A expressão latina Cui Prodest, cuja tradução serve de título para o presente artigo, é uma das mais remotas manifestações da sabedoria política. Ela se constitui numa regra que indaga os objetivos e as finalidades de uma determinada ação. A expressão foi muito usada na Roma antiga, principalmente por Cícero, que a imortalizou. Ela demonstra que o crime compensa, pois quem se beneficia do crime é quem o comete: cui prodest scelus, is fecit.
A política sempre foi o reino da desonestidade; uma atividade que compensa os crimes cometidos por seu intermédio, bastando apenas que se pratiquem algumas ações destinadas a impedir que se descubram os seus autores. Uma delas é atribuir aos adversários fatos que jamais aconteceram, ou então deturpá-los por meios fraudulentos visando obter vantagens ilícitas A necessidade de esconder as verdadeiras intenções dos deturpadores da verdade torna as ações ambíguas, de maneira que o objetivo central é tentar desacreditar os personagens que agiram corretamente.
Nunca na história do Brasil se viveu um momento como o atual, no qual se tenta diminuir o profícuo trabalho dos magistrados e procuradores da Lava Jato, realizado de forma límpida e sem subterfúgios. A evolução que se viu no combate à corrupção foi fantástica. O desarme de quadrilhas profissionais que saquearam os cofres públicos deveu-se a esses abnegados homens e mulheres do direito, entre os quais o ex-juiz Sérgio Moro, que liderou a cruzada contra a corrupção no Brasil. Daí a necessidade de desacreditá-lo.
Realmente, num país em que advogados amigos de magistrados oferecem jantar em sua homenagem sob a alegação de apoio moral, não se pode impedir a desenvoltura de sites como o Intercept Brasil, que vasculha impune e indevidamente a vida privada de juízes e procuradores sem demonstrar a veracidade das informações divulgadas, inclusive com possibilidade de alteração do conteúdo das supostas conversas visando beneficiar o ex-presidente Lula da Silva.
O que foi divulgado como afirmações de Moro e dos procuradores foi obtido de forma ilegal e fraudulenta, violando as normas materiais que regem os meios de produção de provas. Quando se divulga uma interceptação telefônica obtida clandestinamente e sem a competente autorização judicial, esse meio de prova é contrário ao Direito, e não será considerado na fase de instrução.
No tempo em que se cumpria a lei neste país, nossos tribunais defendiam a “teoria dos frutos da árvore envenenada”, da jurisprudência norte-americana, que prega que uma prova irregular propaga a sua nódoa para as provas geradas a partir dela, afastando as do estado de legitimidade exigidas para o processo.
O carnaval que estão fazendo com o que foi divulgado pelo site Intercept Brasil, de propriedade do jornalista americano Glenn Greenwald, casado com o deputado federal do PSOL do Rio de Janeiro, David Miranda, visa apenas tentar tirar Lula da cadeia. Entretanto, nada do que foi obtido de forma clandestina beneficia o ex-presidente. Condenado em três instâncias, inclusive no STJ, o sindicalista teve todos os meios de provas disponíveis para provar a sua inocência. Como não conseguiu, seus advogados apresentam infindáveis recursos contra as decisões que condenaram o cliente, apesar dos processos terem sido instruídos e julgados.
Dizer que não existe troca de opiniões entre juízes, advogados e o Ministério Público é querer inverter a situação para soltar o presidiário petista, que recentemente afirmou para a imprensa que a facada que quase tirou a vida de Bolsonaro não existiu, já que ele suscita dúvidas em relação à autencidade do atentado. Casos escabrosos e menos defensáveis já aconteceram em nosso país envolvendo autoridades sem que tenham sido tão explorados. Será que ninguém se lembra dos encontros dos advogados de Lula com o ex-ministro da Justiça, José Eduardo Cardoso, em tratativas que visavam a libertação do prisioneiro? E as gravações –por sinal autênticas-, envolvendo gente poderosa que agiu contra o direito e a Justiça?
Chegou a hora da Procuradoria-Geral da República pedir providências para apreender todo o material utilizado pelo site Intercept Brasil para ser devidamente periciado.
Segundo a imprensa, especialistas calculam que foram gastos mais de 15 milhões de dólares na obtenção e divulgação de um material sem autenticidade com o fim exclusivo de desmoralizar a Lava Jato e libertar o ex-presidente Lula.
Gastar uma quantia dessas procedendo indevidamente contra nossa própria Constituição jamais deveria ser tolerado pelo Poder judiciário, pois isso poderá, no futuro, permitir que seus membros tenham sua privacidade invadida na colheita ilegal de provas. Afinal, a quem interessa isso senão aos próprios autores dos crimes cometidos?
Luiz Holanda
Advogado e professor universitário