Neste país de Macunaíma, para ser herói, basta blindar a classe dominante impedindo que os seus atos sejam investigados e julgados pela justiça. O Intercept Brasil fez isso, ao narrar as supostas conversas entre o então juiz Sérgio Moro e os procuradores da Lava Jato, criando um frisson tão grande que foi preciso desprezar a lei para proibir investigações que possam atingir os poderosos.
As edições publicadas pelo site do repórter americano agradaram tanto ao nosso establishment que o hacker se transformou num ícone de projeção nacional, ao ponto de desafiar o Congresso Nacional negando-se a fornecer o material divulgado para ser periciado. Na ocasião, o hacker, ao ser indagado por um dos senadores se entregaria o material para análise, respondeu que jamais o faria, dando a entender que ninguém neste país se atreveria a pedir-lhe tanto.
O sensacionalismo na divulgação das supostas mensagens visa anular todos os processos da Lava Jato, libertar Lula da Silva e, talvez, fazer com que a nação devolva todo o dinheiro da corrupção apreendido durante as investigações. O hacker está protegido por alguns membros de nossa Suprema Corte, pela OAB Nacional e por alguns jornais e revistas do país, principalmente pelos que estão em dificuldades financeiras.
A ânsia em destruir a Lava Jato é tanta que nem o Congresso se interessou em analisar os erros cometidos pelo hacker. O negócio era e ainda é desacreditar Sérgio Moro e os procuradores, pois muitos dos parlamentares respondem a processos por corrupção. Como o Brasil tem pouca memória, poucos se lembram de que, em 2018, a imprensa publicou que o procurador Deltan Dallagnol tentou criar uma empresa para tratar de assuntos relacionados às palestras que proferia em vários lugares sobre corrupção no Brasil. Uma determinada revista e certo jornal publicaram, na época, que o empreendimento não foi adiante face às dificuldades burocráticas para se criar um empreendimento dessa natureza.
Tempos depois, o fato foi revisto e deturpado, pois criaram um clima sensacionalista para divulgar a notícia de forma requentada, bem como usando as mesmas mensagens para acusar o procurador de tentar ganhar dinheiro dando palestras sobre a Lava Jato. Para tanto, republicaram as notícias com o propósito de desmoralizá-lo, mesmo sabendo que o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) já o inocentara, pois nada havia de irregularidade nas palestras proferidas.
Para dar um aspecto altamente negativo do fato, a imprensa engajada reviveu um diálogo de seis meses atrás sobre um projeto jamais realizado. Esqueceram até os erros gravíssimos nas divulgações, principalmente quando atribuíram uma troca de mensagem ao procurador Ângelo Villela (que passou a ser Ângelo Augusto Costa), com uma procuradora de nome Monique Cheker, a quem o hacker afirmou ser lotada na Procuradoria em Osasco, local onde essa procuradora jamais trabalhou.
O hacker, em sua ânsia de atingir Moro e os procuradores, esqueceu que quem estava lotado em Osasco era justamente o procurador Ângelo Villela, retirado da matéria “por erro de edição”, e que foi preso - segundo a imprensa -, pela Operação Greenfield, do Ministério Público Federal de Brasília, vendendo informações privilegiadas à JBS.
Depois que os “erros” foram descobertos, o hacker tentou justificá-los dizendo que foi um equívoco de “edição apanhado pela checagem de fatos antes da publicação”, o que foi interpretado como um sinal positivo de que as mensagens poderiam ter sido adulteradas.
O hacker, hoje, é o mais badalado ídolo da esquerda petista, a mesma que está sendo acusada de usar o fundo partidário para bancar a campanha de “Lula Livre” e para comprar artigos de luxo para dirigentes do partido, como Iphone 8 Plus Red, especial edition, de 256 gibas top de linha e outras iguarias.
A presidente do partido, por exemplo, foi acusada de receber R$ 23 milhões em propinas da Odebrecht na época em que se candidatou á prefeitura de Curitiba, no Paraná. Mas o interessante disso tudo é que, independente da corrupção ser, atualmente, institucionalizada como um dos princípios fundamentais de nossa administração pública, qualquer estrangeiro pode interceptar ilegalmente as autoridades, editar mensagens, adulterá-las, se quiser, e publicar o que foi interceptado como verdadeiro, bem como se colocar como um ícone nacional.
Outro fato pitoresco e inusitado é que a imprensa traduziu para nossa língua o nome do hacker como Valdeverde, e o nosso país, que ele adotou, de Verdevaldeano.
Que República meu Deus!
Luiz Holanda
Advogado e professor universitário