Os bastidores da crise na CBF que calou jornalistas, o envolvimento do PCdoB e a liminar de Gilmar Mendes

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A Confederação Brasileira de Futebol (CBF) enfrenta uma crise que vai muito além dos gramados. Denúncias de má gestão, pressão sobre jornalistas, interferência política e decisões judiciais controversas colocam a entidade no centro de um dos episódios mais delicados do futebol brasileiro recente. E agora, com a revelação do papel direto do PCdoB no caso, esse escândalo ganha novos contornos.

No dia 7 de abril de 2025, o programa Linha de Passe, da ESPN, foi inteiramente dedicado às denúncias da revista Piauí contra a gestão de Ednaldo Rodrigues, presidente da CBF. O conteúdo expôs gastos suspeitos com viagens durante a Copa de 2022, aumentos salariais para presidentes de federações estaduais e contratações sem transparência. No dia seguinte, seis jornalistas que participaram do programa foram afastados pela emissora. Dois dias depois, voltaram ao ar, mas o dano já estava feito: a suspeita de censura ganhou corpo.

A ESPN alegou um erro de processo interno. A CBF negou interferência. Mas a reação pública foi imediata, com jornalistas, torcedores e entidades de classe denunciando o episódio como sinal de submissão aos interesses da Confederação  que mantém contrato de transmissão com a emissora para a Série B do Brasileirão.

Em paralelo, outra linha dessa crise corre no Supremo Tribunal Federal (STF). Em dezembro de 2023, Ednaldo foi afastado da presidência da CBF por decisão do Tribunal de Justiça do Rio, que apontou irregularidades no Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) que permitiu sua eleição. Em janeiro de 2024, no entanto, o ministro Gilmar Mendes concedeu liminar que o reconduziu ao cargo, sob argumento de que a intervenção poderia gerar sanções da FIFA, que não reconhece interferência judicial em entidades esportivas nacionais.

E é justamente nesse ponto que entra o PCdoB  agora de forma direta. O partido ingressou formalmente com uma ação no STF em defesa de Ednaldo Rodrigues. Alegou que sua destituição colocaria em risco a autonomia do futebol brasileiro e violaria princípios constitucionais. A iniciativa foi vista como uma jogada estratégica para manter influência sobre a entidade e fortalecer o discurso de representatividade e estabilidade institucional.

O apoio não veio só nos autos. Lideranças do PCdoB também atuaram politicamente em defesa de Ednaldo, em diálogo com membros do Judiciário e do governo federal. O partido tem histórico de atuação em políticas públicas ligadas ao esporte e viu no caso uma oportunidade de projetar protagonismo institucional.

A situação ganha ainda mais peso com a revelação de um contrato assinado em agosto de 2023 entre a CBF e o Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), fundado por Gilmar Mendes. O convênio, de R$ 150 milhões ao longo de dez anos, entrega ao IDP a gestão da CBF Academy, braço de formação profissional da Confederação. O documento foi assinado por Ednaldo Rodrigues e Francisco Schertel Mendes, filho do ministro Gilmar, que também é diretor do instituto. Apesar da ligação direta, Gilmar não se declarou impedido ao julgar o caso.

A sobreposição de interesses — políticos, judiciais e econômicos — levanta suspeitas sérias sobre imparcialidade, favorecimento e conflitos éticos. O episódio da ESPN expôs como a CBF tenta, na prática ou na percepção pública, controlar críticas. Já a atuação do PCdoB e o contrato com o IDP evidenciam como a entidade se tornou peça estratégica num jogo muito maior que o futebol.

Enquanto isso, o julgamento definitivo sobre a liminar que mantém Ednaldo no cargo está paralisado, após pedido de vista do ministro Flávio Dino. E a pergunta que fica é: quem, de fato, está apitando esse jogo?

Foto de Carlos Arouck

Carlos Arouck

Policial federal. É formado em Direito e Administração de Empresas.