A verdadeira crise brasileira é no campo da ética: Os psicopatas do poder

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Muito antes da eleição do Bolsonaro em 2018, o Brasil já vinha afogado numa crise ética sem precedentes. Foram longos 16 anos de poder em que o país foi assaltado. A ganância tomou conta das atividades estatais.

São os psicopatas do poder.

Estrategicamente esses psicopatas passaram a controlar a mídia com contas de publicidade milionárias. Num primeiro momento, a mídia passou a comer nas mãos deles, literalmente. Num segundo momento, se tornou cúmplice desse macabro projeto de perpetuação do poder.

Como se não bastasse, ao longo desses 16 anos, nomearam seus cupinchas para a mais alta Corte do país, controlando também o Judiciário.

O que já estava ruim se tornou pior ainda.

Ao longo de duas décadas eles ficaram no comando da Educação desse país e infiltraram seus militantes nas escolas e universidades – eles dominam tudo.

O modelo do homem de sucesso para quem nasceu no ano 2000 e hoje tem 24, por exemplo, é aquele diretor de uma estatal ou uma autoridade pública – ou um empresário, morador de uma cobertura na beira da praia ou de uma mansão cercada por seguranças e com 5 carros importados na garagem – cujo patrimônio não corresponde ao seu salário, mas à corrupção institucionalizada.

Esse rapaz de 24 anos consegue detectar que houve um enriquecimento ilícito por parte da autoridade ou do empresário e que a conduta dele é reprovável porque é contra a ética, pois causa mal à coletividade. “Mas pouco importa”, conclui o rapaz, “porque no final das contas esse mesmo indivíduo corrupto goza de excelente prestígio social, é tratado pela mídia como uma referência de boa conduta e respeitado pai de família”. 

A crise ética, por si só, já é favorável e contribui para o surgimento de novos psicopatas no cenário social. Você sabe o que é um psicopata? É um ser desprovido de consciência. Diferente de mim e de você, ele é incapaz de se colocar no lugar do outro – é indiferente a tudo e a todos – não tem empatia por nada e nem por ninguém.

Um psicopata nunca vai ter crise de consciência, porque ele é absolutamente privado de qualquer vestígio dela. Uma criatura assim é capaz de cometer as maiores atrocidades - diariamente - em nome de um projeto pessoal de vida.

As pesquisas mais conservadoras apontam um psicopata para cada vinte pessoas que vivem em sociedade. Esse número é ainda mais estreito conforme se sobe na escala de poder social.

Tudo isso são dados científicos que você pode encontrar na obra da renomada psiquiatra americana, Martha Stout, “Meu vizinho é um psicopata” – ou ainda no consagrado ensaio “Mentes Perigosas, o psicopata mora ao lado”, da igualmente brilhante psiquiatra brasileira (e carioca), Ana Beatriz Barbosa Silva.

O fato é que vivemos uma crise ética que se agravou nos últimos tempos, onde nem a Justiça é justa. A distorção e o enfraquecimento dos valores éticos abriram espaço para a subversão desses valores. Verdadeiros militantes travestidos de “garantistas” ocuparam esse espaço muito antes da Ditadura da Toga.

Foi a partir dessa subversão de valores, em nome de um “garantismo” exacerbado, que começamos a viver essas aberrações sociais. Talvez a cena mais grotesca e que melhor retrate essa insensatez que estamos narrando, ao mesmo tempo que demonstra a quão antiga é essa crise ética que vitima o povo brasileiro, remonta aos tempos em que o Rodrigo Pimentel era oficial do BOPE.

Numa operação que estava sob o seu comando, quando já haviam cercado um sequestrador com refém, eis que aparece o polêmico Desembargador Siro Darlan, que todos conhecem. Siro se apresentou e deixou claro que estava ali zelando pelos direitos do bandido, pouco se importando com a vida da vítima, refém do sequestrador.

É errado aquele dito popular de que “a ocasião faz o ladrão”. A ocasião faz o crime. O ladrão já nasce feito.

Se os psicopatas do poder já têm dentro deles a intenção de tirar proveito do erário público de maneira fácil e de se beneficiarem com as artimanhas da corrupção, mesmo que tenham que lesar toda a população trabalhadora do Brasil – o poder vai trazer à tona isso. O poder vai potencializar essa tendência que esse psicopata já traz dentro de si desde que nasceu. 

É claro que eu e você trazemos dentro de nós um pacto com a nossa consciência. Um pacto de integridade, de lisura e de honestidade. No nosso caso, o poder potencializa essas qualidades, mas estamos falando dos psicopatas – daqueles desprovidos de consciência – um em cada vinte – lembra?

O poder não vai inventar em mim ou em você uma falta de ética.

Mas...

Numa sociedade em que os preceitos éticos e de Justiça se distanciam cada vez mais da nossa convicção, onde a ética é imposta por coerção, o poder potencializa a capacidade lesiva daqueles que já têm tendência a tirar proveito das situações – e isso é preocupante.

É claro que se eu tenho em mim uma ética impregnada por convicção, eu permanecerei fiel a essa ética, mas se essa ética é imposta por coerção, é mais fácil de ser quebrada.    

Já não se trata de uma crise ética sem precedentes, mas uma situação de descalabro.

São muitos os psicopatas no poder. 

Foto de Carlos Fernando Maggiolo

Carlos Fernando Maggiolo

Advogado criminalista e professor de Direito Penal. Crítico político e de segurança pública. Presidente da Associação dos Motociclistas do Estado do Rio de Janeiro – AMO-RJ. 

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