Há pouco fui dar uma olhada em quantos artigos escrevi desde maio, ou seja, nos últimos seis meses, tratando do STF e de seu apêndice eleitoral, o TSE. Fiquei surpreso.
Foram 44 textos, com abordagens diversas, a atenção atraída para atos e condutas da cúpula do poder judiciário. Não se trata de um excesso de artigos, mas da evidência de um protagonismo exagerado, que vazou das bordas, se espalhou e penetrou pelas frestas do poder político e da vida social.
O fato de o consórcio da velha imprensa fazer de conta que nada via e estava tudo normal não significa que a sociedade não se informasse através das redes sociais, mesmo estando elas enclausuradas e controladas pelo orwelliano Grande Irmão.
Essa sociedade que hoje vejo nas ruas e praças pedindo socorro a quem a possa atender, cansou de clamar ao que restasse de sensibilidade e equilíbrio aos ministros do Supremo. Cansou de se indignar e apelar, em vão, aos senadores da República. Por fim, a sociedade rezou nas praças pedindo a Deus que comovesse os corações endurecidos, abrisse os olhos e os ouvidos dos que se têm como donos do poder. E foi perdendo a confiança nas instituições.
A lamentável democracia brasileira se tornou uma ridicularia, uma caçoada, sem que os senhores o percebessem. Durante quatro anos, com o país dividido, enquanto num lado milhões saíam periodicamente às ruas clamando por liberdade e atenção, o outro se mostrava perfeitamente suprido. Pensam que ninguém reparou na plena satisfação de quem bastava entregar petições ao protocolo e olhava para as instituições como um confortável sofá onde só precisava sentar?
Digam, agora, aos caminhoneiros parados e às famílias pedindo socorro que tudo esteve equilibrado e isonômico, que o Brasil é uma democracia, que a liberdade de todos está assegurada e a soberania popular garantida, que o resultado proclamado nos colocou em boas mãos e as loucuras prometidas por Lula não serão cumpridas.
Digam aos manifestantes que as consciências se regeneraram quando o passado foi apagado. Aquele povo nas ruas, sim, é inocente! Digam-lhe que as instituições funcionarão, que a época dos bloqueios e desmonetizações passou, que o cala boca já morreu e a censura está proibida, que a Constituição voltará a viger, que o ativismo judicial já era, que o direito de propriedade continuará garantido, que a intimidade da vida privada estará preservada e que o Brasil não voltará a ser roubado.
Não será possível fazer isso, não é mesmo? Foi o que pensei. Mas é o mínimo que uma sociedade sensata pode esperar das ações do aparelho estatal que ela sustenta para seu serviço.
Percival Puggina
Membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.