O presidente Bolsonaro não cometeu nenhum ilícito ao levar seu filho na comitiva à Rússia
16/03/2022 às 08:16 Ler na área do assinanteUm senador peticionou ao Supremo Tribunal Federal questionando e colocando-se contra a presença do vereador carioca Carlos Bolsonaro na comitiva presidencial em recente viagem à Rússia.
Desconheço o que o senador pede ao STF. Sem sorteio e sem aparente conexão com processo anterior em curso, o caso também foi parar nas mãos do ministro Alexandre de Moraes.
O ministro não indeferiu de plano a petição do senador, como era de se esperar. Ao contrário, a acatou, deu-lhe seguimento e pediu explicações ao presidente. Crê-se que o ministro assim agiu por tolerância. Ou por devotamento ao debate. Afinal, a causa é inédita. Não há precedente. Nem precedente nem razão alguma para justificar tamanha aventura judicial. Por isso o indeferimento "ab initio" (liminar) era mais do que justo.
Quando o presidente da República decide fazer uma viagem ao Exterior, indo a um ou mais países, a decisão presidencial não é inominada. Ela tem nome para o Direito. Chama-se Ato Administrativo. E os Atos Administrativos, ou são vinculados ou são discricionários.
Vamos ao consagrado administrativista Hely Lopes Meirelles para entender o que seja um e o que seja outro:
"Atos vinculados ou regrados são aqueles para os quais a lei estabelece os requisitos e condições de sua realização".
"Atos discricionários são os que a Administração pode praticar com liberdade de escolha de seu conteúdo, de seu destinatário, de sua conveniência, de sua oportunidade e do modo de sua realização"
Não existe nenhuma lei, nenhum decreto, nenhum ato normativo - e para ir logo aos mais hierarquicamente frágeis no processo legislativo - não existem nem mesmo resolução e portaria dispondo sobre os direitos, deveres e obrigações que recaem sobre o presidente da República - repita-se, sobre o presidente da República - no tocante às suas viagens internacionais.
Nada existe dispondo quem o presidente pode ou não pode levar em sua comitiva; qual o itinerário da viagem; quanto tempo pode passar fora do país; onde pode ou não pode ir... Nada. Rigorosamente nada. Portanto, a decisão do presidente Jair Bolsonaro de visitar, aqui no caso a Rússia, foi, é e sempre continuará sendo um Ato Administrativo Discricionário.
E somente e exclusivamente ao presidente é a quem compete decidir sobre a conveniência e oportunidade - as duas pilastras que sustentam o Ato Administrativo Discricionário -, seja a respeito da viagem, seja a respeito daqueles que chama para integrar sua comitiva.
É decisão personalíssima. É decisão que os Romanos chamavam de "Intuitu Personae" (só à pessoa pertence). E como é de trivial sabença, quando o Ato Administrativo é discricionário, não cabe ao Judiciário se imiscuir a respeito dele. O Ato Administrativo Discricionário está fora do controle jurisdicional.
Portanto, só o presidente Bolsonaro sabe o(s) motivo(s), a(s) razão(ões) que o levaram a chamar seu filho, Carlos Bolsonaro, para integrar sua comitiva na viagem à Rússia. E o presidente não está obrigado a externar, a dizer, a tornar pública a razão ou as razões deste seu gesto ou ato. Nem mesmo à Justiça. E nem pode a Justiça obrigar o presidente a revelar a motivação do seu ato.
Por que levou?. Levei porque no meu poder discricionário era oportuno e conveniente, pode responder o presidente a quem lhe indagar. Da mesma forma que aos magistrados é dado o direito de recusar a condução de um processo sob a alegação de "foro íntimo" sem a necessidade de dizer o motivo, também o presidente da República tem o Direito de incluir na comitiva presidencial nas viagens internacionais quem o presidente achar ser conveniente e oportuno. Isto porque, ante à ausência de legislação específica a respeito, o Ato Administrativo é discricionário.
Noticia-se que Bolsonaro já enviou ao ministro Moraes a resposta que lhe foi pedida. Mas ainda há tempo de o presidente, através da Advocacia Geral da União, complementar a resposta já entregue, fazendo-lhe um aditamento para acrescentar a exposição jurídica que contém este artigo, que de mim parte unicamente pelo devotamento à Ciência do Direito, à prevalência do que é legal e justo. Tão só.
Jorge Béja
Advogado no Rio de Janeiro e especialista em Responsabilidade Civil, Pública e Privada (UFRJ e Universidade de Paris, Sorbonne). Membro Efetivo do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB)