Neste momento, o relator da Operação Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal, ministro Teori Zavascki, está curtindo férias numa praia do Rio Grande do Sul. Enquanto isso, a impunidade rendida às organizações criminosas que comandam o país garante a manutenção das torneiras abertas por onde escoam bilhões de Reais roubados dos cofres públicos. Assistindo ao sol nascer quadrado, só mesmo os beócios sem foro privilegiado. Aqueles que têm prerrogativa de foro e, portanto, dependem de juízo do STF, estão livres, leves e soltos, mandando — e mandando muito! — na República Federativa do Brasil.
As delações homologadas pelo Poder Judiciário revelam bem mais que crimes bilionários cometidos por centenas de pessoas contra o patrimônio público brasileiro. No fundo, conforme são liberadas à consulta, as delações exibem um detalhe crudelíssimo no âmbito da Lava-Jato e de seus afluentes: quando as investigações esbarram na prerrogativa de foro privilegiado, a cabeça política do Supremo Tribunal Federal impõe ao corpo focos seletivos de apuração, com autoridades denunciadas por um mesmo crime sendo tratadas com enorme distinção.
Muito provavelmente, tornar-se-á caso clássico para futuros estudos e debates o tratamento jurídico diferenciado destinado às duas principais figuras do Poder Legislativo atoladas até o pescoço nos escândalos de corrupção que sacodem a República. Se, por um lado, o ministro Teori Zavascki parece caçar à bala o deputado federal Eduardo Cunha, presidente da Câmara e declarado desafeto do governo petista, por outro é concedida especial acolhida ao senador Renan Calheiros, presidente do Senado Federal e aliado de primeira ordem da súcia de celerados planaltinos.
Basta observar o último salseiro realizado com autorização do STF e a misteriosa distinção surge em grande escala. No dia 15 de dezembro de 2015, a famigerada Operação Catilinárias cumpriu mandados de buscas e apreensão na residência oficial da Presidência da Câmara, em todos os imóveis do deputado Eduardo Cunha e contra dezenas de seus aliados. No total, foram 53 mandados. No entanto, misteriosamente — é importante reiterar! —, a Procuradoria-Geral da República pediu e o ministro Teori Zavascki negou buscas e apreensões nas residências do senador Renan Calheiros. Por que?
A pergunta é extremamente adequada, afinal, sabemos hoje pela publicidade de vários documentos dos inquéritos da Lava-Jato, a Operação Catilinárias teve como principal mote a delação homologada e premiada de Nestor Cerveró. Nela, o ex-diretor da Petrobras entrega uma gama vastíssima de autoridades e políticos envolvidos em bilionária corrupção. Cerveró não denuncia apenas Eduardo Cunha e seus aliados. Na verdade, seus depoimentos à Polícia Federal e à Justiça acusam os ex-presidentes Luiz Inácio da Silva — vulgo "Lula", "Brahma" e até "Deus" —, Fernando Henrique Cardoso e Fernando Collor de Mello, dirigentes do PT, do PMDB e do PSDB, o senador Renan Calheiros e até a atual presidente Dilma Rousseff é citada. Por que Teori só desfere ataques frontais contra Eduardo Cunha?
Ademais, cumpre ressaltar, os inquéritos da Operação Lava-Jato que estão sob o comando do juiz federal Sérgio Moro seguem a todo vapor, com mais de seis dezenas de condenados e quase R$ 1 bilhão recuperado com os bandidos de colarinho-branco que atualmente repousam no xilindró. Enquanto isso, o Supremo Tribunal Federal está sentado sobre os inquéritos contra políticos com prerrogativa de foro privilegiado, sem prazo para conclusão e julgamento e sustentando o ardiloso império da impunidade neste país saqueado. As suspeições contra o STF podem ir além e vale conjecturar que Delcídio do Amaral só foi preso porque o filho de Cerveró gravou o senador petista explicando como funcionam as "negociações" à sombra com ministros da Suprema Corte.
E aí, Teori, vais trabalhar? Vais punir os "tubarões"? Vais dar celeridade às investigações da Lava-Jato? Ou vais deixar tudo como está para ver como é que fica? E aí, Teori?
HELDER CALDEIRA
Escritor e Jornalista Político
www.heldercaldeira.com.br – helder@heldercaldeira.com.br
*Autor dos livros "Águas Turvas" (Quatro Cantos, 2014) e "A 1ª Presidenta" (Faces, 2011), entre outras obras.
Helder Caldeira
Escritor, Colunista Político, Palestrante e Conferencista
*Autor dos livros “Águas Turvas” e “A 1ª Presidenta”, entre outras obras.