Que saibam Jacob Barata, Gilmar & Guiomar que a neta brasileira de Oscar Wilde também recebeu flores
30/08/2017 às 14:16 Ler na área do assinanteQue coincidência intrigante! Nesta terça-feira (29), dia em que a força-tarefa da Lava-Jato no Rio e procuradores da República divulgaram o envio de ofício a Rodrigo Janot, anexando a prova de que em 23 de novembro de 2015 o empresário Jacob Barata Filho enviou R$200,10 de flores para a residência, em Brasília, do ministro Gilmar Mendes e esposa, quem também ganhou, no mesmo dia, um belo bouquet de 30 rosas colombianas, ao preço de R$429,87 foi a senhora H., que é neta do escritor irlandês Oscar Wilde.
O motivo das flores de Barata para o ministro e esposa é que é incomum, é intrigante e precisa ser explicado. Já as que recebeu a senhora H, foi por estar completando 102 anos de idade, lúcida, independente, culta, com boa saúde e naturalizada brasileira desde a década de 40 quando ela, sua mãe e seu tio, fugiram para o Brasil por causa da guerra e foram morar em Niterói.
Dela, há anos cuido eu, com dedicação e muito amor. Daí minha ida de táxi ontem, até o Irajá, subúrbio do Rio, onde a senhora H. voltou a residir, por não ter gostado da experiência de morar no Grajaú. Voltei lá para entregar as rosas em mãos, beijá-la e saborearmos, só nós dois, um café ao estilo londrino, cidade em que nasceu em 1915. Motivo mais do que justo, não é mesmo?
Agora, quanto às flores de Barata, o "Rei dos ônibus", para um ministro da Suprema Corte e sua esposa, só eles sabem dizer a razão do gesto que, por sinal, foi de extrema amabilidade, externando amizade sólida, ainda que a preço barato.
Cá pra nós, duzentos reais e 10 centavos de flores, compradas pela internet na FloresOnLine e entregues por mensageiro, é o barateamento de uma riquíssima amizade. Mas que valha o gesto, e não o preço, nem as flores que, pelo custo, podem ter sido margaridas. Ou girassóis, os mesmos que João Dória, prefeito de São Paulo, recebeu de uma anciã ciclista e, irritado, atirou no chão da rua e partiu com o carro.
Deixemos de lado este embate de suspeição entre Janot, Barata, Gilmar e falemos de coisas boas e belas. Falemos da excelentíssima senhora H.
Desde que Ancelmo Góis, anos atrás, divulgou no O Globo que uma neta de Oscar Wilde era brasileira, aposentada do INSS, morava no Rio e dela cuidava eu, que jornalistas do mundo inteiro têm me ligado pedindo entrevista. É inútil. Sempre consulto, mas a senhora H, não concorda.
A filha póstuma de Cyrill, o filho mais velho do casamento de Oscar Wilde com Constance Lloyd, é intransigente.
"Se o mundo souber que eu existo, o Rio vai receber mais jornalistas para me entrevistar, filmar e fotografar do que recebeu na Olimpíada e eu não tenho mais idade para isso. Vivi no anonimato até hoje, por que haverei de aparecer agora?".
Ela também não quer se tornar rival de seu primo, Merlin Holland, de 72 anos, o único filho vivo de Vyvyan (irmão de Cyrill) e que mora em Paris. Depois do escândalo com o marido, Constance e seus dois filhos trocaram o sobrenome de Wilde para Holland e foram morar em Paris, cidade onde Oscar morreu depois de cumprir a pena de prisão de dois anos por homossexualismo! E Cyrill morreu em combate na primeira guerra, defendendo a França.
A namorada de Cyrill estava grávida quando ele morreu. A criança nasceu logo a seguir, ainda em 1915. "Nos anos 40, minha mãe, meu tio (irmão de minha mãe) e eu decidimos viajar para o Brasil. Minha infância na Grã-Bretanha foi de infelicidade. Minha mãe sofreu muito. Imagina numa época, ainda impregnada dos valores da Rainha Vitoriana, uma jovem grávida e trazendo na barriga um descendente de Oscar Wilde, isso seria escandaloso, Por isso, o silêncio e a ocultação. Fui registrada apenas com o nome de minha mãe, o que já foi outra vergonha, principalmente nas escolas. "Filha sem pai", ouvia dizer. Era doloroso. Mas já adulta, com os meus 25/26 anos, todos fomos muito bem recebidos em Niterói, onde existia e ainda existe uma colônia e um clube de ingleses, não preconceituosos.". E prossegue, com voz firme e postura majestática: "Em Niterói minha mãe começou a costurar para clientes, meu tio foi trabalhar num estaleiro e eu fui dar aulas de inglês. Assim conseguimos nos manter".
Eis um brevíssimo resumo. Há muito, muito mais para contar. É uma história que o mundo precisava saber. A senhora não acha que está escondendo uma parte da história da literatura irlandesa, inglesa, do todo o mundo ocidental e uma parte da história do seu avô? E a humanidade não tem a primazia de conhecer? tornei a lhe perguntar nesta visita de ontem. "Sim, doutor Jorge, o senhor tem razão. Vou repensar sobre esta sua reflexão. Talvez eu apareça. Afinal estou viva e ainda com saúde", me respondeu esta rainha que me deixa corado de vergonha quando me trata de "senhor" e de "doutor". Sou nada mais do que seu súdito. Um súdito-protetor. Um súdito que ama a sua rainha.
Mas, para finalizar, voltemos a Janot, Barata, Gilmar e Guiomar. Qual a razão das flores que o "Rei dos ônibus" enviou ao ilustre casal?
Jorge Béja
Advogado no Rio de Janeiro e especialista em Responsabilidade Civil, Pública e Privada (UFRJ e Universidade de Paris, Sorbonne). Membro Efetivo do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB)