O fracasso de nosso sistema socialista de gestão universitária

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Tenho observado as recentes manifestações em uma suposta “defesa da educação” e alguns de seus aspectos demandam algumas considerações.

Em primeiro lugar, fica evidente a necessidade e, mesmo, a urgência do contingenciamento proposto pelo MEC. Afinal, “dinheiro não cresce em árvores” (para quem ainda não sabe, os recursos bilionários de nossas universidades estatais não são cultivados em seus Campi: eles são oriundos dos pagadores de impostos, especialmente dos mais pobres que, dado nosso injusto sistema de tributação, são os mais onerados pelo bilionário custo dessas instituições). Logo, seu uso deve(ria) levar em conta a realidade, ser eficiente e racional.

Não obstante, nossas universidades estatais têm sido tradicionalmente geridas por uma espécie de “modelo socialista de gestão universitária”. Logo, estamos diante de um modelo desapegado da realidade, ineficiente, oneroso e irracional.

Assim, um primeiro ponto a ser notado nas manifestações recentes é o desapego que o “modelo socialista de gestão universitária” tem em relação à realidade. Na verdade, eles a negam e usualmente a distorcem.

Por exemplo, em uma das manifestações do reitor da UFPEL (Universidade Federal de Pelotas/RS) ele afirmava que tal medida (contingenciamento) seria uma “covardia” motivada exclusivamente por birras políticas. Afinal, uma vez que o orçamento de 2019 foi aprovado em 2018, não haveria justificativa para que não fossem concedidos os recursos previstos para as universidades (no caso da UFPEL, que ainda não tem 20 mil estudantes, 800 milhões – orçamento um pouco menor do que o da cidade de Pelotas/RS, a qual tem cerca de 350 mil habitantes e uma estrutura gigantesca para administrar).

Ora, o orçamento é, de fato, planejado e aprovado pelo congresso no ano anterior ao ano corrente. Todavia, ele é planejado e aprovado dada uma expectativa de arrecadação. Ou seja, o governo é autorizado a gastar até o limite do orçamento aprovado pelo congresso, o que não significa que esse orçamento – previsto - será o orçamento real.

Nesse sentido, em 2018 o congresso aprovou o orçamento de 2019 a partir da expectativa do que seria arrecadado. Mas eis que a realidade se impôs: O orçamento previsto não passou no teste de realidade. Dito de outra maneira, a arrecadação (real) não correspondeu ao que se planejou (ideal) gastar.

Que fazer quando a arrecadação real não corresponde à almejada?

Ora, a alternativa mais eficiente e imediata é contingenciar os gastos a partir de um novo cálculo que considere os dados reais, atuais, certo?

Todo aquele que administra de forma responsável e eficiente mesmo uma economia doméstica sabe: Quando a situação fica difícil, “seguramos” os gastos, fazemos um contingenciamento a partir da renda que realmente temos naquele momento.

Qual família nunca teve que fazer escolhas sobre em que investir? Por exemplo, entre a escola e um curso de idiomas, entre adquirir um carro novo e dar um upgrade no antigo, entre um livro escolar e um livro de lazer, etc.

Toda família, em períodos de crise financeira, se responsável, precisa fazer escolhas. E isso com vistas à gestão familiar eficiente. O mesmo vale, cabe dizer, acerca de quem gerencia uma empresa privada. Se sua gestão não for eficiente, a empresa colapsa. Na verdade, qualquer economia colapsa se não houver um contingenciamento em casos de escassez maior do que a prevista (e no mundo real há escassez).

O contingenciamento é a resposta mais imediata e eficiente em situações como aquela pela qual passamos nesse momento.

A mais indicada seria, certamente, a promoção da liberdade econômica. Assegurar a liberdade econômica seria a maneira mais eficiente e perene de pavimentar o caminho para a prosperidade, mesmo educacional, o que tem sido demonstrado por diversos estudos. Outra alternativa, problemática (e terrivelmente injusta), seria a tradicional: aumento de impostos. Mas isso implica em menos liberdade econômica, bem como em onerar ainda mais os (já onerados) pagadores de impostos.

