Nessa distopia chamada Brasil, falar a verdade virou crime

11/02/2020 às 05:01 Ler na área do assinante

Se a saúde de todo mundo aqui é um "direito social" (art. 6º da Constituição) e provê-la é "dever do Estado" (art. 196), é óbvio que “pessoa portadora de HIV é despesa para todos no Brasil”, assim como são, a rigor, desde a pessoa portadora de resfriado até a pessoa portadora de câncer.

A diferença, no caso, é que a despesa da pessoa portadora de resfriado no máximo vai ser de um antigripal de R$ 2,00, (enquanto que o fornecimento de antirretrovirais aos portadores de HIV custa ao país cerca R$ 1,2 bi/ano), ao passo que, à exceção de alguns tipos de câncer, dificilmente alguém com essa doença poderia ter feito algo para evitar seu desenvolvimento (ao contrário de quem contrai qualquer DST, que poderia ter se prevenido através de camisinhas distribuídas gratuitamente desde postos de saúde até estações do metrô).

Qualquer um aqui vai dizer que 12, 13 ou 14 anos de idade é muito cedo pra que alguém inicie a vida sexual. Se você acha isso, saiba que está em boa companhia: o Código Penal não só torna ilícitas todas as relações sexuais mantidas com menor de 14 anos (art. 217-A), como ainda fixa, como causa de aumento de pena em diversos crimes, o fato de a vítima ter menos de 14 anos.

Não é a Damares, é todo o nosso sistema jurídico que diz que menores de 14 anos são vulneráveis e não estão prontos para uma série de coisas, incluindo sexo.

E, no entanto, dizer que uma menina de 11 anos não está pronta para se expor a uma gravidez vira uma "polêmica" aqui na Terra do Nunca, e tem até "especialista" assegurando que não transar não garante que a moça vá deixar de engravidar (!?).

Quem diria que uma ministra evangélica faria até ateu acreditar em concepção virginal?

"Parasitas", de acordo com a biologia, são "organismos que vivem em associação com outros dos quais retiram os meios para a sua sobrevivência, normalmente prejudicando o organismo hospedeiro".

Se você tem uma empresa e ela está em crise, você pode ou cortar pessoal ou deixar de conceder aumento de salário, não porque você odeia os seus funcionários, e sim porque você deve preservar o equilíbrio financeiro do seu negócio se quiser manter os demais empregos e continuar provendo produtos e serviços aos seus consumidores. Mas se você tem um funcionário que, mesmo com a empresa falindo, não pode ser demitido e ainda te obriga a conceder 50% de aumento, é óbvio que esse funcionário está parasitando a sua empresa. Por conta desse parasita, sua empresa pode quebrar, mas o parasita não se importa, porque se isso acontecer o hospedeiro vai ter que se livrar de todos os outros órgãos, mas não vai poder expurgar o parasita de seu organismo.

Essa verdade é tão verdadeira, mas tão verdadeira, que, em se tratando de Brasil, o cara que a disse precisou se desculpar, deixar claro que não foi bem isso que quis dizer, e prometer que no futuro vai se policiar mais e procurar falar menos verdades.

No Brasil a mentira e a fabulação são tão benquistas que até documentário vira obra de ficção.

Então, fica a dica: quer manter seu emprego, ser popular, quer ser admirado e querido? Minta, mas minta muito. Porque, no Brasil, a verdade não compensa.

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