Numa ditadura não se apuram as denúncias, mas quem denunciou

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Você realmente acredita que vivemos numa democracia?

Vejamos.

Dois jornalistas publicam uma matéria num dos maiores jornais do país denunciando ao mundo que um ministro da mais alta corte de Justiça está cometendo as maiores barbaridades contra o estado democrático de Direito, contra os direitos humanos e contra o devido processo legal.

Milhares de brasileiros são presos em consequência dos seus atos insanos. Alguns morrem e outros são torturados. Veículos de comunicação são censurados e perseguidos. Jornalistas e influenciadores são obrigados a deixar o país sob pena de serem presos. Outros, que ficaram, são intimidados e calados por esse ministro cujo poder é capaz de neutralizar até deputados e senadores.

A insegurança jurídica causada no país patrocinada por essa leviandade sistêmica abalou a economia, promoveu a miséria e expulsou os investidores internacionais.

Como se não bastasse tudo isso, as denúncias chegam a comprovar que até as últimas eleições presidenciais sofreram forte interferência desse ministro, que era, ao tempo dessas eleições, a autoridade máxima no comando do pleito eleitoral. Estamos falando de crimes contra a segurança nacional – delitos que atentam contra a soberania do Brasil.

Porém...

No lugar de apurar as denúncias, a cúpula do Judiciário brasileiro concentra esforços em descobrir quem as vazou – quem é o denunciante.

O nome disso é DITADURA.

A intenção é clara: anular as provas.

O próprio perito já confirmou que as provas são verdadeiras. O ministro está num beco sem saída. Se o Pacheco sucumbir à pressão, a única forma de tentar escapar de um impeachment e de uma avalanche de ações judiciais, cíveis, administrativas e criminais – é anulando as provas.

Segundo o nosso ordenamento jurídico, uma prova obtida através de uma conversação telefônica, troca de e-mails ou de mensagens por aplicativos de internet, somente serão consideradas lícitas se estiverem respaldadas por mandado judicial que quebre o sigilo da privacidade ou se essas provas forem utilizadas ou divulgadas espontaneamente por um dos interlocutores dessa conversa, de forma livre e consciente.

A criatura decide, então, instaurar um procedimento judicial para que se investigue a licitude das provas – e não as denúncias lá contidas - que são infinitas vezes mais sérias. Um contrassenso, um despautério. Além disso, é mais um procedimento em que ele é a vítima, o juiz que preside o feito e o investigador. Ele não precisa do Ministério Público.

E acredite: o ministro Barroso, além de endossar as atividades do colega, não determinou a instauração de nenhum procedimento que vise apurar o objeto das denúncias - os crimes cometidos em sua casa.

Mais uma vez: o nome disso é DITADURA DA TOGA.

Vale lembrar as palavras de Rui Barbosa, de que “a pior ditadura é a ditadura do Poder Judiciário. Contra ela, não há a quem recorrer”.

Assim, àqueles que responderam ainda acreditar que vivemos numa democracia, convém registrar que apenas um seleto grupo de países apuram os seus crimes dessa forma. Na China, as denúncias contra o Partido ou em Cuba as denúncias contra o Governo, seguem esse padrão de investigação e perseguição. Na Rússia ou na Venezuela nem se fala – é tudo ao arrepio da lei.

A situação do Brasil é ainda pior. Nossa ditadura é mais sofisticada e complexa. A relativização da democracia e a subversão de valores constitucionais abriu espaço para o crime organizado nas relações espúrias do poder.

O Senador Girão pediu o apoio dos colegas ao projeto de resolução (PRS 11/2019), que obriga o presidente do Senado a analisar pedidos de impeachment de ministros do STF em até 15 dias. O projeto estabelece ainda que, se o presidente indeferir o pedido para abertura de processo de impeachment, poderá ser levado recurso ao Plenário, assinado por, no mínimo, um terço dos membros da Casa.

Contudo, segundo o site do próprio Senado Federal, um projeto de 2019, ainda está na Comissão de Constituição e Justiça aguardando designação de relator, ou seja, vai demorar muito – o Brasil não tem tempo para esperar.

Somente a força do povo será capaz de por fim a essa ditadura que vivemos. Conscientize-se e não se deixe intimidar.

Foto de Carlos Fernando Maggiolo

Carlos Fernando Maggiolo

Advogado criminalista e professor de Direito Penal. Crítico político e de segurança pública. Presidente da Associação dos Motociclistas do Estado do Rio de Janeiro – AMO-RJ. 

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