O político Philadelfo Garcia

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Phila, como era conhecido pelos amigos e pelos adversários, não morava em Mato Grosso e, praticamente, não manteve relações sociais com o povo mato-grossense. Mesmo assim se elegeu para quatro mandatos de deputado federal (1951-55, 1955-59, 1959-63, 1963-67) representando o Estado. Os tempos e os meios de comunicação eram outros, foi um fenômeno político, sem dúvida.

Nasceu em 1916 na cidade de Coxim. Sua família mudou para Três Lagoas, onde fez o curso primário (Grupo Escolar Afonso Pena); o ginasial e o segundo grau foram cursados em Petrópolis (Internato dos Irmãos Maristas), e o curso superior no Rio de Janeiro. Em 1935 procurou Filinto Muller, então chefe de Polícia do Rio de Janeiro (que funcionava nos moldes da atual Polícia Federal, diretamente vinculada ao Palácio do Catete), que o nomeou auxiliar de investigador. Promovido, foi trabalhar no gabinete de Filinto como assessor, tornando-se “mensageiro” encarregado de levar relatórios confidenciais do Chefe de Polícia para Getúlio Vargas (chefe de governo) e trazer as ordens deste para a Polícia.

Ficou conhecido da cúpula governamental, estreitando o relacionamento junto aos amigos do austero e temido Filinto, pois era visto como sendo sua sombra, seus olhos e seus ouvidos. Trabalhava durante o dia e estudava direito à noite, na famosa Faculdade Nacional de Direito, onde bacharelou-se em 1941. Casou-se com uma prima e fixou residência no bucólico bairro de Santa Tereza.

Filinto, em 1943, devido à forte pressão política e percebendo que o Governo Vargas começava a balançar e perdia força, deixou a chefia da Polícia e foi nomeado presidente do Conselho Nacional do Trabalho (depois Tribunal Superior do Trabalho), levando Philadelfo como seu secretário.

Filinto Muller (PSD) candidatou-se ao Senado em 1945, tendo Phila como coordenador de campanha. Não se se elegeu e Phila foi nomeado advogado da Prefeitura do Rio de Janeiro – ambos retornaram para a Cidade Maravilhosa, distanciando-se das plagas mato-grossenses. Getúlio foi deposto e, em 1947, com uma nova Constituição, o país teve eleições complementares. Filinto novamente se candidata, elegendo-se senador por Mato Grosso. Philadelfo, o coordenador de campanha, foi nomeado Diretor da Divisão do Interior do Ministério da Justiça, retornando ao Rio de Janeiro. Arnaldo Estevão de Figueiredo (PSD), que tinha sido alcaide em Campo Grande, apadrinhado de Filinto, foi eleito governador de MT.

Em 1950 Filinto Muller saiu candidato a governador de MT. Phila se deslocou para Cuiabá pronto para participar da campanha eleitoral. Na convenção do PSD seu nome é incluído para completar a lista de candidatos a deputado federal, para cumprimento do rito burocrático do Tribunal Eleitoral. Filinto perdeu mas, para surpresa geral, elegeu seu protegido desde os tempos da chefia de Polícia do Distrito Federal.

A derrota de Filinto deu-se devido a dois fatos, segundo os analistas políticos da época. O primeiro fato, foi a até hoje inexplicada decisão de Arnaldo Estevão de Figueiredo romper o acordo com o PTB e se lançar candidato ao Senado. Há uma hipótese de que ele tenha feito um acordo com a UDN; e o segundo fato foi a retirada do apoio de Getúlio Vargas devido a uma polpuda contribuição dos “fazendeiros da UDN de MT” para sua campanha. Segundo palavras de Phila, o cheque da contribuição foi entregue pelo general Américo Martinho Lutz, que comandou a NOB por oito anos.

