O colapso da República e da Democracia

07/06/2024 às 16:00 Ler na área do assinante

Quando quem manda é o crime organizado, e não a Lei;

Quando o projeto de poder é mais relevante que o Projeto de Nação;

Quando o “sucesso” decorre do oportunismo e da esperteza, e não do esforço e do mérito;

Quando quem produz é obrigado a se submeter a quem não produz nada;

Quando o dinheiro flui para quem negocia não com bens, mas com favores;

Quando a riqueza vem pelo suborno e pela influência, e não pela aplicação e pelo trabalho;

Quando a delinquência é recompensada, e a honestidade se converte em auto-sacrifício;

Quando políticos estão mais comprometidos com os conchavos partidários que com as aspirações populares;

Quando parlamentares temem mais ao Judiciário que ao povo que os elegeu;

Quando o Estado é apropriado por poucos e, o público, sequestrado por interesses privatistas;

Quando autoridades constituídas se substituem, elas próprias, às instituições;

Quando o banditismo oficializado se entraja e se adorna, sem pudor, de toga preta e colarinho branco;

Quando juízes premiam a corrupção e as leis, ao invés de garantir a justiça, são desvirtuadas por hermenêuticas subjetivas e casuísticas, ao sabor do “cliente” e das preferências de ocasião;

Quando o Judiciário não julga parlamentares e governantes por crimes de que são acusados, visando ao único intuito de subordiná-los (por ameaça velada) à sua anojosa dominação;

Quando ministros da mais Alta Corte, em franco abuso de autoridade, violam princípios constitucionais e atentam contra o Estado democrático de Direito, traindo, sem decoro, a nobre função para a qual foram escolhidos;

Quando o pluralismo de ideias e a liberdade de opinião são agrilhoados pelo pensamento único e pelo despotismo totalitário;

Quando o uso da palavra vira crime e, a prática delituosa, credencial para a licenciosidade;

Quando a mentira substitui o fato e, a militância, o jornalismo;

Quando o cinismo e a hipocrisia suplantam a ética e a decência;

Quando, enfim, tudo somado, o voto do povo perde a validade diante daqueles que se comprometeram em representá-lo e honrá-lo, então fica evidente que a democracia, definitivamente, desvirtuou-se e, a república, irrevogavelmente, faliu.

Já não mais existe contrato social. Tampouco pacto político. Predomina o “estado de natureza” hobbesiano: o terror, o medo, a insegurança, a barbárie. Impera o reino do suborno, da bestialidade, do arbítrio, da violência.

E se é assim, a sociedade se encontra numa inescapável encruzilhada: ou o povo, reativo, assume, com a devida urgência, a condição de soberano supremo de seu destino e refunda, em outros parâmetros (e a seu favor), o pacto desfeito; ou, passivo, será tolhido, sem clemência, em sua liberdade e cidadania pelos vorazes raptores de plantão, conduzido ao calabouço lúgubre e sombrio da perpétua e humilhante servidão – onde haverá choro e ranger de dentes.

Neste caso extremo, não existe “terceira via”!

Alex Fiúza de Mello. Professor Titular (aposentado) de Ciência Política da Universidade Federal do Pará (UFPA). Mestre em Ciência Política (UFMG) e Doutor em Ciências Sociais (UNICAMP), com Pós-doutorado em Paris (EHESS) e em Madrid (Cátedra UNESCO/Universidade Politécnica). Reitor da UFPA (2001-2009), membro do Conselho Nacional de Educação (2004-2008) e Secretário de Ciência e Tecnologia do Estado do Pará (2011-2018).

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