A riqueza faz e desfaz o centro da cidade

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O centro da cidade é o local onde a riqueza instala os seus escritórios, desenvolve o seu comércio e serviços a terceiros. Gera os empregos e atrai os trabalhadores. Esses se localizam nas periferias, e tem acesso ao centro por meio de transporte coletivo, utilizando as vias radiais.

Num primeiro momento as cidades abrigam pequenas e médias indústrias para o suprimento local e que se instalam nas áreas intermediárias entre o centro e as periferias.

Com o aumento de escala de produção e, consequentemente, do tamanho das unidades essas tenderam a se localizar em regiões específicas, concentradas em distritos ou zonas industriais. Ficam mais distantes das moradias, empregam trabalhadores que moram em diversas partes da cidade, em geral, sem transportes coletivos diretos entre os bairros.

O comércio e o serviço passam a responder pela maior parte dos empregos, gerando viagens para os polos dessas atividades, concentradas no centro.

Com a dispersão das atividades econômicas gerando novas áreas ou centros de emprego, e necessidade de locomoções interbairros, o centro se torna o principal "hub" de transferências dos serviços de transporte coletivo.

Em função da organização do sistema viário segundo o modelo "centro-radial", os usuários de automóveis também  se deslocam até o centro por uma das radiais para ter acesso a outra. O resultado é um crescente congestionamento das vias radiais e das vias alternativas. A construção de perimetrais desafoga, acaba gerando maior movimentação.

A "invasão da pobreza" nos ônibus e os congestionamentos das vias no centro faz com que a riqueza vá abandonando progressivamente, buscando a formação de novos polos (circulares ou lineares) transferindo para esses a demanda de trabalhadores, serviços de transporte coletivo e automóveis.

Essa transferência se dá não só pela localização das sedes corporativas, como por novas formas de comércio de média e alta renda: os shopping centers. Esses ocupam áreas vazias, mas promovem a ocupação, adensamento e verticalização das áreas em torno deles.

O centro perde densidade econômica, mas é mais resistente em relação à demanda e circulação de pessoas, seja pela ocupação dos imóveis por atividades econômicas de menor renda, mas mais densas, como pelo seu papel de hub do transporte coletivo.

O que sustenta a vitalidade do centro é essa movimentação de pessoas na transferência de linhas de transporte coletivo.

As propostas de racionalização dos sistemas de transporte coletivo, para a melhoria da mobilidade urbana tendem a conspirar contra a vitalidade do centro.

De um lado se propõe a construção de grandes terminais de transferência (também caracterizados como de integração) fechados, para transferências sem o pagamento de nova tarifa, mas que confina os usuários e o comércio dentro desses terminais. O que promove a vitalidade do centro é a existência de diversos terminais, com a movimentação dos usuários entre eles, e no caminho, fazendo compras, se alimentando ou contratando serviços. Com o desenvolvimento da tecnologia, viabilizando os bilhetes eletrônicos para a sua utilização múltipla a ideia das mega e únicas estações de transferência perdeu força. A favor de centro principal.

De outro lado com o crescimento das demandas interbairro a medida para melhorar a mobilidade urbana é estabelecer linhas diretas entre esses bairros dispensando a transferência no hub central. Isso reduz a circulação de pessoas e de renda dentro da área central, contribuindo para a sua deterioração.

O centro histórico tem, no entanto, a sua resiliência. Com a redução da demanda, desafogando as linhas de transporte coletivo, o congestionamento das vias e provando um barateamento dos aluguéis, população jovem tem buscado o centro como alternativa de moradia, dentro de um novo padrão: dispensam o carro, moram em espaços menores, se utilizam mais de serviços externos, trabalham e se relacionam via internet.

Posicionamentos alternativos

Diante dessas circunstâncias e tendências a autoridade municipal tem as seguintes alternativas básicas de posicionamento:

Seguir as mudanças da população, ajudando a consolidá-las, provendo ou melhorando a infraestrutura e serviços públicos nos novos polos econômicos da cidade, mesmo que em detrimento do centro histórico;

Sustentar as atividades tradicionais do centro, mantendo a sua vitalidade, principalmente:

"hub" do transporte coletivo;

Sedes da Administração Pública;

Promover a revitalização do centro, reciclando funções, principalmente como:

Polo de lazer;

Moradia com vasto suprimento de serviços urbanos.

Na primeira alternativa não é definida nenhuma política específica para o centro, o que significa - na prática - não ser dada prioridade ao processo de deterioração. Embora isso não seja explicitado. Uma das razões para essa posição é de que investir no centro é "enxugar gelo". Não há como conter o processo natural de abandono do centro histórico pela própria população. Busca-se, no entanto, a preservação do patrimônio histórico, artístico e cultural, o que, na prática, agrava o processo de degradação econômica.

Na segunda preservar o centro é considerado prioritário, buscando conter o processo de degradação. A estratégia principal é de preservar funções públicas no centro, evitando a mudança dos centros administrativos para novas áreas, concebidos e implantados dentro de conceitos "modernos". São as próprias autoridades que imbuídas do espírito de modernização e de escapar das dificuldades de mobilidade urbana buscam a mudanças das sedes. Assim como o setor privado. Ainda no campo público a manutenção do papel de hub do transporte coletivo deve ser considerado como vital para evitar o esvaziamento do centro.

A terceira alternativa, fortemente defendida por uma facção de urbanistas e da própria sociedade, é a do Poder Público Municipal assumir a responsabilidade de promover a revitalização do centro histórico. Não basta a preservação ou a contenção da degradação. Para isso são consideradas quatro ações ou caminhos principais:

Desenvolver atividades de lazer, em todos os campos: esportivo, passeio, cultural e artístico, implantando infraestrutura e promovendo eventos;

Promover o centro como ponto de encontro facilitando a instalação de bares, restaurantes, casas de shows e outros locais de reunião da população;

Revitalizar os imóveis mediante a sua restauração, pintura das fachadas e outras ações de caráter estética, criando incentivos para os proprietários;

Promover a moradia no centro, buscando duas categorias de moradores:

Trabalhadores em atividades de menor renda, com trabalho no centro, oferecendo vantagens de redução da movimentação;

Jovens de classe média que buscam novos padrões de vida, sem carro, moradias de menor espaço e menor custo, com o suprimento de facilidades por terceiros, dentro da própria área.

Jorge Hori

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