Essa tem sido, aliás, a política da esquerda, a qual nos trouxe, inclusive, ao atual estado de coisas. Por essa razão um contingenciamento era, em verdade, esperado. Afinal, como o senso comum mesmo sabe, “dinheiro não dá em árvores”. Logo, em algum momento a conta chega.

Como disse Margareth Thatcher:

“o socialismo dura até acabar o dinheiro dos outros”.

Eis o que aconteceu: o dinheiro dos outros, dos que trabalham e pagam impostos, acabou. Já não é possível, pois, subsidiar um modelo socialista de administração universitária.

Ainda assim, mesmo diante de todas as evidências, para nossos gestores universitários não existe escassez. Como eles vivem em Utopia, desconhecem a realidade. Exemplo disso são os cartazes, nas manifestações, demandando “menos impostos, mais investimentos”. Esse é o discurso em nossas universidades, especialmente com suas demandas por mais investimento e pela “universidade pública e gratuita”.

Portanto, diferentemente do que ocorre com aquele que administra uma economia doméstica ou, mesmo, uma instituição privada, os gestores de nossas universidades estatais não precisam sequer ser eficientes e racionais na alocação de recursos. No mundo deles é possível assegurar, “gratuitamente”, moradia confortável, refeições orgânicas e de alta qualidade, transporte, “apoio pedagógico”, dentre outras benesses, todas subsidiadas com os impostos daquele que jamais terão acesso a esses confortos (sim, elas não são gratuitas, apesar de nossos gestores insistirem em sua “gratuidade”).

Ora, assim como “não existe almoço grátis”, obviamente também não existe ensino gratuito. Alguém paga a conta. Alguém subsidia os R$ 4.500,00 mensais que custa cada “estudante” que foi às ruas no dia 15/05 reivindicar ainda mais investimentos (inclusive impedindo que os demais tivessem suas aulas nesse dia). Afinal, no mundo em que eles vivem (Utopia) R$ 4.500,00 não é suficiente.

No mundo real, por outro lado, segundo dados do IBGE (2018 – dados da Pesquisa Nacional por amostra de domicílios contínua/PNAD contínua), 50% dos trabalhadores brasileiros têm, em média, uma renda mensal 19.5% abaixo do salário mínimo (que, na época da pesquisa, era de R$ 937 reais). De acordo com a PNAD contínua a média domiciliar per capita foi de R$ 1.271 (na região norte, R$ 810, na região nordeste R$ 808 e na região sul R$ 1.567).

Ainda assim, a elite universitária considera que R$ 4.500,00 não é suficiente, ainda que a maioria dos que subsidiam esse custo não viva tão confortavelmente como essa ungida elite (e, perturbadoramente, eles sequer se envergonham de exigir sempre mais).

Assim, eficiência e racionalidade na alocação de recursos não são requisitos para que alguém se torne gestor de uma universidade estatal (o principal requisito é a demagogia).

Nossos gestores não estão habituados a lidar com adversidades. Diferentemente do que ocorre na iniciativa privada, quando da ocorrência de adversidades econômicas eles (gestores de universidades estatais) se habituaram a recorrer ao estado como fonte de subsídios. Noutros termos: ‘se faltou dinheiro, então vamos demandar mais investimentos do estado’. Nossos gestores não precisam ser empreendedores, tampouco eficientes e competentes. Precisam ser demagogos chorões (e, claro, entoar os tradicionais mantras da “universidade pública e gratuita”, da “resistência”, dos “direitos”, etc). Sempre que a situação econômica se torna difícil, eles correm para o MEC em busca de mais recursos, os quais serão tomados dos pagadores de impostos.

Resultado?

Nossas universidades se isolaram da realidade e vivem uma espécie de “ilusão econômica” em que vige a abundância, a fartura inesgotável (na utopia deles não há escassez). O mundo acadêmico já não é o mundo real. Eles transformaram nossas universidades em sua tão sonhada utopia socialista. Mas o problema é que a ideologia socialista é parasitária: ela consome a riqueza alheia. Para ela, ideias não precisam ser eficientes, pois são subsidiadas com o dinheiro dos outros. O gestor de uma universidade estatal não precisa se preocupar com dinheiro. Ou seja: Se o dinheiro acabar, então procure o MEC e chore. Se não der certo, então mobilize seus “idiotas úteis”.

