Supremo pesadelo*

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Ora, bolas! Três da manhã e tem gente me ligando? Será o Benedito? Pra quê inventaram o telefone, caramba...

- Alô!

- Te acordei?

- José? Que... Assim, não dá! Qual é o problema, Zé?

- Cara, tive um pesadelo.

- Pôxa! Que foi?

- É que eu estou preocupado com essa bagaça dos militares.

- Ainda, nessa, Zé!? Isso já foi aprovado. Relaxa, fica calmo. Eu não te falei que a milicada vai passar tanto tempo lustrando as botas, que vão poder comer em cima?

- Eu não tô calmo, nada, porra! Não sei como vocês conseguem! Você sabe que eu me sinto muito mais a vontade numa mata do que enfiado nessa merda de terno-e-gravata, né?

- Eu sei, mas olhe, você está encucado a toa. Eu já não expliquei que só o Presidente é que pode chamar o Exército? Com o cala-boca que demos neles, acabou! O que tá pegando?

- Caralho! Você tem certeza de que esta é uma boa ideia? Não seria melhor se os outros presidentes das Casas, pudessem fazer a mesma coisa? Quer dizer, vamos colocar tudo nas mãos de um cara só?

- Vou repetir: não dá por que eles não são eleitos diretamente para os cargos. Comparando, é claro que para se eleger, o Presidente recebeu muito mais votos do que o Deputado ou o Senador, né? Então, ele é o cara representativo na democracia. Disso, não há dúvida.

- E se começar uma confusão?

- Que confusão? Não existe mais Direita, no Brasil, Zé! Você não percebe? Colocamos todos eles no bolso. Logicamente, só vamos colocar gente nossa na presidência, né? Fala de uma vez, o que está te perturbando?

- É que, além dessa questão de que só o Presidente ter o comando dos militares, estamos colocando tudo nas mãos do Judiciário, né? Quer dizer, eles podem interferir, pra valer, se quiserem, né? Jogar a merda no ventilador.

- Acho que você ficou muito tempo na selva, Zé! Presta atenção: desde a época da ditadura militar, estamos trabalhando nas universidades, nas escolas, fazendo a cabeça da moçada. Eu sei por que eu dei aula, né? Então. Vão sair todos de cabeça-feita, por gerações. Está até circulando um termo, é... ativismo judicial.

- E eles vão poder MANDAR em nós, caralho?

- Calma, eu chego lá. E isto nos interessa! Principalmente, quando finalizarmos a Constituição. Parece que o Ulysses está até querendo emplacar um nome, sabe? Pra dar charme... Outro dia, ouvi alguém dizer... Ah! “Constituição cidadã” - ou algo assim, não tenho certeza.

- É aí que está! Eu tive, hoje, HOJE! - um pesadelo horrível, porra!

- Lá vem você, de novo!

- É!.. No meu sonho, esses caras, juízes e tal - ministros, né? Eles começavam a dar ordens. Criavam leis! LEIS! Por qualquer motivo que fosse! Coisas que não existiam, eles criavam! Do nada! Sabe?

- Hum.

- Até que, no sonho, um deles mandou o Presidente DEPOR pessoalmente e outro deslocou o Exército. Imagine, caralho! O PRESIDENTE! Aí meu coração disparou e eu pulei da cama. Acordei suando frio... Por isso que eu te pergunto: será que estamos no caminho certo?

- Zé, assim não dá! Assim, não dá! Eu já te falei... Veja, não podemos colocar uma questão dessa maneira, de um modo tão simplista.

-Sei.

- Isso nunca vai acontecer. Vou repetir, NUN-CA! A ideia é aquela alternância no poder entre as esquerdas, sabe? Esta é a questão. Eu até estou trabalhando nisso. A Direita é só sombra. Folclore, pra gente assustar criancinhas. “FAXISMO!” Hahaha!

- Tá.

- Tirando o Toninho-malvadeza, que me dá arrepios, um ou outro cara ...o Maluf! Sei lá... não temos adversários e NUNCA MAIS teremos. Além do que, serão OS NOSSOS PRESIDENTES, gente de esquerda - DE ESQUERDA, que indicarão os ministros. Então, por quê você se preocupa?

- É... pensando assim...

- Veja bem. ENQUANTO TIVERMOS PRESIDENTES DE ESQUERDA, isso nunca vai acontecer.

- Putz! Valeu, cara! Acho que você me convenceu. Vou voltar a dormir. Escuta, quando teremos a próxima plenária?

- Deixa eu ver... Só semana que vem.

- Ah! Valeu.

- Boa noite, Zé!

- Boa noite, Henrique!

Humm! Francamente. Gente desmiolada. Acho que vou deixar essa geringonça fora do gancho...

*Esta é uma obra de ficção, qualquer semelhança com nomes, pessoas, fatos ou situações da vida real terá sido mera coincidência.

Angelo Lorenzo

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