Por apoio político, governo ignora critérios técnicos e libera bilhões da saúde para cidades incapazes de fazer cirurgias
07/04/2024 às 07:54 Ler na área do assinanteA gravíssima denúncia, por incrível que pareça, é da imprensa tradicional, aquela que ‘fez o L’ e agora, percebendo o precipício para o qual ruma o país, parece arrependida.
Talvez, seja muito tarde, pois essa gente que voltou à cena do crime não tem a menor preocupação com o dinheiro público e nenhum respeito pelo povo brasileiro.
Eis alguns trechos da extensa matéria publicada pelo Estadão:
“O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) distribuiu R$ 8 bilhões do Ministério da Saúde para Estados e municípios em troca de apoio político em 2023, atropelando critérios técnicos da pasta e gerando um descontrole no dinheiro destinado a cirurgias e exames. O recurso enviado para algumas cidades superou em mais de 1.000% a capacidade efetiva de atendimento nessas localidades, enquanto outras ficaram sem recurso.
(...)
O Estadão consultou documentos, ouviu técnicos do ministério, especialistas em orçamento público, parlamentares e prefeitos para analisar os repasses. Os R$ 8 bilhões foram distribuídos conforme regras da Portaria 544, de maio de 2023. Inicialmente, eram R$ 3,5 bilhões herdados do orçamento secreto, esquema revelado pelo Estadão e derrubado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Mas, ao longo do ano, mais dinheiro foi sendo adicionado, como R$ 4,3 bilhões aprovados pelo Congresso para compensar perdas de arrecadação e R$ 241 milhões de emendas de bancada.
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Em documentos oficiais, a ministra da Saúde, Nísia Trindade, negou que os R$ 8 bilhões tenham sido objeto de negociações com parlamentares, mas no Congresso o assunto é tratado com naturalidade. Os encontros aparecem até mesmo na agenda oficial de autoridades da pasta. Integrantes do ministério e parlamentares confirmaram a existência de indicações políticas para destinar os recursos.
Ao alegar emergência e não carimbar as verbas como emendas parlamentares, os recursos de alta e média complexidade superaram o limite estabelecido pelo próprio ministério em 651 municípios, sendo que em 20 deles o teto foi ultrapassado em mais de 1.000%. Os repasses superaram tanto o limite de repasses regulares quanto o de incremento imposto às emendas parlamentares.
Na prática, as prefeituras receberam muito mais dinheiro do que a capacidade para entregar esses serviços. Enquanto isso, outros 1.332 municípios que pediram recursos da mesma portaria não levaram nada. Os maiores beneficiados foram o governo de Alagoas (R$ 166,5 milhões), o governo do Maranhão (R$ 132 milhões) e a prefeitura de Maceió (R$ 103 milhões), reduto do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Só depois aparecem cidades como São Paulo, Teresina e Curitiba.
Em Goiás, os 1.744 habitantes de São João da Paraúna contam com apenas um posto de saúde e nenhum hospital, segundo dados oficiais do Ministério da Saúde. O município declarou ter feito 28 mil procedimentos de média e alta complexidade em 2023, incluindo 4 mil exames de urina. A prefeitura recebeu, em novembro, R$ 1,25 milhão para bancar procedimentos de alta e média complexidade por meio da portaria. Rio Verde (GO), por outro lado, com 225,7 mil moradores e uma produção que superou 2 milhões de procedimentos especializados em 2023, pediu R$ 126,7 milhões por meio da mesma portaria para bancar os serviços, mas não recebeu nada.
O valor repassado para São João da Paraúna representa 4.758% do limite autorizado pelo Ministério da Saúde para alta e média complexidade no município em 2023, que era de R$ 26.271,24. Como o dinheiro foi classificado como emergencial, atropelou esse teto. A parcela supera tudo que a administração municipal gastou com assistência hospitalar e ambulatorial em 2023 (R$ 187 mil) e também tudo que o município planejou gastar com esses serviços no orçamento de 2024 (R$ 452 mil).
(...)
Filadélfia (TO), com 7,7 mil moradores, recebeu R$ 1 milhão de forma emergencial – mas, segundo o próprio Ministério da Saúde, a localidade só tinha autorização para receber até R$ 4,3 mil. O repasse, portanto, ficou 23.215% acima do teto. Desde que recebeu o dinheiro, a prefeitura informou ter gastado R$ 485,8 mil com atenção especializada no município, menos da metade do dinheiro enviado pelo governo de forma emergencial.
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Taguatinga (TO), com 14 mil habitantes, também com um hospital, tinha um teto de R$ 1 milhão e pediu recursos para a pasta de Nísia Trindade, mas não recebeu nada.
Bom Jesus do Galho, um município de 14,5 mil habitantes em Minas Gerais, tem um hospital e sete postos de saúde. Oficialmente, a cidade não tinha autorização para receber nenhum recurso para o custeio de alta e média complexidade no ano passado, mas conseguiu R$ 1,14 milhão da portaria. Enquanto isso, Itabira (MG), com uma população de 113 mil habitantes, três hospitais e 26 postos de saúde, não recebeu nenhum recurso emergencial, mesmo tendo solicitado R$ 48 milhões ao Ministério da Saúde para custear os serviços.
A distribuição do dinheiro foi comandada pelo ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, padrinho da ministra da Saúde no cargo. No papel, o repasse se deu a partir de propostas feitas por Estados e municípios, avaliadas pelos técnicos do ministério. Na prática, prevaleceu a barganha com o Congresso, sob comando de Padilha e com atendimentos ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), a quem coube fazer o rateio entre deputados.”
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