Os donos da “Casa de Suplicação” e a Manipulação da Nação

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“A crença em uma origem sobrenatural da maldade não é necessária. Os homens sozinhos são capazes de qualquer maldade”. (Joseph Conrad (1857-1924), escritor britânico).

Os que elaboraram a Constituição de 1988 nunca imaginaram que a “Casa de Suplicação do Brasil” (1808-1829) - era esse o antigo nome do STF quando nasceu - iria se tornar o que hoje se tornou: a “Casa Grande”. E o resto do país converteu-se em Senzala. A “Casa Grande” é a residência luxuosa dos 11 Ministros, uma espécie de novo Olimpo dos Deuses. Eles são os donos da Casa Grande e da Senzala.

Os novos senhorios, advogados de partidos políticos militantes, foram nomeados pela conveniência do Presidente de plantão, não pelo o que há na legislação, isto é, os Ministros devem possuir “notável saber jurídico” e possuírem “reputação ilibada”.

Mas por incrível que pareça todos fogem da explicação do que é “notável saber jurídico” e afirmam que isso não compete ao STF, pois analisar “esse requisito, nos termos da Carta Política de 1988, é de atribuição privativa do Presidente da República e do Senado Federal, sob pena de violação ao princípio constitucional da Separação de Poderes”.

É bastante conveniente a explicação. Isto significa que o requisito “notável saber jurídico” é de avaliação subjetiva e deve ser feita pelo Presidente no momento da indicação e pelo Senado no momento da aprovação.

Dessa forma nada sutil foram abertas as portas para entrada dos advogados militantes que hoje, de forma vitalícia, ocupam a “Casa Grande”.

Quanto ao requisito de natureza moral: “reputação ilibada”, exigido para o ocupante do cargo, também passou a ter “cunho subjetivo”, pois essa análise também é feita pelo Presidente da República e pelo Senado Federal.

Notem que o compadrio foi armado. Se assim é, o “amigo do amigo do meu pai” também pode entrar.  E por que não um advogado do MST? Um militante que defendeu o terrorista Cesare Battisti ou um ex-governador? Melhor mesmo é nomear o advogado pessoal. E assim foi feito. E assim está constituída a “Casa Grande”.

Sobre o atual Presidente da “Casa Grande”, Barroso, disse Rodrigo Constantino em artigo para a Gazeta do Povo, intitulado “La garantia soy yo: Barroso pede que confiemos nele”! em 14/05/2021:

- “O mesmo que foi advogado de defesa do terrorista Cesare Battisti; o mesmo que já confessou desejar "empurrar a história" em direção à "justiça racial"; o mesmo que promove ativismo judicial sem ter votos, buscando legislar sobre casamento gay ou drogas; o mesmo que leva a sério o imitador de focas a ponto de realizar um "debate" sobre política com ele; agora nos pede a confiança nas urnas eletrônicas, pois ele "garante".

Sim, Barroso, garante. A garantia é Barroso, o advogado que defendeu Cesare Battisti, o terrorista italiano que matou quatro pessoas na Itália e Barroso afirmava para todos os brasileiros que ele era inocente.

Em 2011 o site Conjur publicou uma reportagem intitulada "O advogado que garantiu a liberdade de Battisti" e Barroso foi indagado por que decidira defender um homem condenado em seu país por quatro assassinatos. Ele respondeu assim:

- “Por que, então, embarcar nessa aventura? “A causa era bonita”, justifica. O advogado viu beleza no fato de defender "um velho comunista, que faz parte do lado derrotado da história, e que a Itália, 30 anos depois, veio perseguir no Brasil". Acima de tudo, Barroso acreditou em Battisti. "O Cesare me olha nos olhos e diz: “Não participei de nenhum desses homicídios”. Eu acredito no que ele me diz”.

A verdade é que em 1987, Cesare Battisti foi condenado pela justiça italiana por terrorismo à prisão perpétua, pela autoria de quatro homicídios, além de assaltos e outros delitos menores.

Em 2019, quando estava na Bolívia, Cesare Battisti foi preso e entregue às autoridades italianas onde cumpre prisão como criminoso comum, pois não cometeu crime político. Sua conduta foi de um terrorista assassino. Lá ele confessou os crimes, mas Barroso afirmava que ele era inocente.

