Ex-inspetor da Boeing revela uso de peças sucateadas na montagem de aviões
05/07/2024 às 21:49 Ler na área do assinanteUm ex-gerente de controle de qualidade da Boeing, Merle Meyers, alegou que trabalhadores da fábrica do 787 Dreamliner em Everett, Washington, usavam rotineiramente peças descartadas em um ferro-velho interno na montagem dos aviões. Meyers, que trabalhou por 30 anos na Boeing, detalhou uma prática não oficial que permitia o uso de peças danificadas para cumprir prazos de produção.
Este ano, vários denunciantes levantaram questões sobre os processos de fabricação da Boeing, incluindo a ocultação de peças defeituosas dos inspetores da Administração Federal de Aviação dos EUA (FAA). Algumas dessas peças podem ter sido instaladas em aviões, levantando preocupações sobre a segurança pública.
Meyers descreveu os lapsos de controle de qualidade como intencionais e organizados para atender aos cronogramas de produção. Ele estima que cerca de 50.000 peças escaparam do controle de qualidade e foram usadas na construção de aeronaves desde o início dos anos 2000. Essas peças variavam de pequenos parafusos a montagens complexas como flaps de asa.
Apesar de muitas peças inadequadas serem pintadas de vermelho para sinalizar sua impropriedade, isso não impediu que fossem utilizadas na montagem de aviões, segundo Meyers. “É um problema enorme”, afirmou ele, destacando a importância de manter as peças boas separadas das ruins.
Meyers, que afirma ter sido forçado a deixar a Boeing no ano passado, acredita que, embora a prática de usar peças do ferro-velho tenha cessado, o uso de outras peças não aprovadas continua. E-mails internos mostram que ele alertou repetidamente a equipe de investigações corporativas da Boeing sobre essas violações, sem sucesso.
A Boeing não contestou as alegações de Meyers, afirmando que investiga todas as denúncias de comportamento impróprio e implementa melhorias quando necessário.
As alegações de Meyers surgem em meio a uma série de controvérsias sobre a cultura de segurança da Boeing, incluindo uma investigação criminal sobre a certificação do 737 Max. Dois acidentes fatais com o 737 Max em 2018 e 2019 resultaram na morte de 346 pessoas, levando a intensas investigações federais e do Congresso.
Denunciantes adicionais também relataram problemas contínuos com peças não conformes sendo usadas na fabricação de aviões. Sam Mohawk, outro investigador de qualidade da Boeing, apresentou uma reclamação oficial relatando a reincidência do problema.
Meyers descreveu um ambiente de pressão na fábrica de Everett, onde equipes competiam para encontrar peças necessárias, inclusive recorrendo a métodos não autorizados para obtê-las. Ele afirmou que peças rejeitadas por diversos departamentos acabavam sendo usadas mesmo assim, sem registro oficial no banco de dados da empresa.
Apesar de repetidos alertas e denúncias, Meyers sentiu que os esforços de investigação da Boeing eram insuficientes. Em um e-mail de 2002, ele criticou a empresa por buscar desculpas em vez de tomar medidas contra os violadores de processos.
Em resposta, a Boeing valorizou o papel da equipe de qualidade e afirmou incentivar os funcionários a levantarem suas preocupações confidencialmente.
Meyers disse que inicialmente não pretendia se tornar um denunciante, mas agora fala com aqueles que o procuram para promover mudanças na empresa. “Espero que possamos fazer com que esta empresa se cure e volte a ser o que era”, concluiu.