O novo deputado mostrou ser um grande articulador de bastidor, transitando livremente no Congresso e no Palácio do Catete, sempre fiel ao senador Filinto. Em um inesperado golpe de sorte, em 1951, manteve contato com o sindicato dos funcionários da Estada de Ferro Noroeste do Brasil, sediado em Bauru. A NOB tinha cerca de 450.000 funcionários (lotados entre Bauru e Santa Cruz, passando por Corumbá, com um ramal de Campo Grande a Ponta Porã) que reivindicavam isonomia com os funcionários da Estrada de Ferro Central do Brasil. Phila apresentou um projeto que se transforma na Lei 1163/52, batizada de “Lei Philadelfo Garcia”, beneficiando todos os ferroviários das estradas de ferro da União, em regime de autarquia.

Como no Plano de Metas de JK estava previsto a construção de grandes hidroelétricas, em 1957 apropriou-se de um projeto que o deputado Vandoni de Barros, representante de MT apresentara na legislatura anterior e encontrava-se engavetado. Tratava-se de um projeto de aproveitamento hidrelétrico do Rio Paraná, mais ou menos nos moldes do Vale do São Francisco, o qual foi aprovado, daí nascendo a Usina de Urubupungá. Com esse novo golpe de sorte, Phila passou a ser conhecido como o defensor do “Bolsão Mato-Grossense”.

Phila assumiu o codinome de “Deputado Ferroviário”, garantindo sucessivas reeleições para a Câmara. Manteve permanente relacionamento com a alta direção da empresa e com o sindicato dos trabalhadores da NOB. Aproximou-se do deputado paulista Ulysses Guimarães (PSD), que mantinha uma base eleitoral em Bauru, e ambos se aproximaram do mineiro Tancredo Neves (PSD), amigo de Filinto.

Em 1960 a Capital do país mudou para Brasília, mas Phila continuou morando no Rio de Janeiro. Ficava no Rio de sexta a segunda-feira, e em Brasília de terça a quinta feira. Não vinha a Mato Grosso, mesmo assim se reelegeu em 1962. Nesse mesmo ano, influenciado pelo pecuarista e deputado paranaense Rafael Resende, comprou uma fazenda em sociedade com seu sogro no Norte do Paraná, mudando sua rotina de viagens que passou a ser: Brasília-Rio de Janeiro-Londrina.

Em 1964, sem alarde, transferiu sua residência do Rio de Janeiro para Londrina, no Paraná, onde se tornou pecuarista e montou um grande empreendimento imobiliário. Mato Grosso saiu definitivamente de seu roteiro.

Philadelfo indicou o nome de Pedro Pedrossian, engenheiro da NOB, para o cargo de Diretor Geral da autarquia. O primeiro ministro Tancredo Neves nomeou Pedrossiam, mesmo com a existência de uma CPI onde ele era citado em 31 irregularidades administrativas. Mais tarde foi demitido a “bem do serviço público”.

Entretanto, por intervenção direta do senador Filinto Muller, a pedido de Phila, a exoneração foi transformada em demissão normal.

Filinto desencantou-se com a ideia de ser governador de MT e, em 1965, Antônio Mendes Canale, então prefeito de Campo Grande, era o candidato natural do PSD ao governo do Estado, com grande chance de vitória. Entretanto, seu vice tinha sido cassado pelos militares e, caso renunciasse para candidatar-se, assumiria o presidente da Câmara que era da UDN. Filinto decidiu, então, que Canale permaneceria na Prefeitura e que procurariam outro nome. Philadelfo, discretamente, indicou o nome de Pedrossian para ser candidato a governador. Houve manifestação contra, mas Filinto impôs a candidatura do “turco” de Miranda e o PSD se dobrou à sua vontade.

Filinto Muller foi um líder autocrático desde antes da “Revolução de 32”, e Philadelfo Garcia foi seu fiel escudeiro desde 1935. Ambos podem ser considerados fenômenos eleitorais, devido ao tipo de atuação política que exerceram.

LANDES PEREIRA. Economista com mestrado e doutorado. É professor de Economia Política.

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Landes Pereira

Economista e Professor Universitário. Ex-Secretário de Planejamento da Prefeitura de Campo Grande. Ex-Diretor Financeiro e Comercial da SANESUL. Ex-Diretor Geral do DERSUL (Departamento Estadual de Estradas de Rodagem). Ex-Diretor Presidente da MSGÁS. Ex-Diretor Administrativo-Financeiro e de Relações com os Investidores da SANASA.

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