Mudança de entendimento do STF pode resultar em ações indenizatórias contra a União que podem atingir R$ 4 bilhões
05/11/2019 às 20:38 Ler na área do assinanteNão. Não é razoável. Não é plausível. Não se pode aceitar. Menos ainda, concordar. Não é estável. Não é seguro. Não é jurídico.
Todas essas reprovações dizem respeito ao Supremo Tribunal Federal( STF), especificamente no caso da prisão após condenação do réu pela segunda instância.
O renomado jurista Iêdo Batista Neves tem muitos livros jurídicos escritos e publicados. Um deles chama-se “Conflitos de Jurisprudência”.
Nos 5 volumes, o autor demostra que um só fato, um só caso, rigorosamente idêntico, encontra decisões conflitantes e diametralmente opostas, mas tomadas pelos tribunais dos Estados. Até mesmo de um só Estado, mas por câmaras ou turmas diferentes. Mas quando o tribunal é o STF, ainda mais pela voz do seu plenário, aí não pode existir conflito. A decisão há de ser uma só, a bem da segurança jurídica e do alinhamento da jurisprudência nacional.
Não se pode aceitar nem conceber que sob o império da uma só Constituição Federal, a de 1988, a mesma situação, o mesmo caso, a mesma hipótese (prisão do réu após condenação pela segunda instância) venha ter pelo plenário da Suprema Corte seguidamente 4 decisões.
Uma num sentido. E quatro outras em sentido oposto. Até 2009 a prisão era permitida e no mesmo ano o STF mudou para só autorizar a prisão após o trânsito em julgado da condenação!.
Ou seja, após esgotados todos os recursos e até que a condenação se tornasse definitiva.
Já em 2016, o mesmo plenário do STF se reuniu, voltou atrás e decidiu por 3 vezes a mesma questão.
E todas as decisões foram no sentido de autorizar a prisão após a condenação em segunda instância.
E tem mais: em 2018, no Habeas Corpus em favor do ex-presidente Lula da Silva, o plenário do STF novamente autorizou a prisão após condenação em segunda instância.
Essas idas-e-vindas, esse vai-e-vem instaura a insegurança jurídica. Tudo fica incerto e confuso. E o STF desacreditado.
E nem se diga que as três Ações Diretas de Constitucionalidade (ADCs) - que estão sendo julgadas e terão sua proclamação final prometida para esta próxima quinta-feira, com o voto do presidente Dias Toffoli -, só por serem ADCs justificaria novamente a mudança da jurisprudência. Não. Não justifica.
Todas as decisões anteriores, a partir de 2009, ratificada três vezes em 2016, foram decisões do plenário da Suprema Corte.
E o STF sendo um tribunal constitucional, suas decisões sempre são à luz da Constituição. Ou poderia ser diferente?.
Não importa o nome da ação que o STF julga, se ADCs, se Habeas-Corpus, se Mandado de Segurança, se Recurso Extraordinário, ou outra denominação qualquer. Todas as decisões obrigatoriamente são tomadas à luz da Constituição. Afinal, a voz do STF é sempre a da Constituição. Da constitucionalidade, portanto.
Logo, esse tema (prisão após condenação pela segunda instância) é questão prá lá de julgada. É "Res Judicata" (Coisa Julgada) segura e sólida, visto que nada mudou, nem a Constituição Federal nem o caso em julgamento (prisão após condenação em segunda instância). Portanto, o plenário do STF tinha e tem o dever de apenas confirmar sua jurisprudência.
Mas não é e nem será assim. Tudo indica que o plenário do STF vai retroceder.
E o retrocesso implicará na soltura de todos os réus que se encontram presos por terem sido condenados em segunda instância.
E daí surgirão ações indenizatórias milionárias por danos morais em favor de todos eles pelo tempo que ficaram "indevidamente" presos…
E tudo a cargo do governo federal. Ou seja, da União.
A mudança que o STF desenha implicará em "Erro Judiciário". Erro que levou aqueles à prisão, antes do trânsito em julgado de suas condenações. E sobre "Erro Judiciário", é o professor Luiz Flávio D'Urso quem nos ensina:
"Sendo o Estado responsável pela distribuição da Justiça será, por conseguinte, de sua responsabilidade os atos judiciais danosos aos cidadão".
Uma estimativa: Se a Justiça fixar em mil salários-mínimos por dano moral para cada preso que vier a ser libertado em razão deste retrocesso que o STF prenuncia proclamar e se a multidão que ganhará a liberdade for de 4 mil presos, a União, se processada for, terá que pagar cerca de 4 bilhões de reais de reparação por dano moral!.
Jorge Béja
Advogado no Rio de Janeiro e especialista em Responsabilidade Civil, Pública e Privada (UFRJ e Universidade de Paris, Sorbonne). Membro Efetivo do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB)