O estado como inimigo da liberdade: Ensinamentos da trilogia “Divergente” de Veronica Roth
12/08/2020 às 11:06 Ler na área do assinante"Quem não consegue interpretar uma obra de literatura corretamente não conseguirá jamais entender os fatos da história e da sociedade, ou mesmo os da sua própria vida. A cultura literária é a condição mais básica do entendimento." (Olavo de Carvalho, filósofo)
Um erro que invadiu a mente de diversas linhas de direita, e que parece ter fincado muito fortemente suas raízes, é a falta de interesse pela literatura, cinema e as demais artes. Debate-se sobre politica, história e filosofia, não digo que não sejam importantes, o são e muito, contudo, deixam o ouvinte com uma certeza: somos chatos, donos de muito conhecimento e pouco encanto.
Pensamos nos adultos e esquecemos as crianças, falamos de clássicos com profundidade, mas falhamos em projetar nossa opinião sobre toda sorte de leituras e entretenimento que alimentam as mentes jovens, muitas vezes com desinformação, ideologia de gênero, marxismo e afins.
A esquerda é divertida, atrativa e sedutora e se queremos ser as primeiras fontes de consulta para nossos filhos, amigos e vizinhos, devemos nos converter em parceiros de aventuras.
Não adianta falar de Chesterton para um garoto fã de Tokusatsu, anime e mangá. Umbrella academy, Dark, Flash , Stargirl, dominam a mente de seu filho por muitas horas durante a semana, e, acredite, você não vai querer que seu garoto embarque nessa trilha sem o desejo de falar do que viu e gostou com você. O papel de educar é primordialmente da família e não do estado.
Então decidi mostrar através de filmes, séries e livros, como o bom e sábio conservador, perdido como cego em tiroteio, pode estabelecer uma boa rotina com os filhos e alunos; cheia de ensinamentos eternos e valores atemporais. Primeiro, falemos do que eles gostam, depois mostremos todo um universo mais rico e não menos divertido.
Veronica Roth é a autora de uma trilogia de livros que impactou o mundo, sendo celebrado por muitos críticos. Os livros são comparáveis, refiro-me ao atrativo junto ao público, às obras The Hunger Games (jogos vorazes) da autora Suzanne Collins, e The Maze Runner do autor James Dashne.
Divergente, insurgente e Convergente compõem a trilogia e em 2014 foi lançado um novo livro que narra alguns eventos retratados na trilogia original na perspectiva do personagem Four (Tobias).
A autora nos apresenta um mundo distópico onde o que restou da humanidade se refugia em uma Chicago futurista. Para continuar sua busca por desenvolvimento e sobrevivência, a nova sociedade é dividida em cinco facções dedicadas ao cultivo de uma virtude especifica: Abnegação (Altruísmo), Amizade (Cordialidade), Audácia (Coragem), Franqueza (honestidade) e Erudição (Inteligência). Em um dia determinado de cada ano, todos os jovens de dezesseis anos devem selecionar a facção à qual vão dedicar o resto de suas vidas.
A sociedade é funcional e até mesmo transmite a ideia de ser desejável. Não há guerras, fome, dor, doenças e cada indivíduo é testado para encontrar seu lugar dentro deste mundo. Uma escolha determinada pelo estado através da ciência, onde ousar escolher algo diferente pode significar o fim de sua existência. Em prol de extinguir toda sorte de problemas, o livre-arbítrio foi aniquilado.
Beatrice Prior é uma jovem que instintivamente percebe que ela não se encaixa na facção dos seus pais, Abnegação, onde tudo que é belo, tecnológico, diferente e individual é renegado para se viver uma vida dedicada a servir os outros, não surpreendentemente estes ocupam a liderança politica da cidade, pois são tidos como incorruptíveis.
O primeiro livro constrói bem as personagens e tem uma escrita fluida tanto na tradução ao português como no original em inglês. Percebemos pela reflexão da jovem Beatrice como o medo de não pertencer a sua facção de nascimento, abandonando seus pais, é algo forte, porém não tanto como a expectativa de viver uma vida que de fato possa chamar de sua.
Ao se submeter ao teste ela se mostra uma divergente, alguém que possui características de mais de uma facção, tornando-a inadequada para viver na sociedade e que, conseqüentemente, deve ser eliminada. Claro, que isso não será o fim para ela, mas o começo de uma jornada que mostrará quão perverso e doentio é o mundo onde vive.
Uma lição espetacular que a obra traz é que nada vale o preço da perda da liberdade. Sem liberdade não há humanidade. Apagar as diferenças em prol de um mundo sem pobreza é, na verdade, violentar cada indivíduo, tornando-o menos humano e mais uma peça da máquina estatal.
O novo normal apregoado pela mídia, o ativismo judicial em guerra contra o poder executivo, a “criminalização” do direito de defesa, o ataque às famílias, a perseguição que surge no horizonte contra cristãos, tudo aponta para um futuro onde liberdade, diferença e individualidade serão palavras proibidas. Para construir um mundo igualitário, deve-se primeiro destruir a liberdade.
Vale a pena ler os livros, vale muito mais aprender com eles e se o aprendizado é feito junto a seu filho e/ou aluno, melhor, pois famílias educadoras não são escravas do estado nem de uma ideologia.
Carlos Alberto Chaves Pessoa Júnior
Professor. É formado em Letras pela UFPE.