A atuação paralela de Alexandre de Moraes nas investigações contra aliados de Bolsonaro

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O ministro Alexandre de Moraes, ao criar o que se poderia chamar de uma "Abin paralela" para obter informações sobre apoiadores de Bolsonaro, extrapolou os limites de sua função.

Tal ação levanta questões graves que podem culminar em um processo de impeachment por abuso de poder e desvio de função.

O ministro fazia pedidos de produção de relatórios contra determinados alvos ao juiz instrutor de seu gabinete, Airton Vieira.

Essas solicitações eram enviadas através de mensagens no WhatsApp, sem o trâmite formal de ofícios ou decisões, diretamente para Eduardo Tagliaferro, chefe da Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação (AEED) do TSE.

Recentemente, conversas de WhatsApp revelaram que esses pedidos informais de Moraes resultaram na produção de relatórios contra determinados alvos, incluindo figuras políticas ligadas ao ex-presidente Jair Bolsonaro, como Eduardo Bolsonaro e outros aliados.

Um exemplo específico ocorreu em 6 de outubro de 2022, quando Vieira solicitou a Tagliaferro um monitoramento urgente das redes sociais desses deputados. Três dias depois, um relatório de 66 páginas foi entregue, contendo informações detalhadas, como prints de postagens nas redes sociais. Esse conteúdo incluía, entre outras coisas, postagens de fake news associadas a figuras como Carla Zambelli e Bia Kicis. Não está claro como o gabinete de Moraes utilizou esses relatórios, mas o ministro alega que todos os procedimentos foram realizados de forma oficial e documentada.

A questão, no entanto, não se limita ao juiz auxiliar de Moraes. Um policial militar que atua no Supremo Tribunal Federal (STF) na equipe do ministro, Wellington Macedo, também fez pedidos fora do rito para a produção de relatórios ao setor de combate à desinformação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Diálogos de WhatsApp obtidos pela Folha mostram que não foi apenas Airton Vieira que solicitou, por vias informais, levantamento de dados a Eduardo Tagliaferro. Wellington Macedo, lotado no gabinete de Moraes, fez pedidos a Tagliaferro para apurar fatos relacionados à segurança do magistrado e seus familiares, como o vazamento de dados pessoais e ameaças enviadas para números ligados ao ministro ou publicadas nas redes, além de informações sobre prestadores de serviço que trabalhariam na residência de Moraes. Em pelo menos um caso, Tagliaferro afirmou ter levantado informações sigilosas com a ajuda de um policial civil de São Paulo "de sua confiança".

O uso de plataformas como o WhatsApp para procedimentos oficiais é inadequado e não deveria ser permitido.

Entretanto, o verdadeiro problema vai além disso. A questão central reside no fato de que esse procedimento não deveria sequer ter sido realizado. O princípio básico da imparcialidade judicial estabelece que quem julga não pode investigar, direcionar investigações ou escolher os investigados. Quando isso ocorre, há um vício insanável e uma clara parcialidade do julgador, o que compromete a integridade do processo.

Não há, na estrutura do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), qualquer "poder de polícia" que justifique a atuação de Moraes à frente da corte e nos inquéritos ainda em curso no Supremo Tribunal Federal (STF). Ações inquisitoriais e autoritárias têm marcado os últimos anos, com o apoio de alguns colegas de tribunal e o silêncio de uma parte significativa da sociedade civil.

Um artigo da Folha de S.Paulo traz à tona uma conversa preocupante sobre como uma investigação foi conduzida em relação à imprensa de oposição, especificamente à Revista Oeste.

O trecho expõe a maneira como o processo de desmonetização das redes sociais da revista foi tratado por membros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

A comunicação revela que a decisão de desmonetizar as redes da Revista Oeste não foi baseada em evidências concretas. Quando o servidor do TSE, Tagliaferro, afirmou que não encontrou nada relevante nas publicações, o juiz auxiliar sugeriu que ele "usasse a criatividade" para justificar a desmonetização. Isso levanta sérias dúvidas sobre a imparcialidade e a justiça do processo.

A troca de mensagens é marcada por um tom de ironia, com o uso de "rsrsrs" para amenizar a gravidade da situação. Esse tom informal e jocoso entre os envolvidos sublinha a falta de seriedade com que uma decisão de grande impacto, como a desmonetização de uma plataforma de mídia, estava sendo tratada.

Tagliaferro e sua equipe monitoravam redes sociais e grupos de conversas para produzir os relatórios conforme os pedidos do gabinete de Moraes. Posteriormente, esses relatórios eram enviados para o inquérito das fake news, no gabinete de Moraes, como se os monitoramentos e investigações tivessem sido realizados de forma espontânea. Moraes utilizava esses relatórios para fundamentar decisões contra apoiadores de Jair Bolsonaro, citando que havia recebido o material da AEED, mas sem revelar que ele próprio havia solicitado a produção desses documentos.

A troca de mensagens indica uma possível pressão para encontrar ou criar justificativas que sustentassem a decisão já tomada ou desejada pelo ministro. A frase "O Ministro entendeu que está extrapolando com base naquilo que enviou" sugere que o resultado da investigação já estava praticamente definido, independentemente das evidências ou falta delas.

A metodologia empregada foi o método OSINT (Open Source Intelligence) para a identificação de fatos informacionais, objeto deste relatório, através de bancos de dados abertos. Nesta etapa, foram utilizadas palavras-chave relacionadas a termos antidemocráticos, nomes de instituições e eventos que possam estar associados às atividades descritas.

O conteúdo analisado aponta para uma série de ações que podem ter comprometido a integridade do processo de investigação e a imparcialidade das decisões judiciais. A comunicação entre os membros do TSE e do STF, conforme descrito, revela uma possível manipulação de informações para justificar medidas contra determinados alvos, o que merece uma análise mais profunda sobre o impacto dessas práticas na confiança das instituições democráticas.

Foto de Carlos Arouck

Carlos Arouck

Policial federal. É formado em Direito e Administração de Empresas.

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