O “Brasil varonil” inexoravelmente adentra em uma das piores crises econômicas de sua história, impulsionado por uma irresponsável crise político-partidária e de credibilidade. Os parlamentares trabalham pelo enfraquecimento da autoridade presidencial objetivando maiores benefícios pessoais e para os grupos que representam. O Executivo cede e se recolhe para os bastidores, se esconde, e o PT se esvazia e é abandonado pelos Movimentos Sindicais.
As previsões são nebulosas sinalizando uma retração econômica de 2%, inflação na casa dos 8%, desemprego crescente e espiralado. Enquanto isso os parlamentares vão adiando e protelando a votação das medidas que objetivam reequilibrar as contas públicas.
Não querem a Dilma fora da presidência, ao contrário, querem-na subjugada ao “parlamentarismo branco” comandado por Eduardo Cunha e Renan Calheiros.
Dilma Rousseff, por sua vez, provocou uma grande trapalhada com a minirreforma ministerial da semana passada. Para substituir o jornalista Thomas Traumann nomeou o ex-vereador e ex-prefeito de Araraquara, ex-deputado estadual e ex-tesoureiro de sua campanha para reeleição, Edinho Silva (PT) para comandar a Secretaria de Comunicação Social.
O sociólogo Edinho é da mesma corrente que o ministro das Comunicações, Ricardo Berzoini, defensor do projeto de regulação e controle social da mídia, que declarou: “Não tenho tolerância a ideias contra a liberdade de expressão, mas toda liberdade é combinada com outras”. Só a ala mais radical da esquerda aplaudiu.
A verba de publicidade do governo federal, estimada em R$ 200 milhões para 2015, continuará sendo administrada por Roberto Messias, que permanece na Secom desde os tempos de Franklin Martins. Por outro lado, o secretário-executivo do Ministério das Comunicações, Luiz Azevedo, não esconde seu autoritário projeto de auditar a contabilidade das emissoras de rádio e TV particulares, tal qual se faz nas bolivarianas Venezuela, Bolívia e Cuba.
Por determinação de Eduardo Cunha, presidente da Câmara, o ex-deputado Henrique Eduardo Alves foi nomeado para o ministério do Turismo, no lugar de Vinicius Lages, afilhado político de Renan Calheiros, presidente do Senado. Dilma impôs a condição de obter apoio dos deputados federais do PMDB ao pacote fiscal e à política de reajuste de aposentadorias – não recebeu resposta.
Humildemente ofereceu a Renan Calheiros, como premio de consolação, a presidência da Conab (empresa pública de abastecimento de alimentos). O presidente do Senado, irritado, exigiu o Ministério das Cidades (do Kassab - PSD), mas aceita o Ministério da Integração Nacional para um político de seu grupo de liderados, como compensação. O ex-presidente Lula e o vice-presidente Michel Temer apoiaram essa pretensão. O vice complementou dizendo que “O PMDB precisa de maior espaço no Governo”. Mas esclareceu que “Isso depende da presidente. Mesmo quando se escolhem ministros, quem escolhe é a presidente, não é o partido”.
Entretanto, ao que parece, o caso mais sério está na Pasta da Educação, ora ocupada pelo professor Renato Janine Ribeiro, titular da disciplina “Ética e Filosofia Política” da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas desde 1975. O professor cursou filosofia e doutorado na USP, fez o mestrado na Universidade de Paris.
Renato Janine é cultuador das ideias do filósofo inglês Thomas Hobbes que defendia a ideia de que os homens só podem viver em paz se concordarem em submeter-se a um poder absoluto e centralizado. O Estado, segundo Hobbes, não pode estar sujeito às leis por ele criadas porque isso seria infringir sua soberania. A Igreja cristã e o Estado cristão, para ele, formavam um só corpo, encabeçado pelo monarca, que teria o direito de interpretar as Escrituras, decidir questões religiosas e presidir o culto.
O general Golbery do Couto e Silva, grande teórico da Escola Superior de Guerra, em seus escritos costumava fazer referências elogiosas a Thomas Hobbes. No livro Leviatã, sua mais famosa obra, o filósofo defende um contrato social e o governo de um soberano absoluto, afirmando que o caos ou a guerra civil (situações identificadas como um estado de natureza) só poderia ser evitado por um governo forte.
