O STF e os morros cariocas. O Império do Tráfico agradece...
06/08/2020 às 08:17 Ler na área do assinanteO STF formou maioria para proibir ações policiais nas comunidades do Rio de Janeiro, que só poderão ser realizadas em situações excepcionais, mediante prévia comunicação ao Ministério Público e de forma fundamentada, sob pena de responsabilização civil e criminal (ADPF 635 MC-TPI / RJ).
O fundamento basilar da decisão é que há grande letalidade neste tipo de ação e que a pandemia agravou o quadro.
Novamente, a Excelsa Corte faz as vezes do Estado administração e age como secretário de segurança.
Segurança Pública é dever do Estado. E seu combate, na grande maioria dos crimes, é função do Estado membro.
Nem mesmo a União é competente para o combate ao crime regular, ou seja, a grande criminalidade. Aquela que ocorre nas ruas, inclusive nas favelas, tendo o tráfico de drogas como mola propulsora.
A total ausência do Estado e de operações policiais para conter o avanço do crime organizado fortalecerá o que já existe, ou seja, um estado paralelo dentro do Rio de Janeiro.
Proibir o Estado oficial de exercer sua função de combate ao crime organizado vai de encontro a toda doutrina de segurança pública.
É algo impensado para quem tem o mínimo de consciência de como o crime organizado age.
Agora, na primeira operação excepcional, o império do tráfico dará um jeito de alvejar inocentes para culpar a polícia e, com isso, reforçar a tese incorreta adotada pelo STF de que o Estado coloca em risco a quem deve proteger.
Esse modelo de ação também é adotado pelo terrorismo ao criar o “escudo humano” nos locais onde tem interesse, notadamente nos depósitos de armas e munições e nas instalações de comando.
Situações excepcionais ocorrem nas comunidades do Rio de Janeiro todos os dias, onde quem manda é o tribunal do tráfico.
A polícia, bem ou mal, ainda colocava alguma ordem no local. Com a proibição de operações regulares, a tendência é a consolidação e incremento do crime organizado, que terá tempo suficiente para se estruturar ainda mais.
Ninguém desconhece que, não raras vezes, ocorrem efeitos colaterais nas operações policiais. No entanto, parece-me que é muito pior deixar as favelas nas mãos de criminosos sanguinários, que ficarão ainda mais fortes com a ausência da intervenção estatal.
Os moradores das comunidades não mais contarão com a polícia, o que, aliás, já ocorria em grande parte delas. Isso porque o ingresso de policiais só é viável com um aparato de guerra. Nem isso será possível, exceto em situações excepcionais, que não sei quais são.
Da última vez em que a polícia deixou de atuar nas comunidades por ordem de um tal governador, vimos o que ocorreu. As comunidades foram tomadas pelo crime organizado.
O império do tráfico, que já domina os morros cariocas, terá muito tempo para aumentar seu poder, inclusive de fogo.
O crime organizado agradece pela gentileza...
Cesar Dario Mariano. Procurador de Justiça do Estado de São Paulo.