A Democracia de Mentira e Os Escaladores do Poder em um Lance de Roleta Viciada
08/05/2022 às 09:01 Ler na área do assinante“Oh! Que formosa aparência tem a falsidade”! (William Shakespeare – O Mercador de Veneza, ato I - cena 3).
Luiz Fux, o presidente do STF, no lançamento da mostra “Liberdade & Imprensa: o papel do jornalismo na democracia brasileira”, realizada na Corte, afirmou:
“Num país onde a imprensa não é livre, um país onde a imprensa é intimidada, um país onde a imprensa é amordaçada, no país onde a imprensa é regulada sendo a imprensa um dos pilares da democracia, nesse país com tantas restrições à liberdade de imprensa, a democracia é uma mentira, e a Constituição é uma mera folha de papel”.
Sim, vocês acreditam que ele disse isto? Pois disse, com todas as letras. Ele afirmou, repito: “Onde a imprensa não é livre, a democracia é uma mentira”.
Estaria Luiz Fux cego ou Luiz Fux vive em outro mundo? Vejamos:
“Ministro do STF censura sites e manda tirar do ar reportagem sobre Toffoli: Alexandre de Moraes determinou que Crusoé e O Antagonista excluam texto que liga presidente da corte a Odebrecht. A multa por descumprimento é de R$ 100 mil por dia. Moraes também determinou que os responsáveis pelos sites prestem depoimento em até 72 horas”. (Folha de S.Paulo).
Luiz Fux é o presidente do STF e um de seus comandados estava sendo denunciado pela imprensa e o Brasil é uma democracia e disse Luiz Fux:
“Num país onde a imprensa não é livre, um país onde a imprensa é intimidada...a democracia é uma mentira”.
Então nossa democracia é uma mentira, um engano, uma falsidade, uma fraude, um embuste, um impostura, um enredo, uma farsa, pois a imprensa foi intimidada.
Luiz Fux não sabe desse fato? Não sabe que:
“Alexandre de Moraes determina que Anatel retire do ar site de Allan dos Santos: Na mesma decisão, Moraes também requisitou a remoção de todas as contas de Allan dos Santos nas redes sociais, o bloqueio de suas contas bancárias e da empresa de mídia Terça Livre, o que levou ao encerramento da plataforma e demissões de toda a equipe. (Gazeta do Povo).
Mas Luiz Fux afirmou:
“Num país onde a imprensa não é livre, um país onde a imprensa é intimidada...a democracia é uma mentira”.
Então nossa democracia é trapaça, lorota, balela, peta, burla, lenda, história, logro, invencionice, invenção, inverdade, novela, patranha, calúnia, pulha, pala, mendacidade, pois a imprensa foi amordaçada.
Luiz Fux não sabe desse fato? Não sabe que:
“O ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes, determinou na quinta-feira (17/3/022) que a atividade do aplicativo Telegram seja interrompida no Brasil por provedores de internet e outras plataformas. A decisão, divulgada na sexta (18/3/2022), atende a uma solicitação feita pela Polícia Federal.
O não cumprimento da decisão acarretará ao infrator multa diária de R$ 100 mil. É especificado que Google e Apple devem retirar o Telegram de suas lojas digitais onde o aplicativo é baixado”. (BBC - Brasil).
Mas Luiz Fux afirmou:
“Num país onde a imprensa não é livre... um país onde a imprensa é regulada sendo a imprensa um dos pilares da democracia, nesse país com tantas restrições à liberdade de imprensa, a democracia é uma mentira, e a Constituição é uma mera folha de papel”.
Então nossa democracia é encravação, moca, pomada, pretexto, carapetão, patacoada, patarata, intrujice, endrômina, caraminhola, embromação, pataratice, potoca, lampana ou é uma fábula, ficção, fantasia, engodo, quimera, ilusão, pois foi regulada.
Luiz Fux vive em uma bolha? Luiz Fux não vê o que está acontecendo com a liberdade de imprensa? Ninguém foi preso? Ninguém foi retirado do ar? Ninguém foi proibido? Ninguém foi multado? Ninguém foi intimidado?