Como diz a frase atribuída a Lênin:

"Usaremos o idiota útil na linha da frente”.

A estratégia realmente não mudou muito ao longo do século, como ficou claro na manifestação do dia 15/05.

Eis, então, o que temos testemunhado nessas manifestações. Alguns grupelhos saem de sua confortável Utopia e vêm à realidade demandar mais recursos. Afinal, Utopia é improdutiva. Os recursos estão no mundo real. Por que? Porque apenas no mundo real as ideias precisam funcionar para permanecerem existindo e para gerarem riqueza.

Em Utopia as ideias podem ser estéreis. Na verdade, as preocupações dos “ungidos” utópicos sequer expressam as preocupações e as questões do mundo real.

Nossa “ungida” elite acadêmica burguesa se encastelou nas universidades, as tomando para si como se fossem uma extensão de sua propriedade privada. Criaram uma bolha e se isolaram nela, arrogantemente desprezando o mundo real. Só descem até o mundo real quando precisam de mais recursos, como tem ocorrido recentemente.

Aliás, é interessante notar que, uma vez que ingressam no mundo real (pois precisam de mais dinheiro dos pagadores de impostos), eles passam a se expressar em termos mais realistas. Nesse sentido, é interessante observar que, quando das manifestações, os manifestantes carregaram faixas mostrando a importância de pesquisas nas áreas da saúde, das ciências, etc. Não vi um único cartaz justificando sua demanda por mais recursos com cartazes sobre a importância de pesquisas relativas à ideologia de gênero, ao feminismo, etc.

Não havia um único cartaz mencionando, orgulhosamente, pesquisas como as que citei nos artigos abaixo:

Todos os cartazes estavam em acordo com a fala inicial do Presidente e do Ministro da Educação, os quais enfatizaram a importância de “descentralizar o investimento em faculdades de filosofia e sociologia", passando a investir prioritariamente em áreas que “gerem retorno imediato ao contribuinte" (como, por exemplo, engenharia, medicina, etc).

Os cartazes levantados nas manifestações corroboraram as falas do Presidente e do Ministro da Educação. Reforçaram a ideia de que há, sim, áreas prioritárias quando os recursos se tornam demasiadamente escassos.

Dito de outra forma, mesmo esses manifestantes sabem que jamais justificariam publicamente investimentos naquilo que tem consumido parte considerável dos orçamentos das universidades, como “pesquisas” e eventos atinentes a temas ridículos ligados à ideologia de gênero, ao multiculturalismo, etc. Em verdade, mesmo eles sabem que os pagadores de impostos se revoltariam com o uso que tem sido feito de seus recursos, seja na gestão das universidades estatais (distribuindo benesses sem cobrar responsabilidade), seja naquilo que a gestão universitária socialista tem investido.

Nossos gestores não demandariam mais recursos e criticariam o contingenciamento com cartazes em defesa da importância de eventos como “A filosofia como modo superior de dar o cu: Ressonâncias entre a Teoria Queer e a Atividade Filosófica” (que ocorreria na Universidade Estadual do Piauí e foi cancelado pela reação negativa da opinião pública, que subsidia involuntariamente esse tipo de barbárie).

Eis a razão de os cartazes focarem nos investimentos em hospitais, cursos como medicina, odontologia, engenharias, ciências, etc, as quais ainda não foram totalmente corrompidas pelo sistema socialista de gestão universitária.

Nossa encastelada elite sabe, pois, que sozinha não subsiste.

Ela sabe da ineficiência e da irracionalidade de um modelo socialista de gestão universitária.

Ela sabe que precisa da riqueza produzida no mundo real, a qual eles têm desperdiçado no fomento de ideias fracassadas.

(Texto de Carlos Adriano Ferraz. Graduado em Filosofia pela Universidade Federal de Pelotas (UFPEL), Mestre em Filosofia pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), doutor em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), com estágio doutoral na State University of New York (SUNY). Foi Professor Visitante na Universidade Harvard (2010). Atualmente é professor da Universidade Federal de Pelotas (UFPEL) na graduação e no Programa de Pós-Graduação em Filosofia, no qual orienta dissertações e teses com foco em ética, filosofia política e filosofia do direito)

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