Ao pedir que a população participe das manifestações programadas para o próximo dia 15, o presidente Jair Bolsonaro relembra o dia 19 de março de 1964, quando, em São Paulo, aconteceu a “Marcha da família com Deus pela liberdade”, que levou 500 mil pessoas às ruas para protestar contra o governo do então presidente da República, João Goulart.
A marcha fora programada para dar resposta a uma frase dita por Goulart no comício do dia 13 do mesmo mês, no Rio de Janeiro:
“Os rosários da fé não podem ser levantados contra o povo”.
Essa afirmação foi dita numa alusão às senhoras que usaram seus terços para impedir um discurso de Leonel Brizola, no começo do mês, em Belo Horizonte.
Os políticos da época não entenderam que, muito mais que uma manifestação religiosa, o movimento era um sinal de que o presidente Jango não contaria mais com o apoio popular para fazer as chamadas reformas de base, na economia e na política. O cenário da sua deposição já estava montado.
Naquela época, o grupo mais organizado tinha como cérebro o general Humberto de Alencar Castelo Branco, e reunia militares da Escola Superior de Guerra e civis do Instituto de Pesquisas e Estudos Superiores (IPEF), ainda embrionário, pois só viria a se organizar como instituição em 1968.
Mutatis mutandis, o cérebro de hoje é o general Augusto Heleno, ministro-chefe do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), que, segundo a imprensa, atacara o Congresso e o Judiciário por impedir as reformas que o presidente quer fazer.
A diferença é que, desta vez, a manifestação do dia 15 está sendo convocada para apoiar o presidente Bolsonaro, que, numa alusão a Rodrigo Maia, presidente da Câmara dos Deputados, afirmou que político que tem medo de rua não serve para ser político.
Os protestos, organizados por grupos que apoiam o governo, desagradaram o Legislativo (Câmara e Senado), muito embora o presidente tenha dito que “não é um movimento contra o Congresso, contra o Judiciário. É um movimento pró-Brasil”.
Como, em política, tudo o que acontece no mês de março tem influência histórica, nossos representantes não estão atentando para o fato de que, por força do destino, o passado impõe-se ao presente.
Em 15 de março de 2.058 (44 A.C.), em Roma, Júlio César foi assassinado com 23 facadas desfechadas pelos conspiradores, à frente seu amigo Brutus, imortalizado na tragédia de William Shakespeare:
“Até tu, Brutus”.
Entre nós, em março de 1964, teve início o movimento que derrubou o presidente João Goulart e permitiu que os militares governassem o país por quase trinta anos.
A conjuntura atual, exacerbada pelos problemas econômicos, pelo desemprego e pelo coronavírus, favorece a agitação.
No calendário romano da época de César, o mês de março era dominado por bruxarias e por acontecimentos fatídicos.
Dizem que, a caminho do Senado, César teria sido advertido por um adivinho para ter cuidado com os idos de março.
Confiante em sua força, não deu qualquer atenção.
Sua vida e seu reinado terminaram em tragédia, tanto na história como na literatura.
Por coincidência, os idos de março caiam sempre no dia 15.
E a marcha bolsonarista, que deverá contribuir para fortalecer a posição do presidente, vai ser, justamente, no dia 15.
É muita coincidência.
Luiz Holanda
Advogado e professor universitário