A corrupção e a violência são características marcantes dos pindoramanos desde a invasão de Pindorama (o paraíso invadido pelos portugueses lá nos idos de 1500). Aqui se procura tirar vantagens de tudo e de todos e, para manter a lei e a ordem, sempre se apela para as Forças Armadas. A última interferência militar de grande porte, que não deixou saudades, aconteceu no período de 1964 a 1985.
A atual intervenção militar no Rio de Janeiro iniciou em 1992 quando o governo colocou as tropas para garantir a paz na Eco92 (dizem os fofoqueiros que a polícia do Rio, na época, teria feito um acordo de paz com os narcotraficantes, daí o sucesso da intervenção) e de lá para cá, periodicamente as Forças Armadas voltam para as ruas. Nos intervalos das operações de ocupação, o governo utiliza a Força Nacional de Segurança Pública (composta por policiais militares cedidos pelos Estados), sem consolidação dos objetivos propostos.
Vários grupos de militância política conservadora são vistos nas ruas, desde 2013, pedindo a “intervenção militar democrática” prevista constitucionalmente.
Não se sabia, claramente, quem estava por trás desse movimento. Aos poucos, lentamente, de forma sutil e camuflada, a intervenção foi acontecendo nos Estados onde os governantes civis (muitos corruptos) foram incompetentes para manter a lei e a ordem no sistema de segurança pública. Nessas operações pontuais ficou claro que as Forças Armadas, mesmo com o apoio operacional da Força Nacional de Segurança Pública, ainda não estão preparadas para tal intervenção, setorial ou global como muitos querem.
Neste pós-carnaval o velho PMDB (agora sem o P) repetiu a bem sucedida estratégia de desviar o foco de atenção das mazelas administrativas governamentais para o lançamento de um programa de impacto, bem aceito (e até esperado) pela população. Em 1986 o falido governo de José Sarney (PMDB e ex-presidente da ARENA) lançou o Plano Cruzado (que pretendia acabar com a hiperinflação vigente na base do decreto) provocando uma espetacular vitória nas urnas, para logo depois das eleições anunciar que tudo não passara de uma experiência que não deu certo.
Michel Temer (PMDB, sem P), com irrestrito apoio de seus argutos ministros (políticos de várias facções partidárias), decretou a intervenção militar no Rio de Janeiro.
As Forças Armadas aceitaram porque, como diz Cláudio Humberto: “Um eventual fracasso não será atribuído aos militares, mas ao ‘remédio insuficiente’, abrindo opções mais radicais”, tal como preconiza o capitão Jair Bolsonaro, candidato à presidente da República. Os militares agora querem “poder de polícia” com mandados coletivos, o que é inconstitucional.
Apesar do entusiástico apoio dos quatro Poderes da República (três constitucionais, acrescido do Ministério Público) e de grande parte da população carioca, a intervenção militar ostensiva suscita dúvidas, reservas e temores porque não atacará as causas da violência, mas sim apenas algumas de suas consequências (e apenas algumas).
Pululam perguntas e respostas para serem analisadas, sob um enfoque de sociologia política (sem qualquer embasamento acadêmico), tais como: por que existe narcotraficante? Porque existe consumidor que procura e paga pelas drogas (é a principal ponta da lei de oferta e procura). Por que existe uma violenta e sangrenta guerra entre facções de narcotraficantes? Porque a venda de drogas é de alta rentabilidade e liquidez e porque as facções de fornecedores querem o monopólio (não aceitam dividir o rico mercado). Porque existe contrabando de armas sofisticadas?
Primeiro, porque os narcotraficantes tem muito dinheiro e querem se equipar para a luta entre facções; segundo, porque as facções querem expandir seus “negócios” para outras áreas; e, terceiro, porque não há efetivo controle policial-militar de combate ao tráfico de drogas e ao contrabando de armas nas longas fronteiras secas do território brasileiro.
O problema da violência nas grandes cidades continuará atormentando a passiva, indefesa e conivente população urbana, mesmo com a intervenção militar enquanto houver irrestrita proteção para os consumidores de drogas. De nada adiantará prender, torturar e matar narcotraficantes e suas “mulas” enquanto os consumidores de drogas forem tratados com a máxima tolerância e benevolência pela sociedade.
Outra questão que a intervenção, na forma em que foi decretada, nada poderá fazer contra, em princípio, diz respeito ao conluio existente entre o crime organizado e a estrutura política vigente. As facções partidárias e os políticos individualmente precisam e pedem (descaradamente) apoio financeiro para suas campanhas eleitorais e para o enriquecimento pessoal; as facções criminosas de traficantes, chefes do jogo do bicho e cassinos, os ladrões de carga, os donos de empresas de transporte urbano, os empreiteiros e outros contraventores bancam os políticos de todos os poderes e estâncias.
Se porventura algum poderoso corrupto é preso, sempre aparece um magistrado dos tribunais superiores para libertá-lo e protege-lo. São apenas algumas entre tantas perguntas que podem ser feitas, sem considerar o desemprego e o sucateamento das escolas, dos postos de saúde e dos hospitais.
Os políticos do estado do Rio reivindicam que o Tesouro Nacional assuma todas as despesas com salários de pessoal do setor de segurança pública (PM, Polícia Civil, Bombeiros, e sistema prisional) e, também, todas as despesas com materiais (veículos, combustíveis e armamento).
Henrique Meirelles, ministro da Fazenda e representante do sistema financeiro internacional no governo, já anunciou que estuda a implantação de um imposto de segurança pública para bancar esses e outros ônus que surgirão. O governo Federal já sinalizou um “empréstimo” de R$ 1 bilhão para logo depois que os novos comandantes forem indicados.
Será que o general Interventor, sem poder de polícia e sem poder interferir nos poderes legislativo e judiciário, terá mais poderes que os criminosos que dominam o Rio de Janeiro e outros Estados da Federação?
Landes Pereira
Economista e Professor Universitário. Ex-Secretário de Planejamento da Prefeitura de Campo Grande. Ex-Diretor Financeiro e Comercial da SANESUL. Ex-Diretor Geral do DERSUL (Departamento Estadual de Estradas de Rodagem). Ex-Diretor Presidente da MSGÁS. Ex-Diretor Administrativo-Financeiro e de Relações com os Investidores da SANASA.