O plano Joaquim Levy
Enquanto Levy brincava de político, o PMDB emplacou um “parlamentarismo bicameral”
31/05/2015 às 00:14 Ler na área do assinanteJoaquim Levy, ministro da Fazenda,ex-executivo do Bradesco e ex-diretor do Tesouro Nacional, assumiu o ministério com a missão de implementar uma política neoliberal capaz de corrigir os grosseiros erros da política econômica vigente, mesmo contrariando os interesses do PT e dos eleitores que reelegeram Dilma Rousseff. Era um acerto “por debaixo do pano” firmado entre o Executivo e o mercado, com o aval de Lula e do Congresso.
Não se fez de rogado e deixou claro que era necessário um “ajuste fiscal” com aumento de impostos e grandes cortes nas despesas – assinalava algo em torno de R$ 100 bilhões. Mostrava que era preciso cobrir o déficit de 2014 (equivalente a 0,6% do PIB) e garantir a meta de superávit primário (resultado positivo de todas as receitas e despesas do governo) deste ano (fixado em 1,2% do PIB). Sentia-se poderoso e negociava diretamente com o presidente da Câmara dos Deputados e com o Presidente do Senado, sem perceber que tudo não passava de uma encenação para que os políticos ganhassem tempo e avançassem nos bastidores.
O plano de Joaquim Levy pretendia ser um clássico instrumento monetarista composto de três medidas provisórias e um projeto de lei (alteração nas condições de acesso a benefícios trabalhistas e previdenciários, elevação do PIS/Cofins sobre importações e revisão da política de desoneração da folha salarial) acompanhado de aumento de impostos para, então, se proceder a um ajuste orçamentário de profundidade.
tendo Michel Temer, vice-presidente, como primeiro ministro. O PT, a CUT e o MST quase passaram para a oposição, enquanto o PSDB perdia o rumo e ficava como verdadeira “barata tonta” no emaranhado da política econômica que se desenhava em defesa de interesses partidários menores. Para calar a boca dos mais afoitos, o Congresso aprovou um exorbitante aumento de recursos para o Fundo Partidário.
A presidente Dilma Rousseff (PT) e o vice Michel Temer (PMDB), tendo o respaldo de Lula e de José Sarney, depois de uma estabanada negociação com o Congresso Nacional, anunciaram o contingenciamento de despesas para o orçamento público de 2015: corte de R$ 69,9 bilhões distribuído pelos 38 ministérios. A Fazenda aceitava R$ 80 bilhões e a Casa Civil queria R$ 60 Bilhões.
Paralelamente, foi aprovado o aumento da alíquota da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido dos bancos e das seguradoras de 15% para 20%. Esses e outros fatos menores desagradaram o ministro da Fazenda, que insinuou que abandonaria o “barco”, trazendo o mercado para o meio da arena. A Bolsa chegou a cair 0,75% e o dólar atingiu R$ 3,14 durante o pregão.
Levy saiu fortalecido e, dizendo que falta “pulso firme”no governo, anunciou que não pretende deixar o cargo. Os banqueiros ficaram satisfeitos.
A qualidade do corte é muito ruim, o que entristece aqueles que têm bom senso e gostariam de ver este país entrar nos eixos. Alguns itens demonstram isso (em milhões de reais): saúde – 11.773, educação – 9.430, ciência e tecnologia – 1.884, desenvolvimento social – 1.391, previdência social 127, e por aí afora.
O Programa de Aceleração do Crescimento terá um corte de R$ 25,7 bilhões e o Minha Casa Minha Vida uma redução de R$ 7 bilhões – os empreiteiros (e financiadores de campanhas eleitorais) não gostaram, mas se calaram. Vários programas do “Pátria Educadora” foram afetados, entre eles o Fies, o Pronatec, o repasse para as Universidades Federais, o Ciências sem Fronteiras e o Sisutec.Sem possibilidades de retorno.
Pelo cálculo do governo as despesas primárias (aquelas que não consideram os efeitos financeiros decorrentes de juros e encargos bancários) diminuirão R$ 65,1 milhões, as despesas obrigatórias (tais como pagamentos de salários e encargos, aposentadorias, pensões públicas, sentenças judiciais e outras tantas) crescerão R$ 4,8 milhões e as despesas discricionárias (também chamadas de custeio e investimentos) foram reduzidas em R$ 69,9 milhões. Entretanto, pela postura governamental que se observa isso não se concretizará no curto prazo.
O ajuste em andamento, em princípio, não dará certo, segundo os economistas acadêmicos, porque no Brasil orçamento público é uma obra de ficção, e contingenciamento (definição de limites) de gastos também é ficção, em um contexto de “ópera bufa”. A receita é estimada pelos técnicos de forma surrealista, e as despesas são previstas e ajustadas para se igualar à receita, sem considerar os restos a pagar (dívidas empenhadas no ano anterior), que no caso atual é superior a R$ 200 bilhões.
Esse “ajuste fiscal” dificilmente dará certo porque depende do Congresso, e os congressistas, acima de qualquer coisa, querem tirar vantagens pessoais em termos de nomeação para cargos públicos, recursos financeiros para seus partidos e outras “coisitas” mais. Sem esquecer que em 2016 e em 2018 haverá eleições e todos querem vencer, não importando o que acontecerá com os eleitores e com a população em geral.
Por outro lado, foi anunciado um bloqueio de R$ 20 bilhões nas emendas parlamentares, mas o Planalto já garantiu aos deputadose senadores que analisará caso a caso a liberação dos recursos, admitindo que será preciso soltar parte do dinheiro para que algumas Medidas Provisórias sejam aprovadas, mesmo que inconstitucionalmente. O “toma lá, dá cá” continuará como moeda de negociação para o “bem do Brasil” (sic). A Presidente reconhece, também, que será necessário um “pente-fino” nos cortes que atinjam cidades estratégicas (onde os prefeitos sejam do PT ou do PMDB). Lula já pediu a liberação de R$ 8 bilhões do PAC para a gestão de Fernando Haddad.
Enfim, o bloqueio de gastos anunciado é pretensioso, 60% maior do que o proposto em 2014 e não realizado. Além do mais, está previsto um substancial crescimento da arrecadação de mais de 5% em termos reais, sinalizando que haverá um pesado aumento da carga tributária.
LANDES PEREIRA. Economista com mestrado e doutorado. É professor de Economia Política.
Landes Pereira
Economista e Professor Universitário. Ex-Secretário de Planejamento da Prefeitura de Campo Grande. Ex-Diretor Financeiro e Comercial da SANESUL. Ex-Diretor Geral do DERSUL (Departamento Estadual de Estradas de Rodagem). Ex-Diretor Presidente da MSGÁS. Ex-Diretor Administrativo-Financeiro e de Relações com os Investidores da SANASA.