Jurista renomado afirma que Lula, mesmo após decisão do STF, continua condenado e inelegível. Saiba o motivo
16/04/2021 às 17:37 Ler na área do assinanteSim, é verdade. Pode até ser tema de debate. Debate polêmico. Pode até ser surpreendente. Mas é jurídico. E exclusivo.
Mesmo depois da sessão desta quarta-feira (15) em que o plenário do STF, por 8 a 3, decidiu pela incompetência territorial do Juízo da 13ª Vara Criminal Federal de Curitiba para julgar os processos contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o ex-presidente continua e permanece condenado e inelegível. É isso mesmo que o leitor do Jornal da Cidade Online leu: permanece condenado e inelegível.
A explicação está na lei. O plenário do STF, por maioria, confirmou a liminar do ministro Edson Fachin que reconheceu a 13º Vara Federal de Curitiba incompetente para julgar os processos contra o ex-presidente. O plenário do STF apenas declarou a incompetência territorial. Ou seja, que aquele juízo federal não poderia processar e julgar Lula. E incompetência territorial é incompetência relativa. Não, incompetência absoluta. Mas o plenário do STF não decretou a nulidade das decisões do juízo que a maioria dos ministros apontou como juízo incompetente. Quem acompanhou a sessão pela TV Justiça não ouviu de nenhum dos 8 ministros que, além da incompetência, as decisões de Curitiba também restavam anuladas.
Sendo assim, há necessidade de ir ao Código de Processo Civil (CPC). Mas a questão não é penal?. Então, por que recorrer ao CPC?. Porque - é a resposta - o Código de Processo Penal, que é de 1941, admite interpretação extensiva e aplicação analógica e algo mais. Confira-se o artigo 3º:
"A lei processual penal admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais de direito".
Daí porque busca-se no Código de Processo Civil, que é de 2015, o fundamento jurídico que indica que Lula - mesmo após a incompetência territorial da 13ª Vara Federal de Curitiba ter sido declarada pelo STF -, continua condenado e inelegível.
O artigo 64, parágrafos 3º e 4º do CPC é bastante claro ao dispor que, quando a alegação de incompetência é acolhida (e assim aconteceu no STF), os autos são remetidos para o juízo competente (nessa parte o STF ainda não disse qual é o juízo competente). E quando a declaração de incompetência não vier casada também com a declaração de nulidade (anulação) das decisões proferidas pelo juízo incompetente (e o STF não fez este casamento), as decisões do juízo tido por incompetente prevalecem, até que o juízo competente dê outra decisão. Fácil, não é mesmo?
Vamos conferir a letra da lei, no caso o artigo 64, parágrafos 3º e 4º do Código de Processo Civil.
"Artigo 64 - A incompetência, absoluta ou relativa, será alegada como questão preliminar de contestação.
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Parágrafo 3º - Caso a alegação de incompetência seja acolhida, os autos serão remetidos ao juízo competente.
Parágrafo 4º - Salvo decisão judicial em sentido contrário, conservar-se-ão os efeitos de decisão proferida pelo juízo incompetente até que outra seja proferida, se for o caso, pelo juízo competente".
Em suma:
1) a incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba foi acolhida, mas os autos não foram remetidos pelo STF ao juízo competente, porque os ministros ainda não decidiram quem será o juízo competente;
2) os efeitos das decisões condenatórias impostas a Lula pelo juízo da Curitiba estão preservadas porque o STF não as anulou (apenas decidiu sobre competência) e porque, também, o juízo para onde os processos serão remetidos nem foi ainda indicado, o que impede que "outra (decisão) seja proferida...pelo juízo competente".
Dizem que o Direito é uma Ciência, possivelmente porque se estriba em outras Ciências. Mas que em Direito, principalmente no Direito Brasileiro, tem resposta e saída para tudo, isto tem. Basta estudar, ter experiência, perspicácia e visão global desta dita Ciência.
Jorge Béja
Advogado no Rio de Janeiro e especialista em Responsabilidade Civil, Pública e Privada (UFRJ e Universidade de Paris, Sorbonne). Membro Efetivo do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB)