A evolução da família é consequência da evolução tecnológica e das relações sociais, influenciando a organização social. Até um passado não muito distante as famílias eram numerosas, os casais tinham um número grande de filhos e de netos. Isso se justificava, basicamente, por dois motivos: a dificuldade para um controle da maternidade eficiente (não existia um anticonceptivo confiável) e a necessidade de se dividir os cuidados de manutenção dos idosos da família. Por outro lado, as pessoas não viviam muito tempo – morriam cedo. Aos cinquenta anos eram idosos problemáticos.
Com o avanço da tecnologia e das leis sociais as coisas lentamente foram mudando. Implantou-se o sistema de aposentadorias, descobriu-se a pílula anticoncepcional, o saneamento básico eliminou grande parte da insalubridade, as condições de trabalho e de alimentação aumentaram a expectativa de vida do brasileiro. Por um lado isso foi bom, mas por outro, tornou o sistema previdenciário insustentável a médio e longo prazo. O número de contribuintes para o sistema foi diminuindo, proporcionalmente, enquanto o número de beneficiários aumentava geometricamente.
Constatado o fenômeno, era preciso tomar providências para corrigir as distorções, sem perder o rumo. No governo de Fernando Henrique Cardoso, em 1999, foi criado o Fator Previdenciário (considerado a Mais-Valia do Trabalho) para o período de 1999/2002, quando deveria ser extinto. Entretanto, continua sendo aplicado para cálculo das aposentadorias por tempo de serviço (sendo opcional para a aposentadoria por idade). É um elemento draconiano e injusto.
O cálculo do fator previdenciário é perverso e considera a expectativa de sobrevida no momento da aposentadoria estimada pelo IBGE, tempo de contribuição até o momento da aposentadoria, idade no momento da aposentadoria, alíquota de contribuição correspondente a 0,31. Na aplicação do fator previdenciário serão somados ao tempo de contribuição do segurado: cinco anos para as mulheres; cinco anos para os professores que comprovarem efetivo exercício do magistério no ensino básico, fundamental ou médio; dez anos para as professoras que comprovarem efetivo exercício do magistério no ensino básico, fundamental ou médio.
Em síntese, hoje, o valor da aposentadoria é igual à média dos 80% maiores salários, corrigidos pela inflação desde julho/94 (limitados ao teto do INSS – R$ 4.663,75) multiplicado pelo fator previdenciário. Os trabalhadores e os sindicatos sempre protestaram contra esse critério, considerando-o injusto, espoliativo e discricionário.
O governo, ao contrário, o considera insuficiente para conter o rombo crescente nos cofres da previdência. Rombos explicáveis pela falta de controle eficaz, e pela impunidade característica da administração pública. O déficit da Previdência no exercício de 2014 totalizou R$ 126 bilhões (2,3% do PIB), sendo R$ 61 bilhões do Regime Geral da Previdência Social (INSS) – que tem beneficiários originários do setor privado (incluindo estatais e área privada), e R$ 65 bilhões do Regime Próprio da Seguridade do Servidor – que possui cerca de um milhão de beneficiários provenientes do funcionalismo público. Observe-se que o regime do servidor, apesar de representar apenas 3% dos atendidos pelo INSS, provocou um déficit maior.
A presidente Dilma enviou ao Congresso uma Medida Provisória elaborada pelos ministros Carlos Gabas (Previdência), Aloizio Mercadante (Casa Civil), Edinho Silva (Secretaria de Comunicação Social) e Joaquim Levy (Fazenda) apresentando a Fórmula 90/100, que garante a aposentadoria sem a redução imposta pelo fator previdenciário. Sem debaterem com os verdadeiros interessados, os ministros estruturaram um sistema progressivo, alegando que poderá haver aperfeiçoamentos. A nova fórmula partirá da estrutura 85/95 e subirá anualmente a partir de 2017 até alcançar os valores 90/100. Como se calcula:
2015/1016: mulheres – idade mais tempo de contribuição igual a 85; homens: idade mais tempo de contribuição igual a 95. Em 2017: mulheres – idade mais tempo de contribuição igual a 86; homens – idade mais tempo de contribuição igual 96. E assim sucessivamente até chegar aos valores 90 e 100, o que ocorrerá em 2021. Mesmo assim, o futuro do sistema previdenciário é uma incógnita para os analistas e para os congressistas.
O sistema não vale para os funcionários públicos que continuam com o privilégio, melhor dizendo, com o direito da aposentadoria integral. O que é justo e deveria ser estendida a todos os trabalhadores. O injusto, como sempre, é o sistema adotado para os parlamentares brasileiros.
A Câmara dos Deputados estendeu o reajuste do salário mínimo para todos os aposentados, mas o texto ainda passará pelo Senado que promete rejeitá-lo. Caso também seja aprovado pelos senadores, a presidente Dilma vetará, em nome do “ajuste fiscal”.
LANDES PEREIRA. Economista com mestrado e doutorado. É Professor de Economia Política.
Landes Pereira
Economista e Professor Universitário. Ex-Secretário de Planejamento da Prefeitura de Campo Grande. Ex-Diretor Financeiro e Comercial da SANESUL. Ex-Diretor Geral do DERSUL (Departamento Estadual de Estradas de Rodagem). Ex-Diretor Presidente da MSGÁS. Ex-Diretor Administrativo-Financeiro e de Relações com os Investidores da SANASA.