E assim viveu alguns anos, no Brasil, tranquilamente, com apoio do governo de esquerda do PT, desfrutando de mordomias.

Em 2020, cinicamente, Lula, em entrevista afirmou:

- “Eu, como todo mundo que acreditou no Cesare Battisti aqui no Brasil, ficou frustrado. Eu não teria nenhum problema de pedir desculpas à esquerda italiana por ele ter enganado muita gente no Brasil. Se nós cometemos este erro, pedimos desculpa”.

Frustrado? Inocente? Nós? Quem, cara pálida? Esse “nós” a que ele se refere deve ser ele e Barroso e os petistas que protegeram um assassino durante anos garantindo que ele era inocente.

E de garantia em garantia chegamos a outro deus dos pés de barro: Morais!

Segundo a narrativa do “Consórcio de Imprensa”, Morais é o defensor da democracia. Morais impediu o golpe de estado. Morais é o garantidor do estado de direito. Morais é o que acusou os vândalos que foram a Brasília de associação criminosa. Morais disse que havia nessa atitude tentativa de abolição violenta do Estado Democrático. Morais afirmou que era uma tentativa de golpe de Estado. Morais disse que aquilo era uma ameaça, perseguição e incitação ao crime.

E quem não confiar na palavra de Moraes é Bolsonarista, de extrema direita e golpista!

E a palavra do deus Moraes por si só basta.

É a garantia da verdade e da justiça, segundo todos os áulicos da imprensa que incensam Morais.

Assim Moraes aplicou multa de milhões a pobres que participaram do quebra-quebra e acusou, julgou e condenou todos a 17 anos de prisão.

Agora aparece o jornalista Glenn Greenwald, em reportagem na Folha e publica gravações comprovando que o ministro Alexandre de Moraes usou a máquina do TSE para instruir decisões tomadas por ele próprio no STF.

Essas evidencias e o conluio entre o STF e TSE para produzir provas contra os acusados puxa o tapete de Moraes e do “Consórcio de Imprensa”.

O deus dos pés de barro está derretendo sob a chuva de denúncias.

E Moraes rebateu afirmando:

-“Seria esquizofrênico me auto-oficiar, até porque, como presidente do TSE, no exercício do poder de polícia, eu tenho… eu tinha o poder, pela lei, de determinar a feitura dos relatórios”.

Os relatórios são aqueles mesmos que ocultaram sua atuação no encaminhamento dos pedidos, das orientações e do material.

Moraes é o poder. Moraes, na época era Presidente do STF e do TSE. Ele batia o escanteio, corria para cabecear a bola e fazia o gol. Isto é, ele pedia, na surdina, as investigações, recebia e denunciava, julgava e depois condenava.

A realidade clareou um pouco o mundo das sombras do STF e o palavreado oco dos Ministros que engabela a multidão todos os dias afirmando e repetindo: “eu sou a garantia” se desfez como a neve se liquefaz sob o sol.

Assim como no caso de Cesare Battisti condenado na Itália, mas para Barroso  e Lula era inocente, também as gravações desmentem todos os comportamentos dos Ministros amigos que correram para defender Moraes .

Afirmam eles que tudo ali foi legal, pois Alexandre Moraes garantiu que tudo era legal e sua conclusão também foi legal.

Além de tudo o país descobriu uma nova polícia, a polícia eleitoral do TSE, a polícia de Morais, segundo Guzzo no Estadão.

A jornalista Malu Gaspar, em artigo para o Globo, disse:

- “O material mostra que Moraes encomendava relatórios sobre os bolsonaristas investigados por ele no STF a técnicos da Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação do TSE.
Depois (às vezes apenas horas depois), usava os documentos como base para medidas como quebra de sigilo, bloqueio de perfis, cancelamento de passaportes e intimações – mas, em vez de dizer que encomendara o material, fazia constar nos processos que eles haviam sido produzidos por iniciativa do próprio TSE ou recebidos via denúncia anônima”.

Nos áudios obtidos pela Folha, um juiz auxiliar de Moraes demonstrou preocupação com a forma de atuação dos gabinetes do ministro:

- "Formalmente, se alguém for questionar, vai ficar uma coisa muito descarada, digamos assim. Como um juiz instrutor do Supremo manda [um pedido] pra alguém lotado no TSE e esse alguém, sem mais nem menos, obedece e manda um relatório, entendeu? Ficaria chato”.

Mas os donos da antiga “Casa de Suplicação e da Senzala” reagiram. No plenário do STF, Barroso, segundo Felipe Moura, tomando um cafezinho, falou em “tempestade fictícia” e Gilmar Mendes partiu para o ataque afirmando que as denúncias são:

-“Ataques que visam a minar a independência e a integridade das instituições que sustentam o Estado Democrático de Direito”;
- “Setores críticos à atuação do STF no combate às fake news, na defesa da democracia e da lisura das eleições”;
- “Tentativa de reconstrução, com uma nova roupagem, de teses de defesa de investigados que, há muito, procuram deslegitimar a atuação do eminente relator nessas investigações”.

As mesmas lorotas de sempre.

- “Na verdade, Gilmar e outros aliados de políticos e empresários acusados de suborno procuraram deslegitimar a atuação de juízes e procuradores da Lava Jato com a narrativa do “conluio” e do “Estado policialesco”, com frequência baseada em ilações sobre conteúdo não autenticado de mensagens roubadas por hackers.

Agora, defendem a versão monocrática e licitamente comprovada do mecanismo que dizem repudiar. Uma versão na qual o juiz investiga, produz as provas, acusa e julga, sem nada mais que dar ciência, quando muito, ao Ministério Público. Em outras palavras: o “conluio” de um homem só”. (O Antagonista - A Operação abafa da Lava-Toga).

Os advogados militantes, hoje desempenhando cargos de Ministros, ocupam a “Casa Grande” e fazem o que querem com a Senzala. Eles instituíram um regime autoritário e nele se lambuzam. As enciclopédias definem o “autoritarismo” em um país com estas características:

•      Exclusividade do exercício do poder;
•      Arbitrariedades;
•      Enfraquecimento dos vínculos jurídicos do poder político;
•      Alteração da legislação institucional criando regras para a auto manutenção do poder;
•      Restrição substancial das liberdades públicas e individuais;
•      Impulsividade nas decisões;
•      Agressividade à oposição;
•      Controle do pensamento;
•      Censura às opiniões;
•      Cerceamento das liberdades individuais, de pensamento, religiosas e de imprensa;
•      Cerceamento das liberdades de movimentação;
•      Emprego de métodos ditatoriais e compulsórios de controle político e social.

Praticamente todas as características relacionadas estão presentes no Brasil.

Finalizo com as palavras do escritor Tamás Bereczkei em seu livro “Mentes maquiavélicas: a psicologia da manipulação”, página 29:

- “McIllwain (2003) sugere que maquiavélicos usam seu cinismo para criar certo tipo de desequilíbrio de poder entre eles e suas potenciais vítimas. Eles não estão preocupados se os outros têm pesos iguais em uma negociação com eles. Eles se sentem superiores aos outros uma vez que eles estão convencidos de dispor de um verdadeiro conhecimento das condutas dos outros, diferentemente das crenças dos outros neles mesmos.
Eles pensam que as pessoas são dirigidas mais por forças externas do que internas.  Por essa razão, pessoas ordinárias são incapazes de dominarem suas condutas e controlarem suas vidas. Este é o ponto onde os maquiavélicos entram em ação e, como outra força externa, eles assumem o controle  dos pensamentos e ações  dos outros.   Nesse ponto, os maquiavélicos se colocam no papel de cientistas  sociais ingênuos  da vida cotidiana,  que  acreditam  piamente que eles sabem mais das pessoas do que os outros  indivíduos. Ademais, eles vão além do escopo teorético e voltam seu conhecimento para a prática, para obter benefícios”.

Bom final de semana a todos.

Foto de Carlos Sampaio

Carlos Sampaio

Professor. Pós-graduação em “Língua Portuguesa com Ênfase em Produção Textual”. Universidade Federal do Amazonas (UFAM)

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