A celebração da independência: A fundação de uma nova nação

Ler na área do assinante

“Não perca mais tempo discutindo sobre o que um bom homem deve ser. Seja um”. (Marco Aurélio – o Imperador- Filósofo).

O Brasil, segundo o IBGE, tem 5.568 municípios, um Distrito Federal e o Distrito Estadual de Fernando de Noronha. Neles habitam, segundo estimativa do mesmo IBGE, 215 milhões de pessoas vivendo em uma extensão territorial de 8,51 milhões de km². É o quinto maior país do mundo.

E a maioria absoluta desses viventes se vestiram de verde-amarelo para comemorar os 200 anos de Independência do Brasil. De norte a sul, de leste a oeste, do Oiapoque ao Chuí, os brasileiros de todas as cores, raças, religiões, ideologias, saíram às ruas para mostrar que, finalmente, temos no peito um sentimento de nação!

Do menor ao maior rincão, com chuva, com sol, todos radiantes saíram às ruas para gritar:

- Sim, somos uma nação!

“Enfeitar-se para uma festa e ir assim bem bonito para uma festa, como só é possível a seres humanos mortais, que através desse gesto assemelham-se aos deuses, isso é um traço fundamental da essência da festa, criado para a arte; é um parentesco originário do elemento festivo com o belo”. (Karl Kerenyi).

Lindos, enfeitados com as cores do país, famílias inteiras foram a festa. Saíram de suas casas para celebrar a data em que nos tornamos independentes.

Eu disse celebrar. Byung-Chul Han, no texto “Tempo de celebração- a festa numa época sem celebração", usa as palavras de Karl Kerenyi, para explicar o que é e o que não é a celebração de uma festa:

“Um esforço puramente humano, o cumprimento usual de um dever não é propriamente uma festa, e a partir do não festivo não se pode celebrar nem sequer compreender uma festa. Deve intervir algo divino para que o que antes parecia impossível se torne possível. Se é elevado a um patamar (na festa) onde tudo é “como no primeiro dia”, iluminado, novo e “como pela primeira vez”; onde estamos na companhia dos deuses, onde nos tornamos inclusive divinos, onde sopra o hálito da criação e se participa do ato da criação”.

Essa é a essência da festa.

Notem que festa está ligada a celebração: “uma celebração festiva é desprovida de tempo, é onde demoramos”. Nela existe o belo. E nas coisas belas o tempo não passa. É arte. E o tempo da arte é a eternidade.

Explica o filósofo e ensaísta coreano Byung-Chul Han, em seu livro “Sociedade do cansaço”:

“A festa é o evento, o lugar onde estamos junto com os deuses, onde inclusive nós próprios nos tornamos divinos. Os deuses se alegram quando os seres humanos jogam e brincam; os seres humanos jogam e brincam para os deuses. Se vivemos numa época sem festa, se vivemos numa época desprovida de celebrações, já não temos mais qualquer relação com o divino”.

E assim, com festa e celebração, diferente dos vermelhos, dos jornalistas vendidos, do cínico Pacheco, do presidente da câmara, dos ministros do Supremo que se acham donos da nação, reitero minha fé no país e afirmo:

Nestes duzentos anos de Independência um mar verde-amarelo, feito de gente brasileira, encheu a Terra de Santa Cruz.

Um mar que brilhou aos raios do mesmo Sol que iluminou as praias onde pisaram os primeiros portugueses conquistadores.

Um mar calmo de gente, sem ondas impetuosas, sem nenhuma violência, sereno, deslizando pelas ruas da nação, levando em seu dorso o coração de toda gente exposto em suas mãos.

E para onde vão esses corações afoitos, levados com todo cuidado entre as mãos dos que caminham, que antes batiam fortes nos peitos e agora saíram de suas moradas e bradam que não respeitam injustiças nem desaforos?

Onde vão livres, gritando que tem uma identidade, que agora são uma nação, valorizam suas raízes, sua história e são soberanos?

Caminham juntos, milhões de mãos levando seus corações para a mesma terra, para um mesmo objetivo, para uma imensa celebração numa espécie de projeto artístico.

Não um, mas os milhões de corações se misturaram e com eles seu sangue: brancos, negros, índios, imigrantes, todos rumo a grande festa da Independência, todos dançando como irmãos, acenando, agitando bandeiras, filhos da mesma terra que um dia foi selvagem.

E narraram juntos, neste 7 de setembro, ao mundo inteiro, a fundação de uma nova nação.

Foto de Carlos Sampaio

Carlos Sampaio

Professor. Pós-graduação em “Língua Portuguesa com Ênfase em Produção Textual”. Universidade Federal do Amazonas (UFAM)

Ler comentários e comentar