“Brasil vive práticas semelhantes às da Inquisição e de países ditatoriais”, afirma corajoso jurista
20/10/2022 às 06:15 Ler na área do assinanteA Constituição Federal tem sofrido sucessivas violações, especialmente no que tange a liberdade de expressão de jornalistas, parlamentares e cidadãos de bem. Nestas eleições, por exemplo, nota-se a censura contra veículos de comunicação que produzem conteúdos reais, com críticas a candidatos ou mesmo a cidadãos que querem exprimir sua opinião, em total desrespeito à cidadania e aos limites constitucionais. Para o jurista Jackson Di Domenico, que foi desembargador eleitoral do Tribunal Regional Eleitoral do Distrito Federal, o Brasil tem vivido práticas semelhantes às da época da Inquisição e de países ditatoriais.
“Na época da Inquisição, um tribunal investigava, acusava, julgava e punia as pessoas consideradas por eles como ‘hereges’. A punição variava desde ser preso sem comida por alguns dias até a tortura ou morte na fogueira. Séculos depois, temos presenciado práticas semelhantes com a abertura de inquéritos disfarçados de ‘combate à desinformação ou atos antidemocráticos’, por quem se considera vítima, acusa e julga ao mesmo tempo, sem oportunizar elementos essenciais, como o contraditório ou a defesa jurídica”, afirma o jurista.
A Constituição Federal veda a censura ou limitação à liberdade de pensamento e de crença. Este, inclusive, era o entendimento adotado reiteradamente pelo Supremo Tribunal Federal, a exemplo do julgado na ADI 2566, de Relatoria do Ministro Alexandre de Moraes:
"[...] A liberdade política pressupõe a livre manifestação do pensamento e a formulação de discurso persuasivo e o uso dos argumentos críticos. Consenso e debate público informado pressupõem a livre troca de ideias e não apenas a divulgação de informações. 5. O artigo 220 da Constituição Federal expressamente consagra a liberdade de expressão sob qualquer forma, processo ou veículo, hipótese que inclui o serviço de radiodifusão comunitária. [...]"
No entanto, hoje, diz Domenico, algumas decisões judiciais são frágeis por violarem a lei maior e os princípios básicos do direito, como as liberdades individuais.
“Nem na época do Império Romano era permitido um cidadão romano receber chicotadas sem o devido processo legal”, lembra o especialista, que também é doutor e mestre em direito constitucional, pós-graduado em direito eleitoral e autor de livros jurídicos.
Na semana passada, por exemplo, uma decisão determinou que a produtora Brasil Paralelo retire do ar vídeo que vincula um candidato à presidência da República a esquemas de corrupção em seu governo. O vídeo, produzido há cinco anos, foi montado com reportagens e fatos de ampla circulação nacional na grande mídia em 2004, 2005 e 2006.
“Se o fato foi objeto de condenação, examinado por todas as instâncias da justiça do Brasil, por que não pode ser divulgado para os cidadãos formarem suas convicções? Cabe lembrar que a despenalização do candidato que estava preso, ocorreu por uma formalidade de localização geográfica, contudo os fatos, até o presente momento, não foram refutados”, esclarece Domenico.
Para ele, diversas decisões têm extrapolado as competências do Estado Democrático de Direito, violando gravemente a Constituição Federal ao censurar conteúdos reais, ferindo não apenas a liberdade de expressão, mas também o princípio da impessoalidade, consagrado no art. 37, caput, da CF e caríssimo ao exercício da cidadania, quando, se fosse o caso, caberia, no máximo, o direito de resposta a quem se sentiu prejudicado, sem afastar a possibilidade de eventual reparação civil posterior.
“Temos percebido reiteradas interferências partidárias no poder judiciário, principalmente no processo eleitoral deste ano, provocando, por vezes, total insegurança jurídica, uma vez que as decisões se manifestam contrárias à Constituição e a jurisprudência. Além do que as decisões parciais que beneficiam um candidato ou partido, ficam ao arrepio da imparcialidade, atributo que deve ser indispensável a afirmação do Estado Democrático de Direito em um país civilizado”, finaliza o jurista, que também é presidente do Instituto Justiça, Paz e Felicidade.
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