Renato Janine foi diretor de Avaliação da CAPES de 2004 a 2008, cargo de quarto escalão na estrutura organizacional do governo federal. Também foi membro da Diretoria da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, disputando a presidência da mesma - perdeu. É autor de livros e ensaios, entre os quais: A marca do Leviatã (1978), A última razão dos reis – ensaios de filosofia e política (1993), Ao leitor sem medo – Hobbes escrevendo contra o seu tempo (1999), A etiqueta no antigo regime (1999), A sociedade contra o social: o alto custo da vida pública no Brasil (2000).
Essas obras contêm ideias absolutistas que o aproxima de Edinho e de Berzoini, mas que são pouco recomendáveis para quem vai comandar a pasta de educação da democrática “Pátria Educadora”.
O polêmico substituto de Cid Gomes, antes de reunir-se com a presidente, reuniu-se com Lula para receber as orientações necessárias. Ele tem como desafio a implementação do Plano Nacional de Educação, sancionado em 2014, que não é consenso entre os educadores. O orçamento do MEC sofreu um significativo corte e seus principais programas e projetos foram, também, enxugados radicalmente. Por outro lado, dificilmente receberá o apoio do Congresso Nacional, considerando que fez duras críticas ao presidente da Câmara e ao presidente do Senado, Eduardo Cunha e Renan Calheiros, afirmando que, “pelo visto não têm preocupação com o País” uma vez que ambos “são acusados de fatos de corrupção grave”.
O novo ministro da Educação tem a língua solta e atirou para todos os lados, sobrando até para seu partido: “O PT não apenas foge de qualquer discussão sobre o “mensalão” e a corrupção na Petrobras, como desistiu de apresentar seu currículo ético”, e mais, “era o partido da ética e relaxou no combate à corrupção”.
Em relação à presidente Dilma, diz Renato Janine: “a presidente não é a mais fácil do mundo em termos de gestão, direção, etc. Os ministros continuam tendo as orelhas puxadas cada vez que falam uma coisa de que ela não gosta”, e complementou: “Com Levy, eu suponho que ela não grite. A maior parte do ministério é fraca, com honrosas exceções”.
O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, não deixa por menos, em São Paulo, falando em inglês para um grupo de ex-alunos da escola de negócios da Universidade de Chicago, criticou Dilma Rousseff dizendo: “Acho que há um desejo genuíno da presidente de acertar as coisas, às vezes, não da maneira mais fácil, mas... Não da maneira mais efetiva, mas há um desejo genuíno”. Em relação aos parlamentares afirmou que são nossos “novos amigos”. Falando para nove governadores do Nordeste, na presença de Dilma, o Ministro esclareceu o que todos os economistas sabem, que “a relação entre dívida bruta e PIB está muito alta – próxima de 70%”, obrigando a Presidente, constrangida, interrompê-lo para dizer que “Não é alta, não, Levy”, provocando risadas da plateia.
Levy, enquanto o PT submerge no turbilhão das denúncias de corrupção, tornou-se o principal articulador político do governo e, periodicamente, despacha com o presidente da Câmara e/ou com o presidente do Senado. Na última reunião com Renan ficou acordado que os Estados e os municípios depositarão em juízo as parcelas da dívida com a União com base no novo cálculo (IPCA mais 4% ao ano ou Selic, o que for menor). O ministro, em nome da presidente, se comprometeu adotar uma solução definitiva em 2016. Renan retribuiu mandando engavetar o projeto que dava 30 dias para o governo cumprir a lei sancionada em 2014.
Com esses ministros a presidente Dilma não necessita de oposição.
LANDES PEREIRA. Economista com mestrado e doutorado. É professor de Economia Política.
Landes Pereira
Economista e Professor Universitário. Ex-Secretário de Planejamento da Prefeitura de Campo Grande. Ex-Diretor Financeiro e Comercial da SANESUL. Ex-Diretor Geral do DERSUL (Departamento Estadual de Estradas de Rodagem). Ex-Diretor Presidente da MSGÁS. Ex-Diretor Administrativo-Financeiro e de Relações com os Investidores da SANASA.