Carnaval, a farra dos aplicativos de mobilidade urbana

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Tudo bem que os aplicativos de transporte se subsumem na evolução natural do transporte alternativo das grandes cidades. Uber, 99, InDriver, EasyTaxi, dentre outras – já chegaram competindo preço – bom para o consumidor que se viu diante de opções bem mais baratas que o taxi comum.

Na sucessão dos fatos, rapidamente o brasileiro integrou o aplicativo de transporte ao seu cotidiano. Da balada do sábado à noite ao vai e vem do trabalho de segunda à sexta, o transporte por aplicativo foi adotado.

Porém, nem tudo é um mar de rosas. Há muito que a sociedade já percebeu a vulnerabilidade no que se refere a segurança dos usuários, sobretudo crianças e mulheres, ao optarem por essa alternativa de transporte. Não foram poucos os crimes de estupro e importunação sexual praticados pelos motoristas de aplicativo e veiculados pela mídia. Muito desses motoristas já possuíam anotações em suas folhas de antecedentes penais.

No afã de cadastrarem seus motoristas e ampliarem suas frotas, essas empresas se revelaram incapazes de procederem a uma triagem séria e digna da segurança que a função requer.

Faz-se necessário uma maior fiscalização estatal no que se refere a um controle mais eficiente, uma investigação social que vise proporcionar uma rede de motoristas profissionais sérios e de confiança. Isso evitará uma série de tragédias.

Como concessionários do serviço público, os motoristas de taxi tinham uma relação intensa e estreita com o poder público municipal. A população estava bem mais segura quanto a vida pregressa do motorista que lhe atendia.

Nada impede que essas empresas de mobilidade urbana procurem uma parceria com o poder público para que haja uma maior fiscalização através de convênios de reciprocidade de informações – tudo com os devidos cuidados exigidos pela LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados). Mas ao que tudo indica, não há interesse dessas empresas. Não há compromisso social.

Portanto, não bastasse essa vulnerabilidade macabra dos seus motoristas, outra característica desses aplicativos de mobilidade urbana que vem tomando forma é o monopólio da atividade através da unificação e similaridade dos preços.

Sempre que há grandes eventos ou datas comemorativas como Natal e Ano Novo, o valor das corridas dispara na casa dos mil porcentos. Isso significa dizer que uma corrida de 10 reais num dia normal, pode vir a custar 100 reais numa data como essa.

A justificativa é plausível: lei da oferta e procura; menos motoristas nas ruas porque a maioria ficou em casa com a família. Subindo o preço estimula o motorista a trabalhar, pois será mais bem recompensado.

Entretanto, o que se vê é uma uniformização nos preços – com as duas ou três maiores concorrentes oscilando valores similares ao mesmo tempo. Isso aponta para a formação de cartel – pois estão combinando preço. Mais uma vez elas irão se defender, dizendo que os valores sobem e descem de acordo com a disponibilidade de motoristas e tempo de espera.

Mas é muita coincidência oscilarem ao mesmo tempo, os mesmos valores.

Está mais que nítido um enriquecimento ilícito por parte dessas plataformas, é só investigar. Hoje em dia, nesses feriados mais tradicionais, a criatura que resolver contratar um carro de aplicativo para levar sua família até a casa de um parente, já sabe que será extorquida a pagar um valor surreal, em razão do preço estar orbitando no que eles chamam de “dinâmico”.

Na época dos taxis isso não existia. Os valores oscilavam apenas entre bandeira 1 e bandeira 2. O mercado era muito mais moralizado.

Atualmente até os taxistas aproveitam para cobrar o que querem nessas datas comemorativas ou em grandes eventos. Acabou o mínimo de ética.

No carnaval então, é uma farra total! Desde sexta-feira que a profissão mais rentável do mundo é ser o dono de um aplicativo como esse. O preço sobe e não baixa nunca. O folião fica sem opção! Entre um bloquinho aqui e outro ali, para brincar carnaval você vai ter que destinar um bom dinheiro para a sua locomoção. 

Pior são os percalços da vida, como o ocorrido com um folião das Laranjeiras, ao desembarcar num bloquinho na Zona Sul do Rio de Janeiro. O motorista foi embora antes que ele tivesse tempo de retirar seu cooler lotado de gelo e cerveja de primeira qualidade. O motorista não atendeu mais o telefone e a informação do aplicativo é que irá se manifestar em 72 horas. Aí já passou o carnaval, não é mesmo?

Coloque-se no lugar do infeliz motorista que está trabalhando em pleno carnaval. De repente vê um cooler cheio de cerveja gelada pronta para o consumo – é um sinal de Deus de que já trabalhou muito. “Pode beber, meu filho, com a benção de Deus”...

O episódio em apreço consta no site Reclame Aqui, não com essa riqueza de detalhes.

Alô autoridades! Aqui não se acusa ninguém, mas vale investigar.

Foto de Carlos Fernando Maggiolo

Carlos Fernando Maggiolo

Advogado criminalista e professor de Direito Penal. Crítico político e de segurança pública. Presidente da Associação dos Motociclistas do Estado do Rio de Janeiro – AMO-RJ. 

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