Muda Brasil: (re) pensando ética para o século XXI
08/08/2015 às 10:45 Ler na área do assinantePensar ética em todos os âmbitos necessários para discutir o Brasil atual, inadvertidamente vai além de o simples conhecer dos contornos teóricos do significado da ética, mas passaria emergencialmente por um passeio a nossas próprias raízes histórico-culturais as quais modelaram nossa forma de ver e nos comportar diante os acontecimentos com o conformismo de poucos no planeta.
Um ponto marcante e muito importante de se discutir reside na religiosidade: como esta moldou nossa forma de ver a ética?
Ética, quanto conjunto de princípios e valores, diferente da moral residida nas leis e costumes, gera reflexão a cerca das nossas condutas sociais e individuais – formação de um constructo necessário no exercício da cidadania e por isso, muito ligado ao sistema político mais democrático.
O problema é que a priori a nossa “ética tupiniquim” é maculada pelo “jeitinho brasileiro”; somos corrompidos logo na infância pelas condutas distorcidas de nossos pais, amigos e parentes próximos, os quais espelham todas suas referências culturais “distorcidas”.
A nossa história começa no exato ponto em que os Portugueses trocam objetos sem valor, por riquezas naturais que os fariam mais ricos do que já eram e concluí-se essa primeira fase no exato momento em que da realização da primeira missa em terras brasileiras, ousou-se a catequização dos nativos, uma autoritária imposição cultural aos povos indígenas.
Desse ponto, a submissão e a gerencia permitida a quem não tinha o direito a terra. Passamos a ser uma colônia, escravizaram-se pessoas e instituíram-se as divisões de classe as quais eram uma novidade aos aborígenes. Essa divisão era simbolicamente constituída pelo mérito do chicote; a lei e a ordem se faziam da seguinte forma: quem esta à margem da sociedade colonizadora, seria “educado” a base de chicotadas ou outras formas de tortura, e seriam obrigados a se distanciar de suas raízes e seguir e admirar a cultura européia, gerando os primeiros fenômenos de aculturação -, nascendo uma mistura heterogênea de práticas e comportamentos.
As relações sociais são regidas por dependência hierárquica e marcadas pelas relações pessoais as quais envolvem uma espécie de aliança entre os poderosos e excluídos. Se pensarmos no sistema político pró-democracia a partir das “Diretas Já” de 1985, este nunca se diferenciou ou difere do que se usava como forma de modelo socioeconômico na era colonial no Brasil.
Diante o signo da religiosidade imperante no Brasil colonial e no Brasil pós-moderno, os arquétipos constituídos em imagens religiosas de Santos e Salvadores, mediante um “catolicismo romanizado” como cita o cientista religioso André Luiz da Silva (PUCSP, 2003), nos sugere um caminho do homem e seus pecados entregue as suas fraquezas, olhando para o céu em busca da onipotência do (s) salvador (es). Em termos de organização de Estado, esse papel sacro fora transferido aos políticos.
O Senador Cristovam Buarque levantou um questionamento outrora muito válido a qual pode responder algumas dúvidas, ele cita a: “privatização da política”, um toma lá, da cá; a “lealdade do voto” a quem garantiu algum bem individual em detrimento ao comunitário.
Fazer política significa ao senso comum o direcionamento do voto de um cidadão para o candidato a um cargo público, sendo que politikos significa "de, para, ou relacionado com os cidadãos” ou da politeía relativo a polis, extensão da coletividade, a discussão sobre o que é bom e necessário para o Estado e Cidadãos.
Durante as campanhas eleitorais, seres humanos comuns se passam por divindades reformadoras. Com discursos repetidos os quais giram em torno do “milagre” no “resgate dos oprimidos”, estes entregam seus santinhos e discursam em prol de uma nova aliança com o povo; “curam os males alheios”, dão dentes a quem precisa morder (dar dentaduras), devolvem a visão aquelas que não podiam ver (cirurgia de catarata), matam a fome (ranchos e bolsas) e tantas outras benevolências que estas figuras “sacras” podem proporcionar. Institucionalizamos a mistificação de figuras problemáticas ao patamar de infalíveis e heróicos – os nossos redentores!
Deuses não podem ser feridos, tocados e desmistificados. Uma militância se agiganta em proteção a imagem “imaculada” que deve ser preservada em sua “santidade”. A ética passa a ser discutido dentro do campo dos tabus, um erro crasso, e passa a ser subvertida quando esta questiona a quem não pode ser questionada. Um cristão questiona Cristo?
A ética para o Brasileiro flutua junto à fábula que se criou sobre a mitologia cristã, ao ponto de se difundir maniqueísmos.
Os princípios e valores são regidos pelo bloco vigente em que se segue referidos, contudo, é só uma reprodução daquilo que sempre existiu na formação histórica nacional. O “jeitinho” é a representação mnêmica de um repertório carnavalesco em que regras não existem para serem respeitadas, a não ser que: ou traga ganho individual, ou através da coerção se faça valer.
“Tudo posso naquele que me fortalece” (Filipenses 4:13), na lógica brasileira: tudo posso quando é conveniente, e a conveniência é correspondente com o cenário moral ao que estamos inclusos. Depende do contexto. O contexto moral segue a risca o cenário político e ideológico em que se estabelecem as relações institucionais as quais inspiram às condutas sociais e idiossincráticas.
Essa ética de deuses pode nos facilitar uma analogia com o poder: quem é tão poderoso e divino, não precisa se questionar a respeito de suas condutas e nem aceitar questionamentos a respeito da mesma.
Para os que confiam em sua “promessa realizadora”, cabe a confiança e a crença inabalada de sua fé de que esta figura lhe trará o bem. Reflete-se a hegemonia das classes dominantes e nos resta à ironia: “Eu sou por ti, não temas”.
Pensar ética para o século XXI principalmente aqui no Brasil é o caminho da superação cultural, da liberdade de escolha e pensamento, época da capacidade questionadora.
Os princípios e valores deverão passar a ser regidos com independência e bom senso, na preocupação coletiva e pelos arautos do bom senso que tanto nos falta em épocas irracionais os quais vivemos.
A mudança será parte de uma ação comunicativa, sim, dentro da percepção tão negligenciada da vivência do mundo próprio; pré-reflexão, dúvida e reversibilidade -, é o princípio do penso, logo duvido, logo existo Cartesiano. É a noção de uma teoria argumentativa em que se passa a perguntar diante os princípios elementares do “posso, devo, quero”, a universalidade dos fenômenos. Rompe-se com a privação das idéias e da representação de uma assimetria ante o discurso qual distancia cultura e ciência, mas que, deveria permitir a simetria ética discursiva aplicável e de sentidos a todos.
Robson Belo
Psicólogo, Psicopatologista e Psicoterapeuta
Clínica, Educação e Empregabilidade
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Robson Belo
Psicólogo