Acordo de leniência para pagar em 22 anos é premiação e incentivo à corrupção

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Mesmo desmoralizado, o governo federal anunciou que assinou o primeiro acordo de leniência. Foi com a UTC, a empresa de Ricardo Pessoa.

UTC e Pessoa nada mais são do que dois corruptos da Lava Jato que roubaram o dinheiro do povo brasileiro e  que causaram duradouros e consideráveis perdas financeiras e morais à Petrobras, Eletrobras e Valec. Valor do acordo: 574 milhões. Mas a forma de ressarcimento  não é de uma só vez. O que houve foi leniência no pior e mais nocivamente impatriótico sentido da palavra. E mais: o pagamento é para ser feito ao longo dos próximos 22 anos!. Não, o povo não pode entender como essas coisas acontecem.

Existem perguntas, que são devidas e naturais e que as autoridades precisam  responder e explicar à população pelos meios de comunicação de massa e mais abrangentes quanto possíveis, de tal sorte que até os índios desconectados do Amazonas fiquem cientes, não é mesmo ministro Herman Benjamin?

Se, menos de dois meses atrás, o acordo era negociado em maio por 1 bilhão, por que foi reduzido para pouco mais da metade em tão pouco tempo? Por que pagar em 22 anos (264 meses) e não de uma só vez? Com o dólar na casa de 3,26 e o Euro valendo 3,71, aqueles 574 milhões ficam reduzidos em torno de 165 milhões em moeda estrangeira. E tudo isso abrangendo 29 contratos com o Poder Público que foram fraudados e superfaturados! E esse é o exato valor que varia de 0,1% a 20% que a Lei da Leniência (nº 12.529/11, artigo 37) fixa como pena sobre o faturamento bruto da UTC no ‘ano anterior’, que foi 2016?

Segundo o acordo, 70% dos 574 milhões vão para a União e 30% para a Petrobras, Eletrobras e Valec, as empresas lesadas, a título de ressarcimento! Como se explica essa distribuição? É a União fazendo caixa? Qual ou quais critérios foram adotados? Estimativa a ôlho nu? Por amostragem? Ou contabilidade pericial, policial e real? Sim, porque o Tribunal de Contas da União já decidiu que acordo de leniência não precisa ser aprovado pelo Ministério Público Federal. E aí é que residem o perigo e a desconfiança. Quem teve coragem para roubar através de cartel e propina, também tem coragem de lesar nas contas destinadas ao ressarcimento. Nunca vi na vida um bandido se recuperar e se tornar pessoa honesta.

Veja o leitor como o tratamento é desigual, desproporcional e revoltante. Se uma pessoa sonega o Imposto de Renda e depois, espontaneamente, vai e paga, a multa sobre o valor sonegado é de 37,5% (fora o imposto), tudo acrescido de juros e correção monetária. Já se o sonegador é apanhado pela fiscalização da Receita Federal, o valor da multa é de 75% sobre o valor sonegado, mais juros, mais o imposto devido, correção monetária e ainda fica sujeito à pena de prisão pelo crime de sonegação fiscal. E mais: todo brasileiro sabe que os juros do Cartão de Crédito e do Cheque Especial vão além dos 400% ao ano. Os banqueiros são inclementes.

E nos querem ver mortos e a família sem dinheiro para pagar o enterro.

Ora, ora, diante de tão desleal desproporção, vem agora o desmoralizado e corrupto governo comemorar este suspeitíssimo acordo de leniência com a UTC de Ricardo Pessoa? Não, o povo brasileiro não entende isso. Estamos todos esmagados, pela corrupção, pelas mentiras, pelas enganações...e pela violência que não é apenas aquela que tira a vida das pessoas, das criancinhas, mas a que nos tira o pão de cada dia, em silêncio, de terno, de gravata e de dentro dos palácios.

Com licença, Marco Cícero, nos permita também perguntar: ‘Quosque tandem abutere, Brasil, patientia nostra?’ (Até quando, Brasil, abusarás da nossa paciência?). 

Jorge Béja - Advogado no Rio de Janeiro e especialista em Responsabilidade Civil, Pública e Privada

(UFRJ e Universidade de Paris, Sorbonne). Membro Efetivo do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB)

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Jorge Béja

Advogado no Rio de Janeiro e especialista em Responsabilidade Civil, Pública e Privada (UFRJ e Universidade de Paris, Sorbonne). Membro Efetivo do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB)

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