Procurador de Justiça questiona Dráuzio: Quem você abraça?
09/03/2020 às 11:20 Ler na área do assinanteO pequeno Fábio tinha apenas 9 anos de idade, mas era bem conhecido no bairro onde morava (União de Vila Nova, Zona Leste da cidade de São Paulo). Todos o adoravam.
“Aqui ele era um filho para todo mundo, não só para mim. Ele via uma senhora com sacola e perguntava: quer ajuda?”, lembra seu pai, Emerson.
Numa segunda-feira do mês de maio de 2010, um vizinho da família de Fábio, de nome Rafael Tadeu de Oliveira Santos, na faixa dos vinte anos de idade, abusou sexualmente do menino, praticando sexo oral e anal com ele.
Em seguida, para assegurar sua impunidade, Rafael matou Fábio, estrangulando-o, e escondeu o corpo do menino em sua própria casa.
Passados dois dias, com o corpo em decomposição, o assassino decidiu abandonar o cadáver em um terreno quase em frente à residência dos pais de Fábio, a essa altura já desesperados com o desaparecimento do filho.
Cinicamente, Rafael foi informar à mãe de Fábio que havia “encontrado” um cadáver ali perto.
Desmontada a farsa pela investigação da polícia, Rafael foi processado por estupro e homicídio triplamente qualificado, sendo afinal condenado a 36 anos de prisão (sentença transitada em julgado).
E que tipo de pessoa era Rafael Tadeu? Sua tia, Carlita, prestou depoimento no processo e disse que seu sobrinho “roubava, mentia (...) depois dos 12 anos começou a roubar com arma, usava maconha (...) foi acusado de estar abusando de uma criança de três anos, e os parentes da criança foram na minha casa atrás dele, querendo matar ele (...) foi passar férias na casa do irmão e tentou estuprar o sobrinho de cinco anos (...) na escola era acusado de roubar os professores, de estupro (...)”.
Na semana passada, o programa Fantástico, da Rede Globo, fez uma reportagem na qual o médico Drauzio Varela entrevistou Rafael Tadeu, que se apresenta como Suzy.
O doutor Drauzio não fez qualquer pergunta sobre o estupro e a morte do pequeno Fábio - aliás, os telespectadores sequer ficaram sabendo, na ocasião, por que tipo de crime Suzy estava cumprindo pena.
O objetivo do doutor Dráuzio e da Rede Globo com a matéria jornalística era mostrar “a solidão dos transexuais” nas prisões brasileiras. Quando Suzy lhe informou que há oito anos não recebe visitas nem cartas, o doutor Dráuzio ficou tão emocionado que lhe deu um abraço.
Quem também ficou emocionada foi uma professora de Educação Infantil de uma escola de São Paulo - tão emocionada que fez seus aluninhos (crianças como o pequeno Fábio, morto por Suzy) escreverem cartinhas de solidariedade ao assassino com “lindos desenhos e mensagens”.
Sobre a barbaridade do crime ela não disse nada - ao que tudo indica, nem quis saber.
Quanto à solidão, o vazio e a tristeza que a morte do pequeno Fábio deixaram na vida do Seu Emerson (pai do menino), o doutor Drauzio nada tem a declarar - e a professora de São Paulo não vai encorajar seus pequenos alunos a escrever carta alguma para a mãe de Fábio.
Se restar alguma dignidade ao doutor Drauzio, agora que o Brasil inteiro já sabe o que ele e a Rede Globo omitiram no programa Fantástico, o mínimo que se espera é que ele procure os pais de Fábio e ofereça um abraço de solidariedade.
Assim como o mínimo que se espera da escola de São Paulo (não sei o nome) é que demita a professora que deseduca as crianças, “ensinando-as” a inverter valores.
A verdadeira guerra é cultural, é de valores.
Um amigo meu diz que quando ouve a frase acima não consegue entender direito, porque a acha “muito abstrata”.
Hoje ele entendeu. Obrigado pela ajuda (involuntária), doutor Drauzio.
(Texto de Marcelo Rocha Monteiro. Procurador de Justiça no MP/RJ)