegável, o fato de que todas as lideranças políticas dos grandes partidos brasileiros são corruptas.

Hoje, vemos os formadores de opinião de esquerda e os membros da direita fisiológica de mãos dadas, pressionando o STF para cancelar a prisão após condenação em segunda instância. Afinal, para a esquerda isso garantiria a impunidade de Lula; para a direita, a de Aécio, de Temer, de Jucá... O mecanismo, é claro, agradece.”

E finaliza: “Confesso que esperava mais dos formadores de opinião da esquerda. Pensei que em algum momento da história fossem acordar do estupor ideológico e ajudar pessoas de bem na luta contra o mecanismo que opera no mundo real, em vez de se associar a ele para lutar contra o mecanismo exposto na Netflix.”

Fonte: Folha de S.Paulo

da Redação
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