
Crise judiciária e diplomática desnecessária demonstra falta de equilíbrio de Moraes
22/04/2025 às 10:34 Ler na área do assinante
A decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), de interpelar judicial e diretamente a embaixada da Espanha após o país negar a extradição do jornalista Oswaldo Eustáquio, demonstra que o ministro não tem o equilíbrio necessário para integrar nossa Suprema Corte. A atitude de Moraes extrapola todos os limites jurídicos, políticos e diplomáticos. Na diplomacia há certos protocolos a serem cumpridos nas relações entre os países, e que, por lei e pelos costumes, devem ser conduzidos pelo órgão competente, que, no Brasil, é o Ministério das Relações Exteriores.
A notificação enviada por Moraes para a embaixada da Espanha deveria ter sido encaminhada para o Itamaraty, que é quem deve tratar do tema com o governo espanhol. A notificação de Moraes foi feita após ele suspender a extradição de um cidadão búlgaro detido no Brasil a pedido do governo espanhol, Vasil Georgiev Vasilev, acusado de tráfico de drogas naquele país. Na decisão Moraes alega “reciprocidade” como forma de resposta à recusa da Espanha em entregar o blogueiro bolsonarista. O ministro alegou quebra do princípio da reciprocidade por parte da Espanha e exigiu explicações formais da embaixada espanhola em Brasília.
A comunicação direta entre o STF e as representações diplomáticas estrangeiras não faz parte das normas consagradas na diplomacia brasileira. Moraes ficou possesso com a decisão da Espanha de que “A extradição deve ser declarada improcedente por estarmos diante de condutas com uma evidente conexão e motivação política, pois são realizadas no contexto de uma série de ações coletivas de grupos partidários de Bolsonaro, ex-presidente da República Federativa do Brasil, e de oposição ao atual presidente, Lula da Silva”.
O jornalista tem dois mandados de prisão preventiva no Brasi determinados pelo STF por ameaça, perseguição, incitação ao crime, associação criminosa e tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito. Ele se mudou para a Espanha em 2023 e, desde então, é considerado foragido. A reação de Moraes de suspender a extradição do traficante búlgaro até que a Espanha comprove, em cinco dias a partir da última terça-feira (15), a existência de reciprocidade no cumprimento do tratado bilateral de extradição firmado com o Brasil em 1988 foi quase um ultimato. Caso não haja comprovação, o pedido de extradição do búlgaro poderá ser indeferido de forma definitiva. Até lá, Moraes determinou que o traficante fique em prisão domiciliar com uso de tornozeleira eletrônica.
A valentia de Moraes foi tanta que o próprio governo Lula achou que a decisão lhe causou um certo embaraço diplomático. Moraes determinou que o governo espanhol, por meio de sua embaixada, apresente informações que comprovem os motivos da rejeição da extradição do blogueiro, além de solicitar que a embaixadora espanhola “preste informações em cinco dias, comprovando o requisito da reciprocidade, em especial do caso citado anteriormente”.
A decisão de Moares levou os deputados do Novo a apresentarem um requerimento direcionado ao ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, pedindo explicações sobre a decisão do ministro que suspendeu a extradição do cidadão búlgaro condenado por tráfico de drogas na Espanha. O requerimento diz que há uma preocupação com a interferência do Judiciário em assuntos de competência do Executivo, principalmente nas relações exteriores. Os parlamentares ressaltam também “a necessidade de proteger as boas relações bilaterais com um dos principais parceiros do Brasil na União Europeia”, classificando a atuação do STF como “potencialmente danosa” à diplomacia brasileira.
Para justificar suas atitudes Moraes costuma dizer que o referendo do colegiado do STF às suas decisões mostram que elas estão bem fundamentadas. O problema é saber qual delas, pois a maioria de suas decisões é de cunho monocrático, sem aprovação do colegiado, de modo que só podem ser averiguadas individualmente, caso por caso. Seus colegas, reservadamente, têm criticado as decisões de Moraes, alegando, inclusive, que elas estão passando dos limites. O problema é que todos, sem exceção, temem contrariá-lo, pois ele, sozinho, decide pelo Supremo e pelo Brasil.
Luiz Holanda
Advogado e professor universitário