O Brasil jamais foi extremista; nem durante o governo militar. Em 1943, quando o fascismo se espalhava pelo mundo, os intelectuais da época, entre eles Gilberto Freyre, Aníbal Machado e Artur Ramos reorganizaram a Liga de Defesa Nacional para combater o fascismo internacional e os seus representantes internos.
O movimento cresceu tanto que, no mês de agosto, o Instituto dos Advogados do Brasil foi palco de debates e manifestações em prol da democracia. O embate foi tão acirrado que os moderados da época, à frente Pedro Aleixo, resolveram abandonar o congresso jurídico e promoveram uma manifestação à parte, com 150 juristas. Na ocasião, Sobral Pinto ressaltou “as dificuldades que se erguem no Brasil contra o funcionamento regular de um regime democrático”.
Realmente, viver numa democracia é difícil e dá trabalho. Daí a insatisfação dos brasileiros com os seus representantes. Segundo mostrou uma pesquisa divulgada em 2017 pelo Instituto Latinobarómetro, que mediu o índice de satisfação com a democracia como forma de governo em todos os países da América Latina, o Brasil se destacou negativamente: somente 1% dos brasileiros acreditava viver em uma democracia plena. Foi o menor índice em toda a América Latina. Na Venezuela, o índice era de 8%.
Não é difícil entender as causas da insatisfação popular com a democracia. A má qualidade da representação dos governantes, a negação da política, denúncias de corrupção e a impunidade são apontadas por especialistas como alguns dos motivos para o resultado da insatisfação.
No ano que passou, um levantamento realizado pela Universidade Americana Vanderbilt, em conjunto com a Cepesc/FGV, mostrou a inconformidade do brasileiro com o Congresso Nacional e com o STF. Foram entrevistadas pessoas em cinco regiões do país, e o resultado demonstrou que, pela primeira vez, desde 2012, a direita se tornou no maior grupo político atualmente existente, com 39% de aceitação. A esquerda ficou com 28% e o centro com 33%.
Na mesma época, o Instituto Paraná divulgava que 58% dos brasileiros defendiam a permanência de Lula preso, enquanto 36% defendiam que o mesmo ficasse em prisão domiciliar. Outros 6% não opinaram. Essa manifestação mostra que o povo não aceita mais extremismo, seja da direita, seja da esquerda.
Em 1948, a Câmara dos Deputados assistiu o último discurso do autêntico comunismo no Brasil. O orador era o deputado federal Gregório Bezerra, da extinta bancada do PCB (Partido Comunista Brasileiro).
Em sua fala, Bezerra apresentou um projeto para “instalação de creches e berçários às mães brasileiras”, que viviam num “quadro de misérias, de sofrimento das populações pobres do Brasil”.
Para Bezerra, o presidente da República entendia que, para governar, precisava apenas eliminar os comunistas, cassando-lhes os mandatos, mas que isso de nada adiantaria, pois eles voltariam nos braços do povo: “Saímos empurrados pela reação, mas voltaremos a este plenário conduzidos nos braços do povo e do proletariado”. Jamais voltaram, pois, os militares assumiram o poder, cassaram e prenderam todos os líderes comunistas de então.
50 anos depois que os militares entregaram o poder aos civis, podemos observar que eles não desejam voltar, pois perceberam que serão mais úteis atuando como guardiões da segurança nacional. Eles sabem que governos discricionários não são bons para ninguém, sequer para eles. Daí nossa preocupação com a marcha. Se ela se transformar numa procissão (quem quiser que entenda), quem sofre é a democracia.
Luiz Holanda
Advogado e professor universitário