Morando nos EUA, percebi duas consequências imediatas do resultado das eleições nos EUA:
a) Cotação das criptomoedas dispara – o Bitcoin saltou seis mil dólares em um único dia para uma alta histórica de US$ 75.371. A posição de Trump sobre criptomoedas contrasta fortemente com a do governo Biden, que liderou uma repressão radical às empresas de criptomoedas.
b) Moeda do Irã despenca para níveis historicamente baixos – o que é bom para a queda do terrorismo.
Na minha visão, isso não tem nada de ideológico ou “volta ao conservadorismo” como disseram alguns apresentadores tendenciosos da Globo.
Há 4 aspirações que explicam a volta dos republicanos e de Trump:
1) Recuperação econômica – testemunhei a inflação disparando sob Biden. Os americanos também votam com o bolso. Para eles, a melhor propaganda eleitoral é quanto sobra no final do mês. A gestão Biden se caracterizou pelo constante aumento da inflação e dos juros, o que encareceu a vida de todos nos EUA.
2) Combate à criminalidade - São Francisco e Nova York viram um aumento na violência urbana e criminalidade sob administrações democratas, servindo como maus exemplos para o país.
3) Recuperação do prestígio internacional dos EUA, prejudicado pelas indefinições de Biden.
4) Resgate da consistência institucional que havia fortalecido e desenvolvido os EUA – agora ficarão enfraquecidos o movimento “woke”, o antissemitismo institucional e universitário, o parasitismo estatal, o apoio oficial a drogas, e os excessos do politicamente correto. Não me entendam mal: apoio direitos iguais para LGBTs+ e todos, mas rejeito extremismos como um boxeador que ganha lutas contra mulheres porque se identifica como mulher ou a teoria que me classificaria como racista estrutural só por eu ser branco.
O resultado dessas eleições nos permite refletir sobre a limitação dos rótulos políticos. O mundo não está dividido entre “direita” e “esquerda” ou entre “socialismo/comunismo” e “capitalismo”. Muitos usam rótulos para simplificar. Não é uma questão de fundo ideológico, mas de visões de mundo diferentes. Aqueles que usam camiseta do Che Guevara e põem a culpa de tudo no “sistema capitalista” precisam entender duas coisas:
a) Há duas visões de mundo diferentes, mas as duas são capitalistas. O capitalismo liberal do ocidente (EUA, Canadá, União Europeia, Austrália, Japão etc. e suas esferas de influência) e o capitalismo estatal de países totalitários (China, Rússia, Irã, e suas esferas de influência). Há forte competição por mercados entre eles.
b) Não há outro sistema de produção que funcione a não ser o capitalista. Todas as experiências comunistas/socialistas fracassaram como sistema alternativo de produção. A “esquerda” diz que não foram bem implementados. Mas não há exemplos concretos, só nas promessas de campanha.
Uma “Grande Mentira” a ser esclarecida: a “esquerda” não é a única que tem consciência social. Por exemplo, um amigo americano me explicou por que vota nos democratas (“esquerda”). Segundo ele, os republicanos (“direita”) tendem a ser racistas e tendem a ignorar questões sociais. Ele se coloca em um plano moralmente superior, sentindo-se justo e socialmente correto por votar na “esquerda”. Aliás, muitas pessoas com quem conversei que se dizem “socialistas de esquerda” são fortes beneficiários do capitalismo e vivem muito bem.
Não sou racista e tenho consciência social, mas fiz duas perguntas:
1) Por que a “esquerda” americana, com as melhores intenções possíveis, acabou contribuindo para o aumento da violência e da criminalidade? Por que os programas sociais dos democratas se transformaram em incentivos para dependência ao seguro-desemprego, para uso de drogas, incentivo para imigração ilegal, para altíssimos custos com subsídios sociais, resultando em uma crise de habitação e em um círculo vicioso de dependência estatal que acabou afetando a economia, indiretamente ajudando Trump?
2) Por que a “direita” é automaticamente rotulada de racista e socialmente insensível por defender uma visão menos paternalista e mais justa do Estado, uma visão construtiva com relação a programas sociais de geração de emprego que não criem dependência social? Em outras palavras: por que a “esquerda” acaba premiando a preguiça e a dependência ao invés de premiar o empreendedorismo e aqueles que querem trabalhar de verdade? Isso não tem nada a ver com ideologia, mas com a natureza humana.
Não são perguntas fáceis de responder. Qualquer resposta abstrata é acadêmica ou é campanha política. O eleitorado americano mostrou que não estava satisfeito com Biden e sabia que votar em Kamala significaria mais do mesmo.
E no Brasil? Uma pesquisa em junho de 2024 realizada pelo Senado Federal (DataSenado) mostra que a maior parte da população brasileira com direito a voto não se considera politicamente nem mais à direita, nem mais à esquerda, nem mais ao centro. Ou seja: não há polarização ideológica entre direita e esquerda, mas um contraste entre os que confiam e os que não confiam no governo. Segundo a plataforma alemã Statista, o nível de confiança do brasileiro no governo é de apenas 42%.
E o bolso do brasileiro? O resultado das recentes eleições municipais indicou uma clara vontade de mudança. Ver o pagamento de supersalários para alguns juízes e funcionários públicos, recordes de prejuízos nas estatais com um rombo de R$ 7,2 bilhões em 2024, e desperdícios com a incineração de medicamentos vencidos não ajuda muito. Além disso, segundo o Fundo Monetário Internacional, o Brasil tem um dos governos mais caros do mundo como percentagem do PIB: quase metade do que o Brasil produz serve para custear nossa enferrujada e cara máquina administrativa.
Conclusão: Independentemente de rótulos ideológicos ou políticos, o dia a dia de cada administração vai sempre revelar até que ponto um governo consegue equilibrar o econômico, o social e o ambiental. Ou não.
Em última análise, nos países democráticos um eleitorado consciente e insatisfeito simplesmente vota por mudança. Não é preciso nenhum analista ideológico-político para nos explicar isso.
Jonas Rabinovitch. Arquiteto urbanista com 30 anos de experiência como Conselheiro Sênior para inovação, desenvolvimento e gestão pública da ONU em Nova York.
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