O artigo 312 do Código de Processo Penal estabelece a condição e os fundamentos para que uma pessoa possa ser presa preventivamente no Brasil.
Como condição básica é haver provas da existência (materialidade) do crime e indícios suficientes de autoria. Havendo essas provas, passa-se a examinar os três fundamentos, bastando caracterizar-se um deles para que a prisão seja fundamentada. A prisão pode ser decretada: 1) como garantia da ordem pública ou da ordem econômica; 2) por conveniência da instrução criminal ou 3) para assegurar a aplicação da lei penal.
Essa é a lei.
A partir de agora vamos explicar cada um desses institutos jurídicos previstos no artigo 312 do CPP. Ao final de cada abordagem o leitor terá capacidade de análise e poderá julgar se a condição ou o requisito estudado está presente na prisão preventiva decretada em desfavor do General Braga Netto. Lembrando que se a prisão foi decreta sem que estejam presentes a condição e um dos fundamentos, pelo menos, a prisão é ilegal e quem a decretou responderá pelo crime de abuso de autoridade.
Vamos começar pelo básico: “quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria”. Como se sabe, a conduta criminosa deve ser prevista em lei (princípio da anterioridade da lei penal), de forma clara e precisa (princípio da taxatividade). O agente deve ter praticado essa conduta – ou ao menos ter tentado pratica-la – e ter sido frustrado por motivos alheios à sua vontade. Isso porque no Brasil o delito só é punível a partir da sua execução. Cogitação e atos preparatórios não são puníveis.
Pensar em cometer um crime todos nós podemos pensar, não é punível. Conversar com alguém pessoalmente ou virtualmente e expressar essa vontade de cometer um delito e idealizá-lo, também não é passível de punição. Onde está a materialidade do crime que o Gal. Braga Netto teria cometido? E pior: onde está a prova indiciária de autoria desse crime? Simplesmente não há nenhuma prova – uma sequer – não há.
“Como garantia da ordem pública ou da ordem econômica”, é a urgência que o caso requer para que, solto, o criminoso não torne a delinquir, prejudicando outras vítimas. Para tanto, o caso deve ser atual e a prisão deve ser decretada com contemporaneidade. Os fatos objeto da prisão do Gal Braga Netto foram passados há dois anos atrás – há necessidade de prender (lembrando que a prisão é uma medida excepcional)? Não há a menor necessidade – os fatos ficaram no passado.
“Por conveniência da instrução criminal”, significa que temos um processo ou investigação em curso e o delinquente está ameaçando testemunhas, intimidando peritos, fabricando provas e coisas do gênero. Também não é o caso do General Braga Netto.
Por fim, como terceiro e último fundamento, a prisão preventiva pode ser decretada “para assegurar a aplicação da lei penal”. Ocorre quando o criminoso reside em local incerto ou quando o risco de fuga é grande – e ele não cumprirá a sentença de prisão – o que também não é o caso do Gal. Braga Netto?
Então com base em que foi decretada a prisão do general?
Ora, prezado leitor, com base unicamente na vontade de um único ministro.
A decisão que deveria ter sido baseada na lei e, subsidiariamente, na jurisprudência, foi fundada exclusivamente na vontade de uma única criatura – careca – do STF.
Aliás, diga-se de passagem, decreto de prisão expressamente contrário a jurisprudência, porque há uma decisão de 2019, do próprio Supremo Tribunal Federal, de relatoria do ministro Gilmar Mendes, de que prisão preventiva não pode ser decretada com base em delação premiada. A prisão do Braga Netto foi baseada na delação premiada do Coronel Cid (e de uma forma forçosa ainda por cima).
Enfim, uma prisão absolutamente ilegal.
Não é a primeira e não será a última.
São dois os objetivos alcançados com a essa prisão: 1) intimidar o povo – inibir as iniciativas populares e o surgimento de lideranças. Se prendem general de quatro estrelas, o que dizer de um cidadão comum? 2) intimidar os próprios militares com a prisão de um general de primeira grandeza.
Esses são os recados.
O que estamos vivendo no país é pior do que qualquer estado de guerra.
Há muito que os ocupantes dos assentos da Suprema Corte perderam o pudor. Aqueles que deveriam proteger a Constituição são os primeiros a subverterem seus preceitos.
O que se cogita nas redes sociais é a paralização total do país. O caminhoneiro encostar seu caminhão em casa e o povo parar a economia do Brasil.
Melhor seria se o Senado Federal fizesse seu papel, mas como a grande maioria dos senadores estão com o rabo preso na Justiça e o presidente da casa é um ordinário que come nas mãos da corte, somos obrigados a assistir da arquibancada o nosso país descer pelo ralo.
A prisão do Braga Netto é um indicativo de que o golpe fatal será a prisão do Bolsonaro.
Carlos Fernando Maggiolo
Advogado criminalista e professor de Direito Penal. Crítico político e de segurança pública. Presidente da Associação dos Motociclistas do Estado do Rio de Janeiro – AMO-RJ.