Ministro ou plenário, o que vale mais?

01/09/2017 às 09:58 Ler na área do assinante

Como identificar a posição do Supremo Tribunal Federal sobre a possibilidade de alguém ser preso antes do trânsito em julgado da decisão? Tão importante quanto a decisão do ministro Gilmar Mendes que impediu a prisão de réus já condenados em segunda instância é o que ela significa em termos institucionais. A manifestação de Gilmar é representativa de práticas desenvolvidas pelos ministros que contribuem para fragmentar a Corte e desorientar a sociedade.

Ela revela como a individualidade prevalece sobre a colegialidade. Monocraticamente, o ministro contraria a tese que prevaleceu no Supremo por 6 a 5 no habeas corpus do ano passado que rompeu com a jurisprudência da Corte e foi confirmada posteriormente em cautelares e ações declaratórias de constitucionalidade. Sozinho, parece ter condições de desestabilizar a posição do tribunal sobre o assunto.

Além disso, o voto de Gilmar se sustenta, entre outros argumentos, não sobre decisão do pleno, mas sobre uma decisão da 2ª Turma, de sua própria relatoria, e um voto vencido do ministro Dias Toffoli, como se ambos pudessem, de alguma forma, exprimir a autoridade de toda a instituição.

Gilmar Mendes não é o primeiro ministro a, em decisão individual, discordar do plenário. Provavelmente não será o último. O que parece é que, no Supremo, os precedentes da Corte só são importantes quando estrategicamente úteis para confirmar posições individuais. Se um ministro concorda com a decisão do plenário, então recorre à sua autoridade para reafirmar a sua posição. Quando discorda, cita as suas próprias decisões monocráticas, votos vencidos ou quaisquer outras manifestações como fundamentos das suas decisões.

Diante da incerteza sobre a posição da Corte, qual a saída? Sabe-se que Gilmar mudou de opinião. Mas não se sabe se o Supremo mudará também. Caberia à ministra Cármen Lúcia levar novamente a questão ao plenário.

Essa decisão, no entanto, cria algum desconforto para a presidente e para a instituição. Ao comunicar publicamente que vai alterar a sua posição quando voltar ao plenário, Gilmar coloca a ministra Cármen em aparente xeque-mate.

Já se conhece de antemão o resultado. A mudança do voto do ministro provavelmente levará à mudança de orientação da própria Corte. Ironicamente, a solução do problema depende de outra manifestação individual: a de Cármen Lúcia.

Enquanto ela não vier, duas realidades continuarão a conviver: a do plenário e a das manifestações individuais. Ampliando as incertezas sobre o que, de fato, é capaz de limitar os ministros do Supremo.

Fernando Leal

Advogado e professor da Fundação Getúlio Vargas

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