A estratégia jurídica do conglomerado Globo no caso Heloísa Bolsonaro
17/09/2019 às 11:09 Ler na área do assinanteNo início da noite desta segunda-feira (16), o Conselho Editorial do Grupo Globo publicou uma nota reconhecendo o erro da revista Época na “reportagem” sobre a esposa do Deputado Eduardo Bolsonaro, Heloísa Bolsonaro (1).
Eu, como advogado, percebo, imediatamente, que tal nota visa, unicamente, a um único fim: ser explorada processualmente pela empresa de comunicação para tentar reduzir o valor da indenização que terá que ser paga.
Veja-se: a nota fez questão de dizer que não houve dolo, por parte da revista. Dolo, como se sabe, é assumir a vontade, livre e consciente, de obter o resultado que advém da conduta do agente. Todos que se pronunciaram sobre esse episódio afirmaram que a atitude do tal jornalista foi feita de forma dolosa: com a vontade consciente de produzir o resultado de causar prejuízos à Heloisa Bolsonaro. Eu falei isso até de uma forma contundente (2).
Por outro lado, a nota publicada em hora nenhuma reconhece o erro da atitude do jornalista em se passar por cliente da psicóloga, e de tê-la enganado e de haver mentido sobre sua própria identidade; o máximo que diz foi que a revista fez uma avaliação incorreta, ao tomar Heloísa Bolsonaro como uma pessoa pública (o que, segundo o veículo, nos seus “princípios editoriais”, a permitiria expor a sua intimidade na reportagem), quando na verdade ela não é, por levar uma vida discreta. E todos que se pronunciaram sobre esse episódio afirmaram que a atitude do tal jornalista viola preceitos éticos e até mesmo ditames legais, que proíbem a conduta por ele adotada.
Portanto, essa tal nota publicada nada mais é do que uma estratégia de contenção de danos. Estamos falando de Responsabilidade Civil; de Ação de Indenização; de um enorme processo que o Grupo Globo está prestes a sofrer, movido por Eduardo Bolsonaro (que também foi citado na reportagem), o Deputado Federal mais votado na história do Brasil, com quase 2 milhões de votos, e sua esposa, Heloísa Bolsonaro, psicóloga de formação e profissão.
Ora, como eu já falei em outra oportunidade, naquela ocasião do menino ofendido no desfile de 7 de setembro pelo portal G1, também do Grupo Globo, o juiz, ao arbitrar o valor da indenização, deve levar em conta o art. 944 do Código Civil, segundo o qual “a indenização mede-se pela extensão do dano”(3).
Mas, por outro lado, o parágrafo único do mesmo artigo diz que “se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, equitativamente, a indenização”. Aqui, nesse caso, permite-se que seja investigada a culpa, para efeito de redução do valor indenizatório: quanto mais grave a culpa do agente, maior a indenização que ele terá que pagar; quanto mais leve, menor ela pode ser, de acordo com o caso concreto.
Existe um princípio, que se origina do Direito Romano, e que é um dos fundamentos da nossa Responsabilidade Civil, que estabelece que “in lex Aquilia et levissima culpa venit”: “na lei aquília até a culpa levíssima é valorizada”. Isso quer dizer que, desde que haja culpa, o agente se obriga a indenizar o dano sofrido pela vítima.
O fato é: se alguém praticou ato ilícito (ação ou omissão que viole dever jurídico preexistente), que cause dano a outrem, se existir nexo causal (liame subjetivo entre esse ato do agente e o prejuízo sofrido pela vítima), e se o ato tiver sido praticado por culpa (negligência, imprudência ou imperícia), nasce o dever de indenizar. Em suma, mesmo a culpa levíssima gera a obrigação reparatória.
Mas importa, na hora do arbitramento do valor indenizatório, investigar se a culpa foi pequena, média ou grande: e até enorme, com a existência de dolo. Quanto mais grave a culpa, maior a indenização. É isso que está nesses artigos do Código Civil aqui citados.
Certamente os advogados do Conglomerado Globo sabem bem disso, e traçaram essa estratégia de publicar a nota em questão para pretender diminuir o grau de culpa da revista, já pensando em utilizar o assunto como argumento de defesa nos processos judiciais que sofrerá.
Portanto, é visível a tentativa da Época/Globo em tentar convencer a todos que o seu ato não foi tão grave assim, dizendo que não houve dolo, de sua parte, e que tratou-se de uma mera interpretação equivocada dos seus próprios “princípios editoriais”.
Assim, para os ingênuos que ficaram felizes com o “pedido de desculpas” divulgado pela Globo/Época, e estão comemorando a atitude da empresa, digo o seguinte:
- Não se iludam; não se trata de pedido de desculpas nenhum. A intenção é de, no futuro, tentar diminuir o valor da indenização que a revista terá que pagar, explorando a nota publicada ontem.
- É mais fácil uma vaca voar do que o Conglomerado Globo se desculpar de forma sincera com Jair Bolsonaro ou com qualquer familiar seu quanto a alguma ofensa maledicente que as empresas do grupo tenham feito.
Guillermo Federico Piacesi Ramos
Advogado e escritor. Autor dos livros “Escritos conservadores” (Ed. Fontenele, 2020) e “O despertar do Brasil Conservador” (Ed. Fontenele, 2021).