Transitado em Julgado - como distorcer um conceito para favorecer os poderosos

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Transitado em Julgado é uma qualidade que emerge como resultado do trânsito processual através de todas as etapas de um processo judicial, em que os litigantes usufruem de todas as oportunidades de ataque e ou de defesa, culminando com uma sentença proferida por um juiz ou tribunal do júri.

O conceito tem origem no Direito Romano e seu objetivo original provavelmente era de evitar que um acusado inocente cumprisse pena antes de exercer seu direito de defesa. Modernamente também tem o objetivo de evitar que uma mesma causa seja usada para iniciar um novo processo.

Quando a sentença é promulgada, ou a última apelação possível é feita ao juiz, a qualidade de Transitado em Julgado emerge e a sentença é "considerada" imutável e indiscutível. Porém, nenhuma sentença, em nenhum momento, é realmente imutável e indiscutível. Mesmo se uma causa esgotar todas as possibilidades recursais de instâncias superiores, há sempre a possibilidade de anulação da sentença caso se prove que as verdades dos fatos divergem da verdade apurada nos autos.

Resumindo: um processo se torna transitado em julgado quando teve investigação, denúncia, acusação, defesa, julgamento e apelação final ao juiz do processo. Isso não impede, após o trânsito em julgado, que o sentenciado possa recorrer a instâncias superiores. E, mesmo depois de esgotadas todas as possibilidades recursais naturais, a sentença pode ainda ser anulada caso um dos tipos de nulidades processuais seja encontrado, caso do exemplo anterior, em que posteriormente novo fato prove a inocência do réu sentenciado.

Em vários países o condenado pode ser preso após o transitado em julgado em primeira instância. É o caso da Alemanha, Canadá, Inglaterra e Estados Unidos. Alguns países, no intuito de evitar casos de abusos de autoridade por parte de juízes de primeiro grau, adotam a prisão somente apos esgotadas as possibilidades em segunda instância. São exemplos França e Portugal.

Aqui no Brasil, como em todos os exemplos dos países acima citados, o réu só pode ser preso "para cumprir pena" após o trânsito em julgado. E é assim que tem que ser, para se evitar injustiças. O problema que ocorre no Brasil é que o conceito de Transitado em Julgado foi distorcido pelas várias instâncias superiores, ao longo de muitos anos, a fim de proteger os poderosos. É uma situação deprimente essa do Brasil em que tantos formadores de opinião (juristas, jornalistas, blogueiros, etc.) repetem a mesma tese de que transitado em julgado significa a impossibilidade de qualquer recurso apelativo. NÃO É ESSE O SIGNIFICADO ORIGINAL DE TRANSITADO EM JULGADO QUE ESTÁ NA LEI!

(Texto de Dario de Araújo Dafico. Professor)

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