O acordo milionário e em tempo recorde entre o BB e um grupo que teve como sócio um ex-ministro de Lula e Dilma
23/06/2024 às 08:18 Ler na área do assinanteGradativamente situações preocupantes estão vindo à tona.
Parece que a torneira foi aberta com o fito de beneficiar os ‘amigos do poder’.
Mais uma denúncia contra o atual governo, desta vez publicada pela Revista Crusoé indica direção nesse sentido.
Em setembro de 2023, o Banco do Brasil fechou um acordo de R$ 600 milhões com o Grupo Caiman, encerrando uma disputa judicial que durou 30 anos. Segundo a revista Crusoé, a presidente do banco, Tarciana Medeiros, com apoio de Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB) e seu pai, Vital do Rêgo, do Tribunal de Contas da União (TCU), aprovou o acordo em tempo recorde.
O Conselho Diretor do banco deu a aprovação final em 12 de setembro, apesar de alertas do departamento jurídico sobre o risco de o acordo ser visto como uma simulação para evitar débitos fiscais e trabalhistas.
A maior beneficiária é a família do empresário maranhense Antônio Celso Izar, que tinha como sócio Edison Lobão, ex-ministro de Lula e Dilma Rousseff. Ex-executivos do banco criticaram a transação, classificando-a como “imoral” devido ao seu valor.
O processo ainda apresentava possibilidades recursais, com parecer do Ministério Público Federal favorável ao banco. Políticos influentes pressionaram o Planalto para encerrar a contenda e, em 2022, solicitaram demissões na alta cúpula.
Irregularidades no acordo do Banco do Brasil
Documentos obtidos pela Crusoé indicam que o acordo pode ter burlado credores, incluindo a União. No litígio, estavam envolvidas duas empresas do Grupo Caiman: a Aimar Agroindustrial do Maranhão S/A, com um passivo de R$ 450 milhões, e a Coopergraças, sem dívidas.
Para evitar que os R$ 600 milhões fossem absorvidos pelos credores da Aimar, o dinheiro foi creditado na conta da Coopergraças. O banco argumentou que havia uma penhora de R$ 1,2 bilhão a favor das empresas.
Lucinéia Possar, chefe da diretoria jurídica do Banco do Brasil, reconheceu o risco de o acordo ser considerado uma simulação. “No tocante ao questionamento por negócio jurídico simulado, o risco existe”, escreveram os pareceristas. No entanto, eles consideraram que o risco de condenação do banco era remoto e que o acordo poderia ser financeiramente vantajoso.
Banco do Brasil X Grupo Caiman
A disputa começou em 1985, quando a Destilaria Caiman S/A, agora Aimar Agroindustrial do Maranhão S/A, obteve financiamento do Bird para construir uma destilaria de etanol em Porto Franco (MA). O Banco do Brasil assumiu os riscos de crédito, com Edison Lobão como avalista.
A destilaria tinha como sócios vários membros da família Izar. A Coopergraças foi transformada em cooperativa para utilizar linhas de crédito específicas.
Entre 1985 e 1992, o grupo firmou 12 contratos de crédito com o Banco do Brasil, totalizando US$ 12 milhões. A Coopergraças cultivaria a cana e a Destilaria Caiman a transformaria em álcool. Segundo as regras do Bird, os recursos seriam liberados conforme um cronograma “físico-financeiro”.
Com atrasos na construção, o grupo começou a não cumprir os pagamentos das dívidas ao Banco do Brasil, levando o banco a acionar a Justiça em 1993.
Ações judiciais dos empresários
Os empresários também moveram ações contra o banco e pediram indenizações. A destilaria não havia entrado em operação, e a cana-de-açúcar ainda não estava plantada. Os advogados alegaram que o Banco do Brasil atrasou a liberação dos empréstimos e creditou valores desatualizados, pedindo ressarcimento de US$ 75 milhões para a destilaria e US$ 46 milhões para a Coopergraças.
Em 1995, a 2ª Vara Cível de Imperatriz (MA) deu a primeira decisão contra o Banco do Brasil, baseada nos lucros cessantes da Coopergraças. O caso tramitou em várias instâncias e, após sucessivas condenações, transitou em julgado no STJ em 2007 (Coopergraças) e 2009 (Caiman). O Banco do Brasil entrou com ações rescisórias para tentar reverter as condenações, mas enfrentou instabilidades no TJ local.
Tentativas de conciliação
No início da década de 2020, o caso chegou ao STJ sob a relatoria do ministro Luís Felipe Salomão, que tentou conciliar as partes. Entre 2021 e 2022, houve duas propostas de acordo, mas sem sucesso. A situação mudou com a gestão de Lula. Fausto Ribeiro, presidente do BB até janeiro de 2023, afirmou que nunca assinaria um acordo nesses termos e valores.
“A matéria foi discutida no âmbito do Conselho Diretor e houve decisão explícita de não propor nenhum tipo de acordo”, disse à Crusoé. “Eu, pessoalmente, não topei, porque achava que era algo imoral, por considerar que o Banco do Brasil era credor do grupo empresarial, e não devedor.”
Rossano Maranhão, ex-presidente do BB, também criticou o acordo, afirmando que era necessário esgotar todos os recursos.
“Estamos falando em dinheiro público, é diferente do que acontece na iniciativa privada”, afirmou.
Em março de 2023, no início do governo Lula, o ministro Luís Felipe Salomão indicou que poderia decidir a causa, acelerando as negociações. Em julho, o acordo foi fechado em R$ 600 milhões, considerado vantajoso diante de estimativas de até R$ 5,5 bilhões em caso de condenação. Assim, em 12 de setembro, o Conselho aprovou o acordo em apenas três horas e 15 minutos.
Em nota oficial, o Banco do Brasil classificou as críticas como “ilações” e afirmou que a decisão respeitou “rigorosamente os critérios técnicos e a governança da empresa”, eliminando “riscos jurídicos e financeiros próprios de processos na situação jurídica em que se encontravam”. O banco também anunciou que pedirá à Polícia Federal a abertura de inquérito para apurar o vazamento de documentos internos.
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