Ela sempre adorou os livros, o conhecimento, a transcendência. Porém só se deu conta que a vida era um tanto mais densa à medida que os anos se passavam.
Reinventou-se tantas e tantas vezes, por ter se perdido ao longo do caminho, mas hoje acredita que foi a melhor maneira para se reencontrar e se reconhecer, um pouco mais que ontem, menos que amanhã.
Idealizava pessoas, situações, sentimentos.... Percebeu, com grande sofrimento, que nada disso era real. A dor, mais uma vez, se impondo para mostrar a dimensão de tudo. Relativizar o mundo à sua volta entendendo que o mundo está dentro de si mesma.
Inúmeras fases de descobertas, quatro décadas sendo pouco para se auto definir. Cada dia uma nova percepção de si, do outro, do seu espaço e suas relações com o exterior. Nove décadas – se muito – para sair daqui com a alma leve e plena. Ainda há tanto que percorrer.
Decepções, angústias, traições. Alegria, plenitude, entendimento, serenidade. Mesclas constantes e que de alguma maneira, precisam ser elaboradas para o crescimento. Houve muita dor, por muita doação que se fez. A recíproca quase nunca é verdadeira. E para ela, é um dos grandes legados da maturidade.
No meio de tanta tempestade, fachos de luz apontam a direção a seguir. Mãos seguras e corações repletos de afetividade genuína, presenteiam o agora, mostrando que há sim – experiências lindas e únicas para se viver. O Universo à disposição!
Ela que idolatrou anjos de barro, acreditou em discursos inflamados, em egos exacerbados, caiu. Despencou de alturas inimagináveis. E grandes lágrimas saltaram de seus olhos azuis acostumados a enxergar o mundo tão cor de rosa.
Do peito oprimido, saíam apelos por entendimento, por explicações. Qual o motivo de tudo ser o que é? O entendimento do mundo dentro de si, por vezes, não faz sentido, aprendiz que é dessa dimensão singular que se descortina à sua frente.
Ela ainda sente dor e sentirá, infalivelmente. Humana e sensível como só ela pode ser. Tirando lições diárias de todos os acontecimentos, aprendizados para galgar mais um degrau. Nada que apague seu brilho, que diminua seu êxtase perante a vida. Olhando para eras passadas, percebe que está trilhando o caminho certo.
Almas afins que se reencontraram, são hoje, grandes esteios na caminhada. Ela não está sozinha, nunca esteve. O abismo foi necessário, como é necessária toda gama de experiência, para a compreensão do que foi, do que é e do que será.
Os dias são de batalha e enfrentamento interno, principalmente. E ela aprendendo a burilar suas estranhezas, ordenar seus pensamentos, priorizar e direcionar suas atitudes e sentimentos.
O fim disso tudo? A certeza de ter feito o seu melhor, dentro de todo o entendimento possível, faz com que ela tenha a tranquilidade e plenitude no porvir. Recebendo ao final da jornada, sua grande medalha: um espelho onde se reconheça, integralmente.
Júbilo e gratidão presentes no sorriso revelado e retribuído no reflexo por quem se fez presente, do início ao fim, inevitável e absoluta: Ela mesma, através da sua essência divina. Senhora de si, sábia e triunfante, certa de que sempre combateu o Bom combate.
Seu legado nunca foi para ninguém além dela mesma. E isso por si só, já lhe bastava!
Luciana Brandalize
Luciana Brandalize
Articulista e redatora que transforma sentimentos em palavras.