Nenhuma situação é tão ruim que não possa piorar
16/08/2015 às 14:14 Ler na área do assinanteEsse era um “mote filosófico” muito usado pelo pacato professor Hercules Maymone, da UFMS, acostumado a desbaratar os entraves da vida. Já o deputado federal Tiririca, um dos mais ínclitos representantes do povo no Congresso Nacional, tem opinião diferente e afirma que “Pior do que está, não pode ficar”.
Aos que acompanham o desenrolar da crise político-econômica brasileira, sintam-se a vontade para concordar com essas “inquestionáveis verdades”, segundo suas crenças e descrenças.
Entretanto, os que viveram os anos 70 e 80 do século passado conhecem as dolorosas consequências de se ter políticos incompetentes e irresponsáveis no comando. A cada momento o cidadão pagador de impostos esbarra com indicadores preocupantes: inflação alta, desemprego crescente, juros estratosféricos, política cambial perniciosa, parlamentares chantageando o Executivo, educação e saúde paradas. Enquanto isso, a estratégia governamental adotada resume-se em tudo para os políticos e nada para o povo.
É o caos lançado em um fosso que se alarga e se aprofunda impulsionado pelos próprios governantes que sabem (e acreditam) que o povo tem memória curta e a reeleição está garantida pelos cofres públicos.
Na lista de investigados pela Procuradoria-Geral da República na operação Lava Jato, constam 13 senadores e 22 deputados federais, por enquanto.
Todos alegam inocência e perseguição política desencadeada por “forças ocultas” alojadas no Planalto. As buscas da Polícia Federal nas casas de quatro desses congressistas, incluindo o ex-presidente Fernando Collor de Mello, provocaram protestos veementes de Renan Calheiros, presidente do Senado, e de Eduardo Cunha, presidente da Câmara.
Collor, da tribuna do Senado, como se estivesse nos jardins da “Casa da Dinda”, chamou o Procurador-Geral de “filho da puta”.
Suas Excelências, todas, se calaram e concordaram com as palavras do representante das Alagoas. E, pelo silencio ouvido, esse palavreado é condizente com a ética comportamental da Casa. A Comissão de Ética aguarda. O Ministério da Educação da “Pátria Educadora” também aguarda.
A política do “anda e para”, o “go and stop” dos gringos, é o ritmo do neoliberalismo brasileiro nos últimos 20 anos. A diferença entre os gringos e os brasileiros está na velocidade do retorno após cada parada: eles, identificado o problema, desencadeiam providências para quebrar a inércia operacional, e nós prolongamos as paradas enquanto o governo aumenta os juros e os impostos.
Dilma Rousseff e sua equipe, se é que existe uma equipe, tentam retornar à ortodoxia utilizada na crise de 2003.
Para tanto, aumentaram a taxa Selic, fizeram cortes orçamentários em áreas básicas como educação e saúde, mas também aumentaram a despesa com o Bolsa Família, com o Fundo Partidário e com alguns subsídios. Apesar do contingenciamento orçamentário de aproximadamente R$ 80 bilhões (até agora) o Tesouro registrou um déficit de R$ 9,8 bilhões no primeiro semestre (antes dos desembolsos com juros).
O povo percebe que esse arrocho orçamentário é fictício e não surtirá os efeitos apregoados pelo ministro Joaquim Levy, porta-voz dos banqueiros na estrutura governamental. A causa do fracasso previsto é devido ao desequilíbrio estrutural entre receitas (em queda livre devido à recessão econômica que se aprofunda) e despesas públicas (em elevação permanente devido às pressões dos congressistas).
Para acalmar os políticos da “base aliada”, a Presidente prometeu liberar R$ 4,9 bilhões em emendas parlamentares até dezembro. Simultaneamente, a mandatária maior convoca os governadores e os prefeitos para que os Estados e municípios participem do sacrifício reduzindo despesas. Para consolo de todos, afirmou que o crédito voltará a ser abundante e que está preparando o país para um novo ciclo de expansão econômica. Aproveitou a oportunidade para pedir o apoio de todos para a aprovação da reforma do ICMS que unificaria a alíquota em 4%.
O mensalão e o petrolão fizeram estragos na credibilidade dos políticos, mas os escândalos não ficarão por aí. Depois vieram as “elétricas”, dando choques para todos os lados.
Agora é a vez da CPI do BNDES, nitroglicerina (substância usada na fabricação de dinamite) pura, apesar de todos dizerem que a CPI dos Fundos de Pensão é a mais explosiva.
Entretanto, Marcos Rotta (PMDB), presidente da CPI do BNDES, acalmou os políticos de todos os partidos dizendo que há “dificuldade para iniciar os trabalhos” da comissão, sinalizando que não vai dar em nada, tal como na CPI da Petrobras. Essa é a dinâmica do parlamento nacional.
Em 2009 o ministro Guido Mantega, cumprindo ordens do Planalto, aumentou o programa de crédito barato para um grupo de empresas privilegiadas. O volume de empréstimos subsidiados, desde então, saltou de R$ 40 bilhões para R$ 455 bilhões, com recursos repassados pelo Tesouro.
O governo capta dinheiro no mercado financeiro tendo como referência a taxa Selic, e repassa ao BNDES. O Banco empresta às empresas tendo por base a taxa de juros de longo prazo, bem inferior ao custo médio com que o Tesouro se financia. A dívida pública aumentou substancialmente devido a esses procedimentos. O total de recursos repassados pelo Tesouro é de R$ 455,5 bilhões e o custo total dos subsídios concedidos pelo Tesouro ao BNDES é de R$ 184,3 bilhões.
Essa sangria financeira permanecerá pelos próximos 40 anos. Só com a Odebrecht, o Banco fechou 539 contratos para financiar obras de engenharia no exterior - US$ 12,5 bilhões com 412 obras em países da América Latina e África. Coisa nunca vista antes na “pátria educadora”
A inflação, o desemprego e a taxa de juros crescem, a Câmara aprova medidas desestabilizadoras e a bancada peemedebista do Senado criou um “pacote anticrise”, com 43 tópicos objetivando reduzir despesas na área social e reequilibrar o orçamento, como se isso fosse possível.
A Agenda Brasil foi moldada em uma reunião de Renan Calheiros, 35 senadores, Joaquim Levy (Fazenda) e Nelson Barbosa (Planejamento). Entretanto, esqueceram que tais procedimentos ainda dependem da Câmara, e Eduardo Cunha jogou um balde de água fria na euforia de Dilma e Renan dizendo que “Até agora, nós vimos apenas um jogo de espuma sem conteúdo concreto, utilizando parte da espuma que veio da própria Câmara dos Deputados”.
Dilma, pomposamente, vetou o projeto de lei que concedia um aumento salarial variando de 53% a 78,5% para os servidores do Judiciário, em greve desde junho. Entretanto, nos bastidores, acertou com Ricardo Lewandowski, presidente do STF, um aumento de 41,47%. Os ministros receberão um aumento de “apenas” 16,38%, passando a receber a bagatela de R$ 39.293,38 mensal. O impacto financeiro anual será de R$ 25 bilhões, nos próximos quatro anos.
Como se tudo isso não fosse suficiente, a agência de classificação de risco Moody’s rebaixou o Brasil para o último degrau antes de perder o grau de investimento. Considere-se ainda que Renan Calheiros, Eduardo Cunha, Romero Jucá e Jader Barbalho não são aliados confiáveis em época de crise. As bravatas da Presidente e o sorriso irônico do vice-presidente não ajudam.
Em Mato Grosso do Sul, complementando o panorama nacional, explodiu a “lama asfáltica e o alvorecer”.
Está difícil encontrar alguma Excelência que não tenha sido respingada. Mas é em Campo Grande que os políticos, representados pelos vereadores e prefeito, demonstram o desprezo pelo dinheiro público, pela justiça e pela opinião dos eleitores. É um grande espetáculo de ironia e hipocrisia. A situação é tão degradante que só o sábio e honestíssimo senador Fernando Collor de Mello seria capaz de expressar o que os campo-grandenses pensam a respeito de seus representantes locais.
LANDES PEREIRA. Economista com mestrado e doutorado. É professor de Economia Política.
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Landes Pereira
Economista e Professor Universitário. Ex-Secretário de Planejamento da Prefeitura de Campo Grande. Ex-Diretor Financeiro e Comercial da SANESUL. Ex-Diretor Geral do DERSUL (Departamento Estadual de Estradas de Rodagem). Ex-Diretor Presidente da MSGÁS. Ex-Diretor Administrativo-Financeiro e de Relações com os Investidores da SANASA.