Parece que os Ministros do Supremo imaginam que todos nós somos uns imbecis, uns babacas, um bando de otários. Sim, estamos amargurados ao ver tanta boçalidade e cinismo. Mesmo desalentado, invoco o espírito de Rui Barbosa e digo a Fux e aos seus 8 parceiros que se apossaram do Brasil sem autorização dos brasileiros:
“O BRASIL NÃO É ISSO
Mas, senhores, se é isso o que eles veem, será isto, realmente, o que nós somos? Não seria o povo brasileiro mais do que esse espécimen do caboclo mal desasnado, que não se sabe ter de pé, nem mesmo se senta, conjunto de todos os estigmas de calaçaria e da estupidez, cujo voto se compre com um rolete de fumo, uma andaina de sarjão e uma vez d’aguardente?
Não valerá realmente mais o povo brasileiro do que os conventilhos de advogados administrativos, as quadrilhas de corretores políticos e vendilhões parlamentares, por cujas mãos corre, barateada, a representação da sua soberania?
Deverão, com efeito, as outras nações, a cujo grande conselho comparecemos, medir o nosso valor pelo dessa troça de escaladores do poder, que o julgam ter conquistado, com a submissão de todos, porque, em um lance de roleta viciada, empalmaram a sorte e varreram a mesa?
Não. Não se engane o estrangeiro. Não nos enganemos nós mesmos. Não! O Brasil não é isso. Não! O Brasil não é o sócio de clube, de jogo e de pândega dos vivedores, que se apoderaram da sua fortuna, e o querem tratar como a libertinagem trata as companheiras momentâneas da sua luxúria.
Não! O Brasil não é esse ajuntamento coletício de criaturas taradas, sobre que possa correr, sem a menor impressão, o sopro das aspirações, que nesta hora agitam a humanidade toda.
Não! O Brasil não é essa nacionalidade fria, deliqüescente, cadaverizada, que receba na testa, sem estremecer, o carimbo de uma camarilha, como a messalina recebe no braço a tatuagem do amante, ou o calceta, no dorso, a flor-de-lis do verdugo.
Não! O Brasil não aceita a cova, que lhe estão cavando os cavadores do Tesouro, a cova onde o acabariam de roer até aos ossos os tatus-canastras da politicalha. Nada, nada disso é o Brasil.
O QUE É O BRASIL
O Brasil não é isso. É isto. O Brasil, senhores, sois vós. O Brasil é esta assembleia. O Brasil é este comício imenso de almas livres. Não são os comensais do erário. Não são as ratazanas do Tesouro. Não são os mercadores do Parlamento. Não são as sanguessugas da riqueza pública. Não são os falsificadores de eleições. Não são os compradores de jornais. Não são os corruptores do sistema republicano. Não são os oligarcas estaduais. Não são os ministros de tarraxa. Não são os presidentes de palha. Não são os publicistas de aluguel. Não são os estadistas de impostura. Não são os diplomatas de marca estrangeira.
São as células ativas da vida nacional. É a multidão que não adula, não teme, não corre, não recua, não deserta, não se vende. Não é a massa inconsciente, que oscila da servidão à desordem, mas a coesão orgânica das unidades pensantes, o oceano das consciências, a mole das vagas humanas, onde a Providência acumula reservas inesgotáveis de calor, de força e de luz para a renovação das nossas energias.
É o povo, em um desses movimentos seus, em que se descobre toda a sua majestade.”
(“A questão social e política no Brasil. Discurso proferido por Rui em 20 de março de 1919 no Teatro Lírico do Rio de Janeiro”. In: Pensamento e ação de Rui Barbosa, Coleção Biblioteca Básica Brasileira, 1999, p. 370-371.).
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Carlos Sampaio
Professor. Pós-graduação em “Língua Portuguesa com Ênfase em Produção Textual”. Universidade Federal do Amazonas (UFAM)