Esquerda entra na Justiça, pede anistia para as construtoras da Lava Jato e quer que o país esqueça a corrupção
06/04/2023 às 14:37 Ler na área do assinanteA ação dos partidos da esquerda radical - Psol, PCdoB - e o Solidariedade, no Supremo Tribunal Federal (STF), pedindo a suspensão do pagamento de compensações pelas empresas envolvidas no maior escândalo de corrupção da história republicana é um marco no processo de degeneração dos partidos políticos brasileiros.
A iniciativa jurídica tenta apagar da memória o único período em que empresas corruptoras e seus dirigentes tiveram o destino normal de suspeitos comuns de ladroagem comum - a cadeia - e faz parte de campanha para recompor o cenário de impunidade anterior aos crimes do petrolão, que, por sinal, não incriminou figuras relevantes dos partidos que impetraram a ação, exceto o Solidariedade.
Há meses, lobbies das empreiteiras levantaram a possibilidade de que as empresas envolvidas pleiteariam o reembolso daquilo que haviam pago pela corrupção provada em larga escala, com argumentos lógicos: todos têm de ser punidos igualmente, ou então, ninguém.
Por guinadas imprevisíveis do STF, os políticos que receberam propinas para atender interesses dos corruptores livraram-se de punições, ou, o que dá quase no mesmo, seus processos foram enviados em massa para o Tribunal Superior Eleitoral, que não têm condições mínimas de investigar e julgar em massa esses casos.
As principais empresas envolvidas no escândalo, Odebrecht, Andrade Gutierrez, OAS, Camargo Corrêa, Queiroz Galvão, Engevix concordaram em ressarcir R$ 8,1 bilhões em prestações durante um quarto de século. A J&F, holding da JBS, se comprometeu a pagar R$ 10 bilhões. Com a mudança dos ventos da Justiça, as companhias passaram a nutrir a esperança de se livrarem desse peso pecuniário.
O Supremo reviu seu entendimento em relação não só ao cabimento da prisão em segunda instância, como à jurisdição na qual o então ex-presidente Lula estava sendo julgado, após três anos para se chegar a uma conclusão trivial. A Lava-Jato chegou então a seu fim político, mas não jurídico.
É esse capítulo que, ironicamente, um grupo como o Psol, PCdoB e Solidariedade, da base governista, pretendem encerrar.
O sinal verde foi dado pelo ex-presidiário Lula, ao afirmar que o objetivo da Lava-Jato foi orquestrado em conjunto com os EUA para destruir as melhores empresas nacionais, as construtoras, que financiaram a roubalheira do PT e de vários partidos, e que trouxeram, nessa versão fantasiosa, consequências nefastas para a economia nacional.
O PT nunca assumiu que seus membros foram corrompidos, assim como Lula jamais explicou os mimos que recebeu das mesmas empreiteiras, rés confessas.
Psol e PCdoB instigam um processo que as próprias empreiteiras não tiveram desfaçatez para deslanchar. Mas seu alvo é certeiro. A ADPF visa suspender todas as penas pecuniárias estabelecidas pelos acordos de leniência e afastar “de uma vez por todas, a hermenêutica punitivista e inconstitucional do lavajatismo”.
É pedido ao STF, que validou os acordos de leniência e lhes deu legalidade plena, que reconheça que tais acordos “foram pactuados em situação de extrema anormalidade político-jurídico-institucional, mediante situação de coação e, portanto, sob um Estado de Coisas Inconstitucional”.
Como o próprio Lula argumentou, a vítima da punição da corrupção em larga escala foi a sociedade civil que “arcou, em última instância, com o efeito cascata da quebra generalizada de companhias estratégicas para a economia brasileira”.
Os partidos querem que a ação seja relatada pelo ministro Gilmar Mendes, que impediu que Lula assumisse cargo no governo Dilma e só passou a ser inimigo visceral da Lava-Jato quando descobriu que também estava sendo investigado por procuradores da operação.
De forma mais ampla, os partidos, entre eles o PT, patrocinam uma PEC com anistia de todas as irregularidades praticadas e que voltem a receber dinheiro de empresas “para quitar dívidas com fornecedores contraídas ou assumidas até agosto de 2015”, quando o financiamento empresarial foi proibido.
A iniciativa, somada à revisão que se tenta da lei das estatais, permite que se volte ao status quo ante do petrolão.
Se a ação for vitoriosa, e a tese da coação passar, abre-se o caminho ao inominável: as empresas terão base legal para arguir que têm direito a receber de volta o que pagaram por corromper políticos - talvez com juros e correção monetária.
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