De condenado a palestrante, o “sobrevivente do sistema penintenciário”, o desrespeito para com a sociedade e o afastamento da juíza
25/06/2024 às 13:38 Ler na área do assinanteDurante uma aula sobre "proteção do vulnerável, acesso à justiça e direito antidiscriminatório", proferida para os novos juízes do Tribunal de justiça de Minas Gerais (TJMG) e patrocinada pela Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (ENFAM), a juíza aposentada, Cristiana de Faria (professora da ENFAM), convidou o advogado Gregório Antônio Fernandes de Andrade para fazer um pronunciamento sobre o tema.
O convidado tem dado palestras para magistrados, muito embora possua no currículo uma condenação por estupro e assassinato de uma criança de cinco anos, além de uma prisão em flagrante pelo crime de racismo.
Membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB mineira, o palestrante se descreveu como um "sobrevivente do sistema penitenciário", fazendo severas críticas ao judiciário e à polícia, além de defender o abolicionismo penal e a legalização das drogas.
Alguns magistrados classificaram a apresentação como um exemplo de “bandidolatria”, expressando indignação ao inusitado fato.
O TJMG afirmou não ter qualquer responsabilidade na escolha de representantes para proferirem suas palestras, mas a repercussão do fato não foi dignificante para a corte.
O STJ decidiu excluir a juíza do treinamento feito pela Escola, proibindo-a de participar dos eventos de formação de novos magistrados.
Realmente, uma pessoa com uma folha corrida desse naipe não pode nem deve ser convidada para proferir palestras para magistrados, pois isso, além de um absurdo, é um ato de desrespeito para com a sociedade e para com a própria Justiça.
No processo consta que “GREGÓRIO ANTÔNIO FERNANDES DE ANDRADE, qualificado nos autos, foi denunciado pela prática das condutas delitivas tipificadas no art. 121, §2o, I, III, IV e V, c/c o art. 61, II, “f” e “h”, e art. 214, caput, c/c o art. 226, II e III, ambos na forma do art. 69, todos do Código Penal pátrio. Consta da inicial acusatória que, no dia 24 de janeiro de 1.997, na parte da manhã, o acusado matou a criança Layrion Tarcísio da Silva, à época com cinco anos de idade.
Narra-se que o modus operandi do denunciado consistiu em socar a cabeça do infante em algo sólido e, posteriormente, ao perceber que a vítima ainda estava viva, objetivando intensificar o sofrimento desta, introduziu-lhe algo cilíndrico no ânus, causando hemorragia interna por lesão no mesentério, que foi a causa eficiente do óbito”. A condenação foi de 16 anos e cinco meses de prisão.
Mesmo se sabendo que a Justiça brasileira e os seus arredores continuam a causar espantos cotidianos, não se concebe uma atrocidade desse limite, nem que uma magistrada, professora da Escola, convide um condenado para falar sobre proteção de vulnerável, cuja fragilidade é tamanha que a sociedade insiste em proteger pessoas como o palestrante.
Este causídico cometeu uma atrocidade inigualável ao estuprar e matar uma criança de apenas cinco anos.
A sentença que o condenou afirma que ele “perpetrou o homicídio com o fito de ocultar os atos libidinosos diversos da conjunção carnal que havia acabado de praticar em detrimento da vítima, tendo, para saciar a sua lascívia, mordido-a em diversas partes do corpo, inclusive no pênis”. Acresça-se a isso uma prisão por ter injuriado um policial chamando-o de "preto filho da puta", sendo encaminhado ao Centro de Remanejamento Prisional (Ceresp), em Belo Horizonte.
Ele afirma que não cometeu o crime, e que foi mantido sem celular, sem telefone e sem alimentação por cerca de 3 horas por agentes penais, no Ceresp. Entretanto, e de acordo com o boletim de ocorrência, ele pediu a um preso, seu cliente, para escrever uma carta para a família, ocasião em que lhe informaram que a ação ia contra as normas de segurança do estado. Nervoso e aos gritos, ofendeu uma outra policial taxando-a de “vagabunda, você é filha da puta igual ao seu colega mesmo”. O advogado e palestrante nega tudo isso, dizendo-se inocente. Mas o fato é que é assim que consta no boletim de ocorrência.
Seja como for, vai ser difícil esquecer que ele foi condenado a 16 anos e cinco meses de prisão por ter violado e trucidado uma criança de apenas cinco anos. Como disse certa feita o sociólogo e ativista dos direitos humanos Herbert José de Souza (Betinho), "Se não vejo na criança, uma criança, é porque alguém a violentou antes e o que vejo é o que sobrou do que lhe foi tirado". No caso da criança violentada e morta pelo palestrante, não sobrou nada.
Luiz Holanda
Advogado e